Bom dia, pessoal. Lá fora, os mercados asiáticos fecharam no vermelho nesta quarta-feira, acompanhando os sinais mistos de Wall Street durante a noite, enquanto os investidores digerem os principais dados de inflação dos EUA, que aceleraram em janeiro, mas ficaram em linha com as estimativas, provavelmente frustrando as esperanças de que o Fed dos EUA pudesse diminuir ainda mais o ritmo de suas altas nas taxas de juros — vale acompanhar as vendas no varejo e a produção industrial.
O humor negativo também é verificado nos futuros americanos nesta manhã, uma vez que as apostas agora começaram a se concentrar em uma desinflação cada vez mais lenta e, consequentemente, um juro acima de 5% por mais tempo. Pelo menos os mercados europeus conseguem sustentar alguma alta, mesmo que modesta. A temporada de resultados segue lá fora e aqui dentro, enquanto voltamos a nos preocupar com os atritos entre Poder Executivo e Banco Central no Brasil.
A ver…
· 00:45 — “Quando um não quer, dois não brigam” parece não servir para o BC
Por aqui, depois das excelentes contribuições de Roberto Campos Neto no Roda Viva e no CEO Conference, do BTG, as coisas pareciam começar a caminhar em um sentido um pouco mais positivo. Mas a felicidade não durou muito. Lula e sua base voltaram a atacar a taxa de juros elevada e a autoridade monetária, mesmo com ela tendo deixado aberto o caminho para um diálogo saudável.
Veja, ainda que incomodem, não importam as considerações de Lindbergh, Hoffmann e Mantega — são secundários hoje. Importa mesmo Lula e Haddad. Pelo menos um deles está focado em ajudar (Haddad), já deixando claro que a mudança das metas não entrará na pauta do CMN de amanhã. O problema foi o rumor de que Lula queria um aumento de 1 ponto na meta de 2023, para ter Selic a 12% até o final do ano.
Ainda que o boato tenha sido desmentido, o estrago já estava feito. Teremos mais disso nas próximas semanas, até que haja uma apresentação do novo arcabouço fiscal, contanto que ele seja crível, claro (deverá ser, Ceron é bem competente e leva seu trabalho a sério). Enquanto isso, continuaremos a conviver com essa volatilidade diária. Sobre o tema, vale acompanhar Haddad hoje, também no evento do BTG.
· 01:47 — Digerindo a inflação
Nos EUA, o ganho na comparação anual do índice de preços ao consumidor foi de 6,4%, o que representa uma desaceleração contínua em relação ao pico de junho. No entanto, a comparação mensal conta uma história um pouco diferente, com os preços subindo 0,5% em janeiro, contra um ganho de 0,1% em dezembro. De maneira geral, o relatório parece aquecido, considerando que a desaceleração da desinflação foi abaixo do esperado pelo mercado (se projetava uma queda para 6,2% no ano).
Muitos dos ganhos foram atribuíveis à habitação; afinal, o índice de abrigo foi de longe o maior contribuinte para o aumento mensal de todos os itens, respondendo por quase metade do aumento mensal de todos os itens. De certa maneira, esse domínio de habitação oferece algum conforto aos investidores. O sentimento geral, contudo, ainda é de desapontamento. Vale ver mais dados de atividade para confirmar a tendência, como o índice do mercado imobiliário de fevereiro e as vendas no varejo de janeiro.
· 02:36 — Questões europeias
O dia começa bem nos mercados europeus, na expectativa para a fala da presidente do BCE, Christine Lagarde. Qualquer novidade sobre os próximos passos da política monetária pode ter efeito direto no mercado, assim como a coleta dos dados de produção industrial da Zona do Euro, também previstos para hoje. Sem falar, claro, na temporada de resultados corporativos, que também serve de termômetro econômico.
Fora isso, ainda na Europa, os investidores digerem a inflação dos preços ao consumidor no Reino Unido, que veio abaixo do esperado. O movimento ajuda na descompressão de taxas na curva de juros, ainda que não necessariamente tenha efeito nas próximas decisões de política monetária, as quais ainda devem se manter em modo contracionista até uma desaceleração mais acentuada da inflação.
· 03:13 — E a demanda global
Para a felicidade do mercado de commodities, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) elevou sua projeção de crescimento da demanda global de petróleo em 2023, pautando principalmente o relaxamento das restrições da Covid-19 na China, tese que já conversamos algumas vezes e pode ser facilmente um dos temas do ano. Com isso, a demanda global por petróleo deve crescer em 2,32 milhões de barris por dia (a expansão chinesa corresponde a mais 590 mil barris em 2023).
Enquanto isso, a oferta deve ser reduzida de 1,5 milhão de barris por dia para 1,4 milhão, em especial por conta da queda da oferta de petróleo russo, assim como uma oferta mais fraca vinda dos EUA. Dessa maneira, o contexto de maior aperto na curva de oferta e demanda da matéria-prima deve sustentar o preço em patamares elevados, o que pode ser benéfico para países exportadores, como é o caso do Brasil (nosso segundo item mais importante na balança comercial, só atrás da soja).
· 04:02 — Dança das cadeiras no Japão
O professor de economia Kazuo Ueda foi nomeado o próximo presidente do Banco do Japão (BoJ, na sigla em inglês), a autoridade monetária do país, encerrando semanas de especulação entre os investidores globais. Ele deve suceder Haruhiko Kuroda, que deixará o cargo em abril depois de comandar a instituição por uma década.
O contexto japonês é curioso, uma vez que a nação viveu nos últimos anos um ambiente deflacionário relevante, o que possibilitou juros muito baixos por muito tempo (hoje, apenas eles ainda mantêm juros negativos). Como o BoJ está entre os quatro grandes bancos centrais do mundo, as suas movimentações são importantes.
Muitos pensavam anteriormente que o comando do BoJ iria para um membro experiente, como o vice-governador Masayoshi Amamiya, mas a nomeação surpresa de Ueda pode significar que as coisas podem estar mudando em termos de direção. Isso possibilitaria uma abordagem mais contracionista do Japão depois de anos fortalecendo o Iene frente a outras moedas do mundo.
Um abraço,
Matheus Spiess