Investimentos

Resultados trimestrais americanos: os números realmente estão ‘melhores que o esperado’? Comparação anual de Netflix, Tesla e Blackstone mostra realidade

Manchetes têm confundido expectativas com realidade e mercado não tem reagido adequadamente a resultados trimestrais americanos

Por João Luiz Piccioni Junior

24 abr 2023, 11:29 - atualizado em 24 abr 2023, 11:29

Resultados trimestrais (1T23) de empresas americanas estão mesmo 'melhores que o esperado'?
Imagem: Freepik

As ondas de choque provenientes dos resultados trimestrais divulgados na semana passada não foram suficientes para gerar pânico nos investidores. As manchetes que confundem expectativas com a realidade distorcem a percepção do processo econômico dentro do ciclo.

A impressão de que os números estão vindo “melhor que o esperado” só pode ser questionada quando as comparações são feitas de forma nua e crua. O lucro por ação da Netflix (Nasdaq: NFLX), por exemplo, alcançou a marca de US$ 2,88 e superou as expectativas em US$ 0,01. Entretanto, na comparação anual, contra o mesmo trimestre de 2022, a marca registrada foi 18% menor.

Esta foi a mesma tônica dos números da Tesla (Nasdaq: TSLA): o lucro por ação de US$ 0,85 veio praticamente em linha com as expectativas, mas ele é 20% menor frente ao observado no 1T22. Se a comparação for feita com o trimestre imediatamente anterior, a retração dos lucros supera os 28%.

O mesmo valeu para a TSMC (NYSE: TSM), American Express (NYSE: AXP), Blackstone (NYSE: BX), entre outras. Todas com a mesma dinâmica de deterioração de lucros frente ao ano anterior. As chances são muito grandes de que o pico do ciclo de negócios tenha ficado para trás.

Em outros momentos, esta leitura seria suficiente para provocar uma reavaliação de ativos de risco. Vale relembrar, por exemplo, como a primeira perna da deterioração dos resultados das Emerging Techs acabaram por empurrar as ações para baixo. Atualmente, a complacência tem dominado o comportamento dos investidores, que se veem ancorados nas memórias dos bons anos do final da década passada.

Tomemos por exemplo o VIX, apelidado de “índice do medo”. Rememorando, ele mede a volatilidade de calls e puts do índice S&P 500. Quanto maior a volatilidade, maior a concordância em pagar mais caro por um seguro. Após a virada do ano, foi possível perceber claramente a queda do índice para níveis inferiores aos 20 pontos, patamar considerado como um ponto limítrofe entre a euforia e a ansiedade.

Gráfico 1 — O índice VIX em 2023. Fonte: Koyfin.

O problema do mar calmo é que ele traz consigo a hipótese de turbulência à frente. Rememoro o começo de 2008, após a quebra do Bear Stearns em março. A percepção era de que, após a sua incorporação feita pelo JP Morgan, os problemas no setor financeiro estavam contidos. O VIX se comportou exatamente da mesma forma como agora. Veja o gráfico a seguir.

Gráfico 2 — O índice VIX em 2008. Fonte: Koyfin.

Os resultados das Big Techs que serão divulgados nesta semana serão chave. Atenção especial para os números da Amazon (Nasdaq: AMZN | B3: AMZO34) e da Apple (Nasdaq: AAPL | B3: AAPL34). A primeira, vai indicar qual a verdadeira condição do consumidor americano; a segunda por representar mais de 7% do índice S&P 500 na atualidade. Números mais fracos poderão deixar mais claro o rumo da economia americana. Pode ser o estopim para um pouco mais de turbulência nesse ambiente mais calmo. A conferir.

CIO da Empiricus Gestão. Graduado em Engenharia e Administração de Empresas pela FEI e FGV-EAESP, respectivamente, e mestre em Finanças pela FGV-EESP. Possui mais de 15 anos de experiência em análise de investimentos e gestão de recursos. Certificações CNPI (Apimec), CGA (Certificado de Gestores Anbima) e CQF (Certificate of Quantitative Finance).