Investimentos

VALE3: comprar ou vender ações da Vale?

Uma das maiores companhias da B3, a mineradora segue firme na pandemia

Por Matheus Egydio

05 jan 2021, 03:12

As ações da Vale (VALE3) são indicadas pelos nossos especialistas Felipe Miranda e Max Bohm, nas séries Palavra do Estrategista e Melhores Ações da Bolsa, respectivamente.

Neste artigo, vamos detalhar o racional por trás dessa recomendação, abordando tudo que você precisa saber antes de decidir entre comprar e vender as ações da Vale (VALE3).

Para te orientar melhor, estruturamos o conteúdo nos seguintes tópicos:

A origem e trajetória da Vale: das sombras da II Guerra Mundial até o pódio da B3

Getúlio Vargas foi, de certo modo, um empreendedor em nome do Estado brasileiro. Como já contamos em outro artigo, ele criou a IRB Brasil Resseguros em 1939.

Mas não parou por aí.

Em 1942, com o desenrolar da Segunda Guerra Mundial, ele criou a Companhia Vale do Rio Doce (ou CVRD), que ajudaria a fornecer minério de ferro para a indústria bélica americana na luta contra os nazistas.

Com pressa, a empresa entrou na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro no ano subsequente.

A Vale (VALE3) nasceu com uma alta demanda batendo na porta, mas o cenário mudou com o término da guerra. Sem o mercado americano, a companhia se voltou para as necessidades nacionais.

Esse foi o primeiro grande obstáculo da companhia.

As reservas de ferro no Brasil eram grandes. A busca por elas, nem tanto…

Isso se traduziu numa expansão lenta. Até que, em 1961, Eliezer Batista — pai de Eike Batista — assumiu a presidência e resolveu o impasse: ao invés de estimular a demanda interna, decidiu que o jeito era mesmo aproveitar a busca externa, voltando a Vale (VALE3) novamente para a exportação.

Em 1962, assinou os primeiros contratos de longo prazo com várias siderúrgicas japonesas. A produção da CVRD dobrou. A empresa pública se estabilizaria nas décadas seguintes como uma mineradora relevante globalmente, embora com problemas de eficiência.

Em 1997, a companhia foi privatizada e decolou de vez. Desde então, seu valor de mercado cresceu mais de 2.500%.

Hoje, a Vale é “a maior produtora de minério de ferro, pelotas e níquel do mundo, com presença em cerca de 30 países”, aponta Felipe Miranda.

Fonte: Vale | Elaboração: Empiricus

Entendendo o modelo de negócios por trás da Vale (VALE3)

Já demos alguns spoilers sobre o segmento de atuação da empresa. Mas, se você deixou passar, tudo bem.

A Vale (VALE3) é uma das maiores mineradoras do mundo.

Além disso, ela também possui operações — menos expressivas — nas áreas de logística, energia e siderurgia.

Vamos, então, destrinchar as principais áreas de negócios de VALE3:

  1. Minerais ferrosos, composta majoritariamente pelo minério de ferro e pelotas, mas com participação de manganês e ferroligas também;

  2. Metais básicos, como níquel, cobre e outros subprodutos, como ouro e prata; e

  3. Carvão.

Só que os minerais ferrosos não são tão familiares assim, não é? Considerando isso, vamos esclarecer melhor o papel deles.

Pelota

Começando pela pelota, nada mais é do que minério de ferro transformado em pequenas bolinhas. O propósito é usar essas pelotas na fabricação do aço, algo impossível sem elas pela especificidade técnica do processo.

Ferroligas

As ferroligas, por sua vez, são combinações de ferro com elemento(s) químico(s), como o manganês. A ideia é adicioná-las no aço, para conceder a este alguma propriedade especial — como resistência ou maleabilidade.

Manganês

E, por falar em manganês, este mineral serve para as mais variadas aplicações: panelas, pilhas, pontes, tintas e até mesmo rações animais.

Minérios Ferrosos

Apesar de não estarmos tão familiarizados com suas formas brutas, os minérios ferrosos são muito presentes em nossas vidas. É uma “demanda praticamente inesgotável de um dos maiores mercados do mundo”, enfatiza Rodolfo Amstalden, sócio aqui na Empiricus.

No mais, trata-se de um mercado firme em tempos de disrupção — nenhuma tecnologia inovadora ameaça as panelas de nossas casas.

As lideranças da Vale compreendem essa demanda do mercado por minério de ferro. Quando analisamos a empresa sob uma ótica de receita, essa linha desbanca todas as outras:

Fonte: Vale | Elaboração: Empiricus

Entretanto, precisamos destacar que esse bom cenário não é o suficiente para eles. Querem mais. E já têm um plano para conseguir.

A meta de produção da companhia é saltar dos 318 milhões de toneladas para 400 milhões até 2022. A melhor parte é que pretendem alcançar isso sem a necessidade de grandes investimentos.

Rodolfo detalha: “o plano passa pela construção de novas facilities e barragens, principalmente nos sistemas Sudeste e Sul, voltando a operar com 100% de capacidade; e considera o próprio crescimento do Sistema Norte, especialmente o S11D (o maior complexo minerador da história da Vale)”.

Fonte: Vale

Como podemos ver, a distribuição geográfica da Vale é bastante intensa nos três primeiros sistemas, mas nem tanto no último.

O Sistema Norte contempla o município de Canaã dos Carajás, no sudeste do Pará. Como dito, aqui fica o S11D, o maior projeto da companhia.

A capacidade produtiva já foi exposta, então vamos nos ater ao ponto alto dos bastidores: no S11D, os investimentos tecnológicos foram pesados e justificam o alto desempenho. Como destaque, há o sistema truckless — 30 quilômetros de correias transportadoras que substituem 100 caminhões, diminuindo a quantidade de resíduos e 70% do consumo de combustível — e o uso de drones sofisticados que ajudam no planejamento de curto prazo da mina.

O Sistema Sudeste engloba os complexos de mineração de Itabira, Minas Centrais e Mariana, todos em Minas Gerais. Neste último, ocorreu o rompimento da barragem pelo uso intensivo de beneficiamento a úmido, um processo que explicaremos adiante.

Em termos de produção, o terceiro lugar fica com o Sistema Sul, que contempla os complexos de Paraopeba e Minas Itabirito, em Minas Gerais; assim como o de Vargem Grande, em São Paulo.

Além disso tudo, a VALE3 possui um diferencial.

O grande diferencial das ações da Vale (VALE3)

Ainda que uma das maiores mineradoras em escala global, ela também produz o minério de ferro de melhor qualidade do mundo.

Felipe desvenda o motivo: “o minério de ferro da Vale tem o maior teor de concentração do mundo e baixos níveis de impurezas. Por conta disso, seus clientes têm custos de processamento menores nos seus altos-fornos”.

E isso não sai barato, claro. Por esse diferencial, a empresa negocia seu minério com valores premium no mercado internacional.

Os resultados positivos para as ações da Vale

Ao nos aprofundarmos na história e no modelo de negócios da Vale, fica nítido o quanto a internacionalização está no DNA da empresa.

Muito além de acordos estrangeiros, isso se reflete no faturamento dolarizado — ou seja, 100% atrelado ao dólar — da companhia. Não obstante, 50% dos custos são em reais.

Com o patamar cambial alto, como o que vemos atualmente, a Vale se beneficia substancialmente ao ter “ganhos mais do que proporcionais às suas margens”, diz Felipe.

Há outros dois fatores de peso intimamente relacionados que ajudam a Vale: a alta demanda da China e os baixos impactos da recente pandemia.

No Estado chinês, o governo realiza grandes estímulos para impulsionar o setor de infraestrutura do país. Essa tendência não foi refreada durante a crise do novo coronavírus e, “aliada ao aumento dos preços do minério de ferro”, impulsionou o EBITDA da Vale no 3T20, destaca Max Bohm, analista da casa.

Fonte: Bloomberg | Elaboração: Empiricus

Nos aprofundando no impacto da pandemia, a conclusão é que a Vale (VALE3) saiu quase ilesa. A despeito da crise de outros setores da economia, “o minério de ferro caiu apenas 4% no acumulado do ano, em comparação com a queda de 13% de outros metais básicos”, explica Felipe.

As pedras no meio do caminho de VALE3

Há uma série de pontos que enaltecem a Vale como uma companhia digna de ser investida. Entretanto, há o outro lado da moeda também.

E os erros da companhia são conhecidos em grande escala.

É razoável afirmar que quase todos os brasileiros ouviram e assistiram notícias sobre o desastre de Brumadinho. Sem dúvidas, uma falha que ficará marcada na memória coletiva por muito tempo.

Nessa seção, vamos explicar o método que empresas mineradoras usam — e, nesse caso, desencadeou esse triste evento — e o que a Vale está fazendo para mudar essa realidade.

Como a Vale produz seu minério de ferro

O minério de ferro, principal ativo da companhia, é encontrado na natureza na forma de rochas, misturado a outros elementos. Nesse primeiro momento, ele não está apto para ser comercializado.

A mineradora, então, deve realizar um processo de purificação (chamado beneficiamento): úmido ou seco.

A Vale utilizava, em grande escala, a primeira opção. Como o próprio nome sugere, a mineradora utiliza água para filtrar impurezas que prejudicam a qualidade final do produto. O grande problema é a geração de resíduos (ou rejeitos), que não podem ser descartados na natureza de qualquer maneira. Para isso, utilizam-se as barragens.

Na segunda opção, o nome também é autoexplicativo. Retira-se a água do processo e, assim, não há rejeito. Consequentemente, barragens se tornam desnecessárias.

“A solução definitiva para reduzir o risco de rompimento é não ter barragens”, esclarece Felipe. Dessa forma, não há outro caminho que não o beneficiamento a seco.

E a Vale já segue nesse caminho: em 2019, concluiu 60% da produção através desse método. Reagindo à pressão, a Vale ainda promete que, até 2023, esse número vai subir para 70%.

Entretanto, o que preocupa são os 30% restantes que separam a realidade do cenário ideal…

Além de ainda nutrir novas barragens, o processo de encerramento — conhecido como “descaracterização” — das atuais é bastante lento. Em maio de 2020, a Vale progredia na descaracterização de apenas nove, frente a 124 barragens de minério de ferro e 40 de rejeitos.

Fontes: Empiricus, SIGBM da ANM e RI da companhia

Voltando ao beneficiamento a seco, há vantagens financeiras para a empresa ao realizar essa transição operacional. Quando comparado “com o beneficiamento a úmido, a técnica de processamento a seco reduz o consumo geral de água em 93%, em média”, destaca Rodolfo.

Além disso, ganha-se produtividade por economizar mais recursos, consumir menos energia e reduzir as etapas de produção e equipamentos.

Por fim, “a Vale tem avançado em temas importantes, como governança corporativa, reparação de danos e suporte à comunidade afetada”, diz Rodolfo.

Conclusão: Vender ou Comprar VALE3?

Existe uma série de observações — de exposição cambial até desconto no preço — a serem feitas, mas vamos antecipar as coisas: para os nossos analistas, comprar VALE3 é uma boa decisão.

Agora, vamos explicar os motivos que a nossa analista Cristiane Fensterseifer elencou:

  1. A receita da Vale é 100% dolarizada. Ter VALE3 no seu portfólio é uma grande jogada para aproveitar a tendência de alta da moeda diante do real;

  2. A pandemia causou um impacto mínimo na empresa;

  3. A China, maior cliente da empresa, foi o único país que não teve queda do PIB em 2020 com a pandemia, e deve continuar buscando crescimento de PIB em 2021, mantendo a demanda;

  4. VALE3 é negociada por um EV / Ebitda mais baixo frente aos seus pares mundiais (3,0 vezes para 2021 em oposição à 5,4 vezes da Rio Tinto);
  5. Dividend Yield alto que pode chegar a mais de 10%;

  6. Assinatura de acordo com o governo de Minas Gerais, plano de descomissionamento de barragens, medidas voltadas a questões ESG e carbono neutro reduzem riscos e melhoram a percepção do mercado; e
  7. A mineradora apresentou um lucro líquido de R$ 15,6 bilhões, 195% superior ao apresentado no 2T20.

Assim, Cris Fensterseifer, Max Bohm, Rodolfo Amstalden e Felipe Miranda, três grandes nomes da Empiricus, convergem nessa indicação: compre VALE3.

Sobre o autor

Matheus Egydio

Escreve para o site da Empiricus, MoneyTimes e Seu Dinheiro.