Para Felipe Miranda, transação com BTG é um desabafo

Felipe Miranda conversa com o Valor Econômico sobre o deal com o BTG Pactual, além das estratégias de mercado que tomou em sua carreira

Por: Equipe Empiricus

Por Manuela Tecchio e Maria Luíza Filgueiras

A lógica de aquisição da Universa, dona de Empiricus e Vitreo, pelo BTG Pactual já ficou clara para o mercado antes mesmo de o negócio ser oficializado nesta manhã – para o BTG, uma estratégia agressiva e vencedora de varejo, para Vitreo e Empiricus, um respaldo de placa e balanço.

Mas a tratativa é uma tarimba há muito esperada por um personagem em particular – o sócio fundador da Empiricus, Felipe Miranda.

Com 36 anos de idade, Miranda criou um negócio rentável e robusto driblando uma enxurrada de críticas. Enquanto crescia entre os investidores vidrados do varejo, não encontrou o mesmo reconhecimento entre seus pares. Não adiantava estar no ponto mais nobre da Faria Lima (uma locação no andar do BTG), a Empiricus continuava sendo o lado B do mercado financeiro — vezes por derrapadas suas, vezes por um misto de ranço e desdém dos tradicionalistas.

Miranda nunca fez questão de ser unanimidade e dizia que pouco ligava para esse comportamento dos pares — apesar de pessoas próximas a ele afirmarem um certo incômodo. “O Felipe é um cara muito inteligente e que se enxerga dessa forma, então é óbvio que se incomoda se alguém acha algo diferente disso”, diz um executivo que tem interações frequentes com o analista.

Apesar de não se identificar com Guilherme Benchimol e a XP e ser crítico à casa, suas trajetórias até que encontram algumas semelhanças. Nenhum dos dois tinha um grande currículo (Miranda foi do Infomoney, quando ainda era um pequeno site independente sobre investimentos, trabalhou no Deutsche Bank e na Monitor Clipper Partners) e o varejo nunca foi fonte de grande reconhecimento nessa indústria.

A diferença mais óbvia, talvez, esteja no temperamento e no apetite para risco. “O que explica bastante sobre a nova sociedade”, emenda um gestor, citando André Esteves.

O analista ficou com um arranhão desnecessário de imagem ao sair no braço — às cabeçadas, mais precisamente — num evento de banco de investimento anos atrás. Miranda reconheceu pouco depois que foi uma tremenda imaturidade. A provocação aos concorrentes e especialmente ao regulador também ficou bem perto de passar do ponto durante a construção do marketing que tornou a casa conhecida (como a inesquecível técnica de investimento da Bettina).

“A casa cresceu e mesmo o perfil dos sócios foi amadurecendo, mas o histórico deixava a impressão de alguém correndo pelo acostamento”, define um diretor de grande banco.

Enquanto isso, outras casas de análise independentes nasceram na esteira da Empiricus, inspiradas no modelo que os canais digitais ajudam a reverberar – ainda que as concorrentes sejam mais tímidas em suas abordagens. Também as corretoras de varejo, mesmo as ligadas a bancos, criaram áreas de conteúdo destinadas a relatórios menos mornos, buscando porta-vozes mais críticos para puxar a reputação da casa.

Mas antes mesmo das propagandas mais audaciosas e do famoso relatório sobre O Fim do Brasil, os relatórios da casa já eram apimentados para o que se tinha então do mercado — juntavam lé com cré com uma boa dose de coragem, quando as corretoras evitam indicar venda para um papel ou mesmo apontar manobras contábeis. Talvez um bom serviço da Empiricus ao mercado brasileiro como um todo tenha sido justamente esse.

O sócio Rodolfo Amstalden ficou logo conhecido por sua boa matemática — e os devidos descontos por falta de governança — nas análises de empresas frigoríficas. Dez anos atrás, os poucos analistas da Empiricus se organizavam para questionar as empresas (que os evitavam a todo custo) em eventos da Apimec – cada um ficava num canto da sala, para não serem identificados e ignorados de uma só vez pelo interlocutor corporativo.

Miranda, Amstalden e Caio Mesquita são os principais sócios executivos da Empiricus. A aproximação da casa de research com a Vitreo nos últimos anos já era sinal desses novos tempos. A Vitreo é uma gestora de sócios de currículo extenso e low profile. Entre os cofundadores estão o discreto (ainda que com bom círculo na mídia) Patrick O’Grady e o discretíssimo Paulo Lemann, filho de Jorge Paulo.

“O Felipe foi ficando menos carrancudo, o que também tem muito a ver com a vida pessoal dele. Você vê hoje um cara mais sorridente, com a mesma disposição de colocar o dedo na ferida para falar de investimentos”, diz um executivo próximo a ele.

Num artigo hoje sobre a transação com o BTG, publicado em sua rede social, Miranda deixa claro o alívio e o significado que esse negócio traz — principalmente fazendo referência ao histórico familiar. “Não sejamos ingênuos. Somos todos adultos aqui. Há, sim, uma questão financeira envolvida. Porém, ela é muito menor perante outros pontos muito mais relevantes em jogo”, disse o fundador da Empiricus.

Ele conta que conheceu o Pactual antes mesmo de saber o que era o mercado financeiro. Em 1994, a alavancada carteira de ações do pai foi destroçada ao bater de frente com uma estratégia agressiva do banco, que confiava menos no Brasil pós-plano real.

“Já me disseram que vim do zero. Eu aceito, mas não é exatamente preciso. Eu comecei com R$ 90 mil negativos. A dívida herdada do cheque especial e do cartão de crédito do meu pai. Quebramos várias vezes, uma pior que a outra, deixando um rombo no banco e cicatrizes profundas na alma. Quando o dinheiro não entra pela porta, o amor voa pela janela.”

Se gerou um trauma pessoal, ficou um entendimento de que o banco então de sócios como André Jakurski e Luiz Cezar Fernandes era o melhor no que fazia. Segundo ele, a admiração de longa data ganhou mais força ao almoçar com Marcelo Flora e Roberto Sallouti, na época em que a Empiricus fechou o aluguel de escritório vizinho.

Miranda afirma que a proposta do BTG não foi a melhor que receberam em termos de valuation, mas diz que preservará a independência de análise. Pela totalidade do grupo Universa, o banco pagará R$ 440 milhões em dinheiro, R$ 250 milhões em units e ainda há uma parcela variável, que depende do atingimento de determinadas metas, nos próximos quatro anos.

A Empiricus tem cerca de 425 mil clientes e a Vitreo tem R$ 11 bilhões sob gestão. A transação incluiu ainda os sites Seu Dinheiro e MoneyTimes e o aplicativo Real Valor. Diferentemente dos sócios da Empiricus, a maioria dos sócios da Vitreo vai sair da operação depois de concluída a venda, disse uma fonte.

O valuation final da transação deve ficar entre R$ 1 bilhão e R$ 1,5 bilhão, apurou o Pipeline, a depender desse ritmo de crescimento nos próximos anos. A fatia de Miranda já passou da centena de milhões de reais.

Fonte: Valor Econômico