Investimentos

PETR4: por que as ações da Petrobras derretem desde a eleição de Lula?

Desde o dia 30 de outubro, quando Lula foi eleito, ações da Petrobras caíram 32% até o fechamento da última terça-feira (3)

Por Juan Rey

04 jan 2023, 13:49 - atualizado em 04 jan 2023, 14:00

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(Imagem: iStock/Montagem: Julia Shikota)

Um dos principais assuntos no mercado financeiro desde a eleição de Lula é a queda nas ações da Petrobras (PETR4).

Desde que Lula foi eleito, os papéis da estatal caíram 32% até o fechamento de mercado da última terça-feira (3).

Mas você sabe os motivos que levaram a esse movimento intenso de baixa na petroleira?

Mercado antecipa sinalizações ruins de Lula 

Antes de tudo, vale frisar que a baixa da Petrobras é uma reação do mercado às sinalizações do novo governo

Dadas as declarações de Lula e seus subordinados, a expectativa é que os resultados da estatal se deteriorem em 2023 – o que, claro, ainda não aconteceu. 

De forma simples, é isto o que tem acontecido com a Petrobras: um temor com o que vem pela frente. Para o analista Ruy Hungria, da Empiricus Research, a queda “ainda é muito mais sobre o que se espera que vai acontecer do que o que realmente aconteceu”.

E por que o mercado prevê uma deterioração nos resultados de PETR4?

De concreto, o que realmente mudou e ‘pegou mal’ no mercado é o fato de Lula ter revogado os atos que visavam a privatização da Petrobras – e também de outras seis estatais – já na cerimônia de posse, no domingo (1).

A medida em si não foi nenhuma surpresa e já era esperada pelo mercado. Como bem lembrou Hungria, “ninguém achava que a Petrobras seria privatizada pelo PT”.

Portanto, a impossibilidade da privatização no governo Lula é um dos motivos que levaram ao início da queda das ações após a eleição do petista.

Mas os motivos não pararam por aí.

Lembranças do que foi a Petrobras no governo do PT ainda assombram

Para entender melhor, é necessário voltar alguns anos. 

Quando Michel Temer assumiu a presidência, a Petrobras estava em frangalhos. Mas por quê?

A demanda brasileira por combustível é maior que a capacidade de produção no país. 

Por isso, o Brasil precisa importar combustível. Durante o governo Dilma, pressionada pela crise econômica e o descontentamento da população, a petista decidiu – em uma jogada populista – congelar os preços dos combustíveis.

Isto é, a Petrobras vendia aqui no Brasil o combustível a um preço menor do que pagava para importar. 

Tal medida gerou um rombo de bilhões, e a Petrobras se tornou uma das companhias mais endividadas do mundo. 

A empresa entrou em grave crise e a ação de PETR4 chegou a valer R$ 4,03 no fechamento de mercado de 26 de janeiro de 2016. 

Para se ter ideia da diferença, mesmo com a queda de 32% desde a eleição de Lula, a ação da Petrobras fechou a última terça-feira a R$ 22,34.

Gráfico aponta queda nas ações da Petrobras desde outubro. Fonte: Google Finance

Medidas de Temer para ‘ressuscitar’ Petrobras ficam em xeque no governo Lula

Assim que assumiu a presidência após o impeachment de Dilma Roussef, Michel Temer tomou duas medidas fundamentais para a retomada da petroleira

A primeira, a política de paridade de preço, que tirava da Petrobras a obrigação de subsidiar o preço do combustível. 

Em palavras mais simples, a empresa passou a “comprar lá fora e não ficar com o prejuízo de um eventual descasamento de preços. É isso que significa a paridade internacional”, explica Ruy Hungria.

A outra medida de Temer que contribuiu para a virada de chave na Petrobras foi o investimento massivo no pré-sal, descoberto pela empresa em 2006, no final do primeiro mandato de Lula. 

O pré-sal é o ativo de maior valor no portfólio da Petrobras. O motivo?

O custo de extração por barril é muito baixo e a produtividade é grande, além do fato de a empresa ser brasileira e ter a preferência para operar os campos de pré-sal no Brasil.  

“A Petrobras com o pré-sal é uma das petroleiras mais eficientes do mundo em termos operacionais. É lógico que tem uma estrutura inchada, é estatal, mas, ainda assim, o pré-sal é um ativo muito rentável para a Petrobras”, destaca Ruy.

Tendo isso em vista, o então presidente Michel Temer passou a vender os ativos chamados onshore – de extração terrestre – e de águas rasas. “Estes ativos não tem tanta produtividade, não têm um custo de extração tão baixo”, explica o analista.

Com a venda de ativos menos rentáveis, a companhia usou o dinheiro para investir em pré-sal, onde a Petrobras tem as maiores vantagens. 

Essas medidas fizeram com que a Petrobras, nos últimos 6 anos, se tornasse uma companhia totalmente focada em geração de valor e pudesse pagar bons dividendos aos acionistas.

Política de preços e má alocação de recursos preocupam

Voltando ao presente, assim que Lula foi eleito, o mercado passou a colocar na balança uma possibilidade tanto de “descasamento” de preços, como foi na era Dilma, quanto de uma má alocação dos recursos da estatal

“Você via notícias de que ia ter uma mudança na política de preços, não ia ser mais a paridade internacional como vinha sendo”, lembra Ruy. 

É bem verdade que no governo Bolsonaro, como lembra Ruy, “houve muitos períodos em que o preço da gasolina foi segurado, mas não na magnitude que foi na época de Dilma”.

Portanto o temor do mercado com relação a estes fatores também foram motivos que levaram ao derretimento das ações da Petrobras.

O presidente escolhido por Lula para a estatal, Jean Paul Prates, até declarou que uma mudança na política de preços diferente do que foi na era Dilma seria estudada, mas isso não foi suficiente para causar uma euforia de longo prazo nos investidores.

Intenção de mudar Lei das Estatais também assustou

Um outro ponto que assustou o mercado foi a intenção de Lula de alterar a Lei das Estatais, reduzindo de 36 meses para 30 dias a quarentena para que uma pessoa tenha atuado em estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado à campanha eleitoral assuma um cargo de direção nas estatais.

Embora não tenha sido uma medida exclusiva para a Petrobras, a Lei das Estatais, sancionada em 2016 por Michel Temer, foi um avanço no sentido de evitar ingerências no comando das empresas públicas. 

O texto traz como foco principal os mecanismos de blindagem dessas empresas, criando regras para a nomeação de diretores e conselheiros.

Ficou proibida a indicação de dirigentes partidários, conselheiros ou políticos que tivessem disputado eleições nos 36 meses anteriores para a presidência das estatais.

A segunda exigência da Lei é que o indicado tenha pelo menos 10 anos de experiência em empresas do setor, ou quatro anos em companhias similares.

A mudança que reduzia o período de quarentena foi aprovada na Câmara dos Deputados no dia 13 de dezembro, mas travou no Senado devido à repercussão negativa.

Embora a lei não tenha sido alterada de fato, Ruy Hungria explica que o movimento assustou o mercado – as ações chegaram a cair quase 11% na semana em que a alteração passou na Câmara.

“Com isso, acaba aumentando as chances que existam mais mudanças em prol de uma ingerência maior no futuro. Sem a Lei das Estatais, a Petrobras não teria chegado onde chegou nos últimos anos”. 

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Independente do governo eleito, queda nos dividendos já era esperada para 2023

Por fim, a possibilidade quase certa de PETR4 pagar menos dividendos em 2023 também espantou alguns acionistas.

No caso dos proventos, a queda em 2023 já era esperada independente do presidente eleito, explica Ruy.

“Já esperávamos uma queda de dividendos neste ano. Em 2022 tivemos o preço do petróleo acima de US$ 100, principalmente por causa da guerra na Ucrânia. Também tivemos um represamento de dividendos nos anos de pandemia”. 

Por conta da incerteza durante a pandemia, a Petrobras tinha segurado dividendos, que foram distribuídos no ano passado. Não por acaso, a petroleira chegou a ocupar o topo da lista dentre as maiores pagadoras de dividendos no mundo. “O mercado já esperava um dividend yield de aproximadamente 20%, contra mais de 40% no ano passado”, explica Ruy.

No entanto, o analista lembra que, por modus operandi, os dividendos no governo petista devem cair ainda mais do que os 20% previstos, embora ainda não seja possível saber o quanto. “Ainda pode ser um bom yield, mas tudo vai depender da estratégia que vai ser adotada”.

Ele lembra que o governo precisa dos dividendos da Petrobras, tanto por conta das questões fiscais quanto pelo estresse que a questão causa no mercado. 

Temor do mercado x ação barata

No final das contas, a soma de motivos apresentados levaram à queda de PETR4. Apesar do consenso de que a ação está barata e ainda é uma boa opção de dividendos, as sinalizações do novo governo promoveram a fuga dos investidores.

“Por mais que o resultado ainda não tenha piorado, a simples indicação de que vai piorar faz com que o mercado antecipe. Pode ser que no final de 2023 a gente chegue à conclusão de que foi exagerado, de que o governo não alocou mal os recursos e nem mexeu tanto assim na política de preços. Mas também pode ser muito pior do que o mercado está esperando agora”, finaliza.

Sobre o autor

Juan Rey

Jornalista pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Contato: juan.rey@empiricus.com.br