Bom dia, pessoal. Lá fora, as ações asiáticas atingiram as mínimas em dois meses nesta segunda-feira, uma vez que os mercados foram forçados a precificar picos cada vez mais altos para as taxas de juros dos EUA e da Europa, derrubando os preços dos títulos globalmente e sustentando o dólar perto das máximas de várias semanas. O gatilho mais recente foi a medida predileta do Fed para avaliar a inflação americana, o PCE, que veio acima do esperado. O mercado começa gradualmente a esperar por mais três altas dos juros.
A semana será importante no âmbito internacional, com vetores na Ásia e nos EUA. Na China, por exemplo, teremos algumas pesquisas sobre o setor manufatureiro, sem falar no início do Congresso Nacional do Povo, que apresentará novas metas e políticas econômicas, bem como uma reorganização de funcionários do governo. Enquanto isso, nos EUA, contamos com algumas falas de autoridades e eventos corporativos, como reuniões anuais de empresas (Tesla, Chevron e Goldman Sachs, por exemplo).
A ver…
· 00:48 — Se era para ser gradual, já tinha que ter começado em janeiro
No Brasil, a notícia na última sexta-feira do IPCA-15, a prévia da inflação oficial, também não foi das melhores, depois que o indicador veio acima do esperado, surpreendendo negativamente o mercado. Uma inflação mais resiliente, como sabemos, dá ainda menos espaço para o Banco Central reduzir os juros. Por isso será importante acompanharmos na semana as conversas envolvendo a volta dos impostos sobre a gasolina, na mesma semana em que a Petrobras divulga seus resultados.
Nesta segunda-feira, Lula se encontra com Haddad, o ministro da Fazenda, e Jean Paul Prates, o presidente da Petrobras, com quem já havia se reunido na semana passada. Como a Medida Provisória que prorrogou a desoneração para a gasolina e o etanol acaba na terça-feira (28), o governo estuda maneiras para minimizar o impacto no consumidor. Isso não soa bem para o fiscal brasileiro, já pressionado. A ala política defende que a medida seja prorrogada, enquanto a ala econômica entende que, diante do impacto nas contas públicas, a cobrança dos impostos deve voltar integralmente.
Um meio do caminho seria reoneração parcial, com volta gradual dos impostos, para minimizar o impacto. Francamente, se fosse para irmos por este caminho, o processo já tinha que ter começado em janeiro. Prorrogar por mais dois meses seria péssimo para as contas públicas e há quem diga que sinalizaria mais uma derrota do time de Haddad, o que eu concordo, mas com ressalvas. Haddad é hoje uma das pessoas mais prestigiadas por Lula e, em um governo de frente ampla como o atual, seria natural esperar várias derrotas, não só duas ou três. O que importa são as vitórias.
Outros assuntos da semana incluem a remoção de 1,55 milhão de beneficiários do Bolsa Família (cadastros inapropriados), o que é uma boa sinalização para as contas públicas e um primeiro sinal do que um bom “spending review” (revisão de gastos) poderá gerar, e a troca de diretores do Banco Central. Sobre este último ponto, os nomes de Luiz Awazu Pereira da Silva e Tony Volpon, ex-diretores do BC, são apontados como os favoritos para substituir Bruno Serra na diretoria de Política Monetária. Qualquer um dos nomes seria muito bem recebido pelo mercado, considerando a alta qualidade dos dois.
· 02:36 — O final da temporada
Nos EUA, contamos nesta semana com o final da temporada de resultados do quarto trimestre, com cerca de 35 empresas restantes para reportar — os lucros do S&P 500 caíram mais de 3% em relação ao mesmo período do ano anterior. Entre os destaques, podemos citar Occidental Petroleum, Zoom Video Communications, Monster Beverage, Target, Dollar Tree, Lowe’s, Salesforce e Best Buy.
Além dos resultados, teremos vários indicadores econômicos na semana, como o relatório de bens duráveis nesta segunda-feira, que é visto como um proxy decente para o investimento empresarial, e o Índice de Confiança do Consumidor de março, sem falar dos PMIs (índices de gerentes de compras), que são medidores adequados de atividade econômica na ponta.
Os dados são importantes para mensurarmos para onde caminha a taxa de juros, uma vez que nem todo mundo está tão confiante quanto Jerome Powell de que o Fed pode reduzir a inflação sem também afundar a economia — historicamente, tivemos 16 vezes quando os bancos centrais conseguiram conter a inflação nos EUA, Reino Unido, Canadá e Alemanha sem uma recessão. É preocupante.
· 03:29 — Falas na Europa
No velho continente, temos fala de autoridade monetária na Zona do Euro, com Philip Lane, e na Inglaterra, com Ben Broadbent. Mais detalhes sobre o aperto monetário e seu efeito na economia podem ser dados, o que seria positivo em um mercado que tem falhado em projetar os dados no curto prazo.
É ainda mais grave no Reino Unido, que está com a situação mais delicada entre os países do G7 e ainda precisa resolver a questão do Brexit, em que o atual primeiro-ministro britânico tenta mudar o protocolo de Johnson sobre a Irlanda do Norte, podendo resultar em mais aflição econômica para o país.
· 04:01 — Depois de um ano de guerra
A Rússia teve um grande choque de realidade nas primeiras semanas de invasão da Ucrânia, quando seus militares falharam em tomar Kiev em três dias, como os estrategistas russos previram e as autoridades ocidentais temiam que aconteceria. Em vez disso, enfrenta desde o começo da guerra forte resistência, tendo arrastado o conflito por um ano.
Hoje, os russos não parecem mais querer derrubar o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky. Em vez disso, o objetivo de curto prazo parece ser ganhar controle sobre os territórios que a Rússia anexou no outono passado. O problema é que a Ucrânia ganhou peso e não só quer de volta todos os territórios perdidos para a Rússia, incluindo a Crimeia, como também insiste na sua entrada na Otan e na União Europeia.
Com o impasse, a guerra pode se arrastar por muito mais tempo, sem que nenhum dos lados seja capaz de fazer progressos significativos. As infinitas propostas de paz ao redor do mundo pouco efeito tem, não devendo trazer a paz, mas podendo parar o conflito de tempos em tempos. Claramente, a Ucrânia depende muito do interesse do Ocidente na guerra, para dar suporte às demandas de Kiev.
· 04:50 — Muito pouco provável
No aniversário da invasão, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, afirmou querer discutir um acordo de paz com Moscou envolvendo a China e países da América Latina e a África, como proposto inclusive pelo presidente brasileiro, Lula, e por lideranças chinesas. O problema é que os dois lados estão muito inflexíveis, o que torna qualquer acordo muito pouco provável.
Ao longo dos próximos meses, talvez vejamos mais líderes se reunindo em uma espécie de “clube da paz”, como apresentado pelo governo brasileiro. A ideia, inicialmente rejeitada pelos EUA e aliados, não encontrou resistência entre Zelensky e Putin. E não, a proposta da China não dará em nada, uma vez que desagrada os dois lados em pontos chave — mais serve para estabelecer neutralidade de Pequim.
Um abraço,
Matheus Spiess