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Mercado em 5 minutos

Mercado digere manutenção dura da Selic e aguarda decisão de juros do Reino Unido; confira o que é notícia nesta quinta (22)

Na noite de ontem (21), o presidente do BC decidiu que a Selic fica no mesmo patamar de 13,75% e não mencionou possíveis quedas à frente, o que pode frustrar investidores hoje. Enquanto isso, o Congo tenta aproximação com a China e os EUA, com a Índia.

Por Matheus Spiess

22 jun 2023, 08:51 - atualizado em 22 jun 2023, 08:51

Manutenção dura da Selic - política monetária
Imagem: Unsplash

Bom dia, pessoal. Lá fora, os mercados da Ásia e do Pacífico fecharam predominantemente em queda depois que os investidores ficaram confusos com a fala do presidente do Federal Reserve dos EUA, Jerome Powell, que previu mais aumentos de juros, dizendo que o processo para levar a inflação aos 2% ainda tem um longo caminho a percorrer. Hoje, quase todos os participantes do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) esperam que seja apropriado aumentar as taxas de juros um pouco mais até o final do ano. Mais detalhes podem ser dados hoje em novo depoimento. 

Os mercados europeus e os futuros americanos caem nesta manhã. Na agenda, além da nova fala de Powell ao Congresso, desta vez no Senado, contamos com a digestão da decisão de política monetária no Reino Unido, que precisa enfrentar uma inflação acima do esperado e acelerando — a alta pode ser de 25 ou de 50 pontos-base. Por aqui, os ativos locais precisarão enfrentar não só um dia ruim no âmbito internacional, com queda dos principais mercados estrangeiros e das commodities, como também temos que lidar com a conclusão do Comitê de Política Monetária (Copom) de ontem. 

A ver… 

· 00:46 — O conto de um funcionário público 

No Brasil, o grande vetor do dia será a compreensão em sua completude do comunicado do Copom divulgado na noite de quarta-feira (21). Conforme o esperado, a autoridade monetária manteve a Selic em 13,75% ao ano. Até aí tudo bem. O problema foi o direcionamento para os próximos passos. Ainda que tenha retirado a frase que alertava para a retomada do aperto monetário, as palavras de Roberto Campos Neto soaram mais pesadas do que muitos esperavam (inclusive eu). Dito de outra maneira, o comunicado veio mais dovish (flexível) do que o último Copom, mas menos do que o mercado gostaria. Com isso, a leitura imediata, relativamente mais hawkish (contracionista) e conservadora, pode não ser bem recebida pelos ativos de risco hoje. 

Antes, a maioria dos investidores acreditava que agosto poderia ser o início do ciclo de cortes; agora, setembro deverá ganhar força. Ao mesmo tempo, o documento melhorou as expectativas de inflação para 2023 e 2024, em linha com o que temos visto em diversos Boletins Focus, e ainda se mostrou evidentemente “data dependent” (dependente de dados).

Como teremos o IPCA-15 de junho e julho e o IPCA fechado de junho até a próxima reunião do Copom, provavelmente conseguiremos argumentos mais fortes para cortar em 25 pontos-base em agosto, o que possibilitou a manutenção do meu cenário base para início do ciclo de cortes dos juros — a tese de um corte mais agressivo de 50 pontos parece ter saído da mesa (pelo menos por enquanto).  

A verdade é que o BC manteve sua coerência conservadora e quer garantir a posse de alguma alavancagem antes da reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN) na semana que vem (dia 29), que ganhou ainda mais importância. A meta de inflação em 3% deve ser mantida, alterando apenas o horizonte de atuação e, talvez, as bandas de tolerância. Contanto que a inflação siga caindo, assim como as expectativas, o plano de voo para um ponto de inflexão no terceiro trimestre foi mantido. Nas palavras do meu colega Rodolfo, o que vimos foi um “joguinho de cena para ganhar tempo e não correr risco de tomar invertida. Se o sertanejo é, antes de tudo, um forte, o presidente do BC é, antes de tudo, um funcionário público com LTV privado.” 

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· 01:59 — Ninguém entendeu o que ele falou 

Nos EUA, os mercados receberam uma mensagem dura do testemunho do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, no Congresso ontem, logo após uma pausa nos aumentos das taxas de juros na semana passada. O Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) manteve a faixa-alvo da taxa dos fundos federais entre 5% e 5,25% ao ano, mas a projeção mediana das autoridades sinalizou outro meio ponto percentual de aumento das taxas até o final do ano. A mensagem de que a luta contra a inflação ainda não terminou ficou bem clara. Quase todos os participantes do comitê esperam que seja apropriado aumentar as taxas de juros um pouco mais até o final do ano. 

Faz sentido. Afinal, as pressões inflacionárias continuam altas e o processo de reduzir a inflação para 2% ainda tem um longo caminho a percorrer. Assim, o Fed permanece no modo “dependente de dados”, assim como o BC brasileiro, tomando decisões uma reunião por vez, conforme o cenário macro merece.

Os mercados, e especialmente as ações de crescimento caras, adorariam um sinal claro e definitivo do Fed de que o fim do aperto nas políticas chegou. Certamente, não tivemos isso ontem. Powell estará de volta ao Capitólio hoje de manhã para testemunhar perante o Comitê Bancário do Senado. Novas palavras confusas podem pesar sobre os ativos internacionais. 

· 02:52 — O pesadelo britânico 

O Reino Unido passa por um de seus momentos mais delicados dos tempos modernos. Ainda que tenhamos visto queda no núcleo da inflação de preços ao produtor, em linha com os índices da Zona do Euro, a inflação ao consumidor segue acelerando e vindo acima do esperado. Por isso, a decisão do Banco da Inglaterra hoje será importante. O banco central está praticamente certo de que aumentará sua taxa básica pela 13ª reunião consecutiva, provavelmente em 25 pontos-base, para 4,75%. O Reino Unido tem uma das maiores taxas de inflação entre os países desenvolvidos, e os investidores esperam pelo menos mais quatro aumentos de juros até o final do ano. 

A situação não é confortável para a economia britânica. Os ingleses caíram seis posições no ranking de competitividade econômica global porque os líderes empresariais perderam a confiança no país, em parte devido à “incompetência do governo”. O ranking anual de Competitividade Mundial do International Institute for Management Development viu o Reino Unido cair da 23ª para a 29ª posição entre 64 países (não pergunte a posição do Brasil, não vem ao caso).

No fundo, anos de subinvestimento estão atrasando o crescimento. A Grã-Bretanha pode se tornar uma das grandes tragédias econômicas da primeira metade do século. 

· 03:34 — O alinhamento africano 

Dois desenvolvimentos recentes envolvendo a maior nação da África subsaariana mostram como a Segunda Guerra Fria (entre EUA e China) está se configurando com uma diferença fundamental em relação à Primeira Guerra Fria, sendo que as implicações para as nações em desenvolvimento podem ser profundas. O presidente da República Democrática do Congo visitou Pequim recentemente para pressionar a China a aumentar os investimentos em seu país. Dias antes, a Casa Branca havia anunciado que os EUA estudam o financiamento de uma ligação ferroviária do Congo a um porto atlântico na vizinha Angola. Quanto mais dinheiro fluir, melhor. 

Durante a Guerra Fria original, grandes áreas do mundo em desenvolvimento serviram como locais para guerras por procuração em nome dos EUA e da União Soviética. Mas a Segunda Guerra Fria é diferente. Parece difícil imaginar uma série de guerras por procuração entre os EUA e a China em nações em desenvolvimento que resolveram amplamente suas estruturas pós-coloniais. Em vez disso, esses dois blocos estão competindo no campo de batalha econômico. Isso pode ser uma ótima notícia para os fluxos de investimento para as nações em desenvolvimento, como o Congo está testemunhando agora. O Brasil, claro, estaria na lista de beneficiados. 

· 04:21 — Modi na Casa Branca 

Desde o fim da Guerra Fria, todos os presidentes dos Estados Unidos tentaram fortalecer as relações com a Índia. Afinal, laços de defesa mais estreitos com a maior democracia do mundo promoveriam os interesses dos EUA na Ásia, e uma abertura de laços econômicos com o país mais populoso do mundo criaria enormes oportunidades para empresas e consumidores americanos. Hoje, o presidente Joe Biden tentará aprofundar os laços com a Índia, quando o primeiro-ministro Modi chegar à Casa Branca para uma visita de estado, a primeira em nove anos. 

A ansiedade compartilhada sobre a China deve ser um dos tópicos de discussão. Há aqui uma oportunidade para a Índia, o maior comprador de armas do mundo: comprar armas e tecnologias poderosas que os EUA normalmente reservam para seus aliados mais próximos. Os EUA, que já são o principal parceiro comercial da Índia e o maior investidor direto, estão felizes em substituir a Rússia como principal negociante de armas da Índia. Biden e Modi também devem discutir projetos para desenvolver tecnologia avançada centrada em semicondutores e inteligência artificial. 

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.