Bom dia, pessoal. Lá fora, os mercados asiáticos caíram novamente nesta sexta-feira, após a queda em Wall Street durante o pregão de ontem. O principal vetor do pessimismo internacional deriva de problemas em um credor regional americano, o que gerou preocupações sobre o setor financeiro em geral, à medida que o Fed aumenta as taxas de juros. Adicionalmente, há muito nervosismo para o recebimento dos dados de emprego nos EUA hoje, uma vez que os números podem ser definitivos para a política monetária.
O tom é bem pessimista entre os mercados europeus e futuros americanos, estendendo a queda de ontem. Há muita ansiedade reservada para hoje, podendo criar uma volatilidade exacerbada ao longo do pregão. O Brasil segue essa dinâmica, enquanto acompanha os novos episódios de Brasília, que se prepara para receber o novo arcabouço fiscal nos próximos dias, e espera os dados de inflação reservados para hoje. A situação fica um pouco mais complicada porque o pessimismo, pelo menos por enquanto, espraia para as commodities, deixando pouco espaço para fugir.
A ver…
· 00:50 — Inflação e reuniões
Por aqui, o grande destaque econômico brasileiro é o IPCA de fevereiro, que deverá mostrar a inflação oficial crescendo 0,78% em fevereiro. Se confirmado, o número seria uma aceleração frente ao 0,53% registrado em janeiro, ainda que represente uma desaceleração na comparação anual, recuando de 5,77% para 5,54%. Será importante verificarmos também o dado de difusão, que traduz o quanto o avanço dos preços está se espalhando, e o núcleo do indicador, que exclui itens mais voláteis, como alimentos.
Além da inflação, ainda acompanhamos a novela sobre o novo arcabouço fiscal, que deverá ser apresentado nos próximos dias, antes do Copom de 21 e 22 de fevereiro. Até lá, outro vetor de preocupação pode ser o diálogo com o Congresso. Hoje, Lula conversa com Haddad pela manhã sobre o tema — Haddad, aliás, concede entrevista hoje às 19h, podendo dar pistas sobre a condução da política econômica — e janta com Lira mais tarde, justamente para tratar da governabilidade.
· 01:38 — E o emprego?
Nos EUA, os investidores se debruçam sobre o dado de emprego de fevereiro, depois da surpresa de meio milhão de novas posições em janeiro, algo completamente fora das projeções (o número mostrou mais de 300 mil empregos acima do esperado então). O relatório deverá apontar para uma adição de 215 mil empregos não-agrícolas no mês, enquanto a taxa de desemprego deverá ficar em 3,4%.
É difícil compreender o que está acontecendo com o mercado de trabalho americano, principalmente depois de um longo período com crescimento real do salário no patamar negativo e com o grau de rotatividade pós-pandemia, além das mudanças estruturais, com diferentes tipos de emprego sendo mais demandados hoje. Por isso, o resultado de hoje terá impacto direto na decisão do Fed, podendo reacelerar o ajuste monetário.
Ainda acredito ser difícil voltar a observar mais ajustes agressivos de 50 pontos-base, mas tudo pode mudar com o dado de hoje e a inflação de terça-feira que vem. Se os dois números superarem as estimativas, há espaço para um tom ainda mais duro neste mês, mesmo com o nervosismo envolvendo o setor de crédito de médio porte nos EUA, depois do colapso de alguns nomes no pregão de ontem.
· 02:37 — O setor bancário americano
Ainda nos EUA, as ações relacionadas a bancos não ajudaram o ânimo do mercado, com JPMorgan Chase e Wells Fargo caindo 5% e 6%, respectivamente. No geral, as ações financeiras do S&P 500 caíram 4,1% na quinta-feira. E o que aconteceu? Bem o SVB Financial Group, controlador do Silicon Valley Bank (o “banco do Vale do Silício”), registrou um grande prejuízo, provocando a venda de ações de grandes bancos dos EUA — a instituição vendeu títulos de sua carteira por um prejuízo de US$ 1,8 bilhão, ao mesmo tempo em que anunciava planos para levantar capital por meio de uma oferta de ações ordinárias e preferenciais. A informação gerou muito pessimismo.
As ações da SVB Financial caíram 60% ontem e perdem mais de 40% no pré-mercado desta manhã. O problema está acontecendo na mesma semana que outro banco americano, o Silvergate, especializado em criptomoedas, anunciou a própria liquidação financeira. O estrago foi tão grande que outras regiões também sentem o nervosismo, como a Europa, que vê seu setor bancário duramente atingido ainda nesta manhã. Se for algo sistêmico e não isolado, podemos estar nos aproximando de um “credit crunch” nos EUA, assim como se teme que esteja acontecendo no Brasil. Neste caso, a recessão estaria mais próxima do que poderíamos imaginar.
· 03:40 — Os japoneses e o aperto monetário
O mercado amanheceu já sabendo da decisão de política monetária do Banco do Japão. Na última reunião comandada por Haruhiko Kuroda, que deverá ser substituído no cargo por Kazuo Ueda em abril, a autoridade manteve inalterada a taxa de juros de curto prazo em -0,1%.
Segundo os comentários desse último encontro, o relaxamento monetário no país ajudou a impulsionar a economia, sendo que seus efeitos positivos seriam bem maiores do que os efeitos colaterais. Na cabeça dos japoneses, portanto, seria muito cedo para se discutir a saída do relaxamento monetário.
Kuroda foi o arquiteto da política de juros negativos no Japão ao longo da última década. Havia muita ansiedade pela escolha de seu substituto, mas o próximo presidente do BoJ deverá manter a política relaxada da autoridade, a única que ainda se vale de juros negativos no mundo, um movimento bem controverso hoje em dia.
· 04:24 — Argentinos e russos
Muitos russos cada vez mais se dirigem para a Argentina, fugindo de seu país de origem. Los hermanos estão fornecendo um refúgio da guerra para quem não aguenta mais a situação no leste europeu, diante de uma repressão crescente à dissidência. São poucas alternativas para quem quer fugir de Putin, considerando as rígidas restrições de visto que surgiram contra os russos em outras partes do mundo.
Mais de 22 mil russos entraram na Argentina, onde a inflação se aproxima dos três dígitos, desde o início do ano passado, embora cerca de 60% deles já tenham saído (usaram o país como ponto de parada, apenas), de acordo com o Ministério da Imigração da Argentina.
Ao mesmo tempo, o fluxo de russos qualificados profissionalmente pode ajudar a Argentina a enfrentar o gap profissional dos que fugiram do país para a Europa nos últimos anos, escapando da incerteza econômica. Os russos parecem preferir, portanto, 100% de inflação a uma economia de guerra.
Um abraço,
Matheus Spiess