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Mercado em 5 minutos

Nova derrota de Haddad? Lula estuda subir o valor do salário mínimo acima do previsto no orçamento

Para cada R$ 1,00 de aumento no valor do salário mínimo, estima-se um impacto de R$ 370 milhões na economia

Por Matheus Spiess

17 jan 2023, 09:06 - atualizado em 17 jan 2023, 09:06

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Bom dia, pessoal. Lá fora, as bolsas asiáticas caíram nesta terça-feira, apesar dos sinais positivos dos mercados globais durante o pregão de ontem, com os investidores reagindo aos importantes dados econômicos do quarto trimestre vindos da China – ainda que acima das expectativas, o gigante asiático registrou seu segundo menor crescimento econômico anual em quase 50 anos. Adicionalmente, os investidores também estão avaliando a persistência da inflação e a possibilidade de recessão. 

Acompanhando o humor negativo, os mercados europeus têm queda nesta manhã. A mesma direção para baixo pode ser verificada nos futuros americanos — os ativos dos EUA voltam hoje do feriado de Martin Luther King Jr., que fechou os mercados por lá ontem. A temporada de resultados ganha força nesta semana, em paralelo à divulgação de alguns dados econômicos importantes por lá. No Brasil, voltamos a nos preocupar com o contexto político, diante da chance de nova derrota de Haddad. 

A ver… 

· 00:45 — E o salário-mínimo? 

Por aqui, além do interminável debate sobre os desdobramentos do caso Americanas, ainda temos que voltar a nos preocupar com a nova possibilidade de derrota da equipe econômica na discussão sobre um aumento maior do salário-mínimo. Se o pacote de medidas da semana passada, apesar de dar uma direção um pouco mais positiva, já ficou apagado, o risco agora é de novo ruído fiscal relevante prejudicando a curva de juros e o câmbio. 

Ao que tudo indica, o presidente Lula está estudando subir o valor do mínimo acima dos R$ 1.320 previsto no orçamento para o ano firmado no final de 2022. O problema é que para cada R$ 1,00 de aumento no valor do mínimo estima-se um impacto de R$ 370 milhões. Para uma equipe econômica, que esperava poder levar o déficit para algo entre 0,5% e 1% ainda em 2023, a possibilidade de derrota não é uma opção.  

É problemático porque o salário-mínimo atual de R$ 1.302 já cumpria a promessa de campanha, com aumento real (acima da inflação) de 1,41%. É pouco, sim, mas melhor do que houve nos últimos anos. Ou seja, caso caminhemos para mais aumentos (as centrais sindicais pedem mais de R$ 1.340,00), podemos esvaziar novamente o poder da equipe econômica, prejudicando o trabalho de sinalizar responsabilidade fiscal. 

· 01:44 — Dados econômicos e o encontro de Yellen 

Nos EUA, os investidores devem enfrentar hoje a volta do feriado do mercado, com a divulgação do Livro Bege e da inflação ao produtor, ambas previstas para amanhã, na cabeça dos agentes preocupados com atividade e nível dos preços em 2023. Ainda temos esperança de que haja um ritmo moderado de crescimento, o qual possibilitaria uma menor pressão inflacionária e, consequentemente, menos espaço para mais juros.  

Ao mesmo tempo, há uma preocupação com a temporada de resultados, que hoje conta com nomes como Morgan Stanley e Goldman Sachs, caso haja uma desaceleração exacerbada dos números corporativos, sinalizando uma recessão mais dura do que se pressupunha. Até agora, pelo menos, das 29 empresas do S&P 500 que divulgaram lucros, 24 superaram as expectativas dos analistas. O problema é que, como se não bastasse as perspectivas econômicas, ainda há geopolítica para hoje. 

A secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, deve realizar uma reunião com o vice-primeiro-ministro chinês, Liu He, no Fórum Econômico Mundial, em Davos. A ideia seria reforçar a coordenação das políticas macroeconômicas e financeiras entre as principais economias do mundo. O encontro deve acontecer amanhã, dia 18 de janeiro, e pode concluir a implementação dos acordos firmados entre o presidente dos Estados Unidos e o presidente da China, Xi Jinping, no final do ano passado. 

· 02:40 — Ventos europeus 

Os mercados europeus digerem os dados trabalhistas do Reino Unido, que mostraram menos contratação em dezembro. A força adicional no mercado de trabalho reforça o que tem sido dito pela autoridade monetária, de que as taxas de juros terão que entrar em território restritivo para trazer a inflação de volta à meta. O mesmo pode ser observado na Zona do Euro: dificilmente o BCE irá frear o aperto monetário agora. 

Para ajudar, os dados de sentimento provenientes da Alemanha (a pesquisa ZEW de especialistas econômicos) vieram mais fortes do que o esperado. Por um lado, o movimento sinaliza que uma recessão dura no velho continente é menos provável. Por outro, uma atividade econômica forte e a manutenção do patamar de inflação em níveis elevados prejudicam o espaço para flexibilização da política monetária. 

· 03:29 — O crescimento chinês 

O mundo foi surpreendido ontem com a notícia de que a população da China caiu em 2022 pela primeira vez em seis décadas. Uma das forças do PIB de um país deriva da quantidade de pessoas que nele vivem e quantas delas trabalham (crescimento populacional e crescimento da produtividade). Em outras palavras, populações em queda tornam o crescimento negativo mais provável, o que provavelmente será uma preocupação latente no mundo nas próximas décadas. 

Coincidentemente, tivemos também dados de crescimento econômico chinês também. A economia da China teve um crescimento anual de 2,9% no quarto trimestre, sendo um número melhor do que o esperado (a composição dos dados sugere uma queda na participação do consumidor no PIB, podendo significar um crescimento de pior qualidade e com menor tendência para os próximos trimestres). 

Podemos ver a força da China em 2023 com seu processo de reabertura. O país afetou fortemente a atividade econômica nos últimos meses, devido ao aumento de infecções, escassez temporária de mão de obra e interrupções na cadeia de suprimentos. Uma reversão desse processo pode servir de amortecedor da desaceleração global, dando suporte às matérias-primas.  

· 04:25 — Há motivos para otimismo 

Nem tudo é desgraça lá fora; afinal, ainda não estamos em recessão. Nos EUA, por exemplo, a contração ainda não se verifica de maneira unilateral, com mercado de trabalho ainda forte. Ao mesmo tempo, como também se verifica em outras regiões do mundo, ainda que o custo de vida esteja elevado, a taxa de inflação parece ter atingido o pico. As notícias são positivas para quem quer trabalhar com um 2023 mais otimista. 

Em sendo o caso, talvez haja uma nítida desaceleração da economia, como deveria ser em qualquer ciclo econômico em que há contracionismo monetário, mas nada catastrófico. O movimento pode ser positivo para o Brasil, que costuma ser considerado um grande beta global (as coisas vão muito bem quando o mundo vai bem). Assim, mesmo que cresçamos menos em 2023, talvez evitemos a recessão.    

Um abraço, 

Matheus Spiess 

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.