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Mercado em 5 minutos

Um alívio, sim, mas as ameaças continuam

Impulsionados por Wall Street, mercados asiáticos fecham pregão em alta. No Brasil, novas ameaças de grupos golpistas deixam mercado cauteloso

Por Matheus Spiess

11 jan 2023, 09:07 - atualizado em 11 jan 2023, 09:07

Bandeira Brasil mercado
Imagem: Freepik

Bom dia, pessoal. Lá fora, as ações asiáticas fecharam em alta nesta quarta-feira, impulsionadas pelo rali de ontem em Wall Street, que veio antes da divulgação do relatório de inflação americana, a ser apresentado amanhã. O iene fraco também despertou o sentimento de compra no Japão, já que isso aumenta os ganhos dos exportadores do país ao converter lucros no exterior em ienes. Adicionalmente, ainda temos o otimismo em torno da reabertura da China, que ajudou a compensar as preocupações do mercado sobre as taxas de juros mais elevadas nas economias centrais. 

Hoje, vemos alta dos ativos nos mercados europeus, pelo menos agora pela manhã. Os futuros americanos também sobem, depois do presidente do Fed, Jerome Powell, se abster de comentar sobre a política monetária em sua participação no evento sueco de ontem. No Brasil, seguimos com o humor positivo dos investidores depois da resposta coordenada dos Poderes da República aos atos bárbaros de domingo. No entanto, mais ameaças estão no radar, em linha com a sabotagem de uma torre de energia por bolsonaristas ontem. Podemos ver cautela no mercado local. 

A ver… 

· 00:53 — Toda atenção se faz necessária 

Após detectar nova ameaça de grupos golpistas, o governo federal acionou o Poder Judiciário — a chamada “Mega Manifestação Nacional pela Retomada do Poder” está prevista para ocorrer em todas as capitais. Para piorar, o ex-presidente Bolsonaro compartilhou vídeo em uma rede social no qual é exposta a falsa ideia de que Lula não foi eleito pelo povo, mas escolhido pelo Judiciário. Depois da prisão do ex-comandante da Polícia Militar do Distrito Federal, Fabio Augusto Vieira, e do mandado de prisão para o ex-secretário de Segurança Pública do DF e ex-Ministro da Justiça de Bolsonaro, Anderson Torres, movimentos como esse em nada ajudam o predecessor de Lula e só contribuem para deixar o ambiente mais volátil. 

Fora o panorama político, que ainda causa preocupação, temos que nos debruçar sobre a agenda econômica, com as vendas do varejo brasileiro em novembro a serem divulgadas hoje — deve crescer 1,9% na comparação anual. Temos também a digestão da carta do BC ao Ministério da Fazenda, por não ter cumprido a meta de inflação em 2023 (é a terceira vez seguida que a meta não é cumprida), e a possibilidade de termos as medidas de Haddad apresentadas — destaque para a possível reoneração dos combustíveis depois dos primeiros 60 dias do ano, movimento que ajudará na arrecadação federal. Qualquer sinalização fiscal positiva, mesmo que marginalmente, poderá ter um efeito bom sobre os ativos de risco locais. 

· 01:59 — Disse pouco, mas o necessário 

Ontem, nos EUA, o dia começou com comentários do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, falando na Suécia antes mesmo da abertura dos mercados americanos. Os investidores estavam ansiosos para saber o que Powell pensava sobre o relatório de empregos que saiu na última sexta-feira, que mostrou um mercado de trabalho em crescimento, mas em desaceleração, um aumento na participação e uma desaceleração no ritmo de ganhos salariais. 

Qual é a interpretação possível? Bem, se o crescimento do emprego puder continuar sem alimentar uma espiral de preços e salários, talvez não seja necessária uma recessão para frear a inflação, especialmente porque os preços de commodities e bens continuam caindo ou mostrando estabilidade. Ou seja, o Fed pode declarar vitória em sua luta contra a inflação e aliviar o aperto da política monetária em breve, provocando ralis em todas as classes de ativos. Esse seria o cenário otimista. 

Powell, porém, não disse muito para desafiar ou apoiar essa narrativa. Ele reiterou amplamente o compromisso do Fed de restaurar a estabilidade de preços, sem quaisquer declarações prescritivas, enfatizando que as autoridades dependem dos dados em suas decisões daqui para frente, inclusive na próxima reunião de política monetária do Fed entre os dias 31 de janeiro e 1 de fevereiro. Provavelmente a narrativa muito otimista será frustrada, mas podemos ter um meio do caminho aí, com juros não tão altos, ainda que sustentado em patamares elevados por mais tempo. 

· 02:50 — Ruídos europeus 

Se a crise energética, a guerra na Ucrânia e o Brexit já estavam estressando os investidores, a controvérsia sobre a Reforma da Previdência na França só piora o humor da região. A ideia do governo francês é a de aumentar gradualmente a idade mínima de aposentadoria na França, de 62 para 64 anos, até 2030.  

Nós que passamos por isso recentemente, sabemos como a demografia está se tornando uma questão de crescimento cada vez mais importante. Para ilustrar, China, Alemanha, Itália e Japão já estão experimentando queda na população em idade ativa, tornando o crescimento negativo mais provável. 

A proposta de Macron enfureceu alguns sindicatos, que marcaram greve para o dia 19. No fundo, porém, fazer os franceses trabalharem mais faz parte do programa de elevação do nível do emprego e da renda, atacando o problema do déficit da previdência. Em um primeiro momento, o ruído não causa pânico nos mercados. 

· 03:55 — E o setor energético? 

As ações de petróleo e gás estão saindo de um grande rali em 2022, com o setor de energia do S&P 500, por exemplo, subindo quase 60% no ano passado. Isso deu ao grupo um peso maior no índice e em vários subconjuntos dos índices Russell que os gestores de fundos nos EUA usam como referência. 

Agora, porém, em 2023, vale se perguntar o motivo pelo qual as ações dos produtores de petróleo estão em alta, apesar de um declínio acentuado no preço da commodity que eles vendem. Basicamente, parece ter mais a ver com fluxos de fundos do que com fundamentos. Em outras palavras, a dinâmica ajudou os estoques de energia a divergir do preço do petróleo nos primeiros dias de negociação de 2023.  

· 04:36 — O mercado está preocupado com a dívida americana 

A dívida nacional dos Estados Unidos ultrapassou US$ 31 trilhões pela primeira vez em novembro e o número não diminuiu. O sombrio patamar aumentou as preocupações com a saúde econômica do país, e os legisladores podem precisar buscar o realismo nas políticas, especialmente se uma recessão entrar em alta velocidade. 

Outros fatores, como o envelhecimento da população dos EUA, custos elevados de saúde e defesa e um sistema tributário que não gera receita suficiente para cobrir os gastos, também são preocupantes, já que o governo federal chuta a lata no caminho. Muitas pessoas foram complacentes com a trajetória da dívida, em parte porque as taxas estavam muito baixas. Agora, contudo, a história é diferente. 

Não existe um número ou nível mágico para quando a dívida de um governo começa a prejudicar sua economia. A inadimplência não é iminente, e mesmo um Congresso dividido acaba encontrando maneiras de aumentar o teto da dívida. Ainda assim, o tema da dívida americana estará mais presente em 2023, principalmente por conta dos juros mais elevados, os quais podem ser mantidos assim por mais tempo. 

Um abraço, 

Matheus Spiess 

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.