Investimentos

Cielo (CIEL3): vale a pena comprar?

Analistas da Empiricus aconselham compra de ações da adquirente, a despeito de pessimismo do mercado

Por Danilo Moliterno

08 mar 2021, 05:14

As ações da Cielo (CIEL3) são atualmente indicadas por Felipe Miranda e Sérgio Oba nas séries Palavra do Estrategista e Empiricus Serious Trader, respectivamente. Apesar do momento histórico negativo da empresa, os analistas da Empiricus apresentam motivos para se juntar ao time de “contrarians” e comprar os papéis da adquirente.

Neste artigo você confere um breve resumo da trajetória da Cielo — que nem sempre se chamou assim —, os porquês da queda nos resultados da empresa nos últimos anos e, por fim, motivos para acreditar em uma “virada de mão”. A fim de facilitar sua leitura, o texto está dividido em tópicos, os quais você pode acessar através dos links:

De Visanet à Cielo: a revolução nas transações financeiras

Em novembro de 1995, Banco do Brasil, Bradesco, Banco Real (atual Santander) e o já extinto Banco Nacional uniam forças com a Visa Internacional para criar a Visanet. A marca, que mais tarde se chamaria Cielo, nascia com dois grandes objetivos: unificar as relações com todos os estabelecimentos afiliados à bandeira Visa no Brasil e desenvolver novas soluções de processamento de transações financeiras.

Sob impacto da pandemia, Cielo tem seu primeiro prejuízo trimestral -  Economia - Estadão Sede da Cielo, antes Visanet. (Imagem: Divulgação/Cielo)

E o sucesso da iniciativa não demorou a aparecer. Com apenas um ano de vida, a Visanet já contava com 100 mil estabelecimentos afiliados. Além disso, nesse mesmo período, houve um aumento significativo no número de emissões de cartões de crédito por parte dos bancos envolvidos no case.

A chegada de novos produtos como o Visa Electron e o Visa Vale Alimentação fizeram com que, já nos últimos anos do século XX, a empresa se tornasse líder no segmento. Foi nessa época que o brasileiro se acostumou a realizar transações sem utilizar “dinheiro vivo”.

O fim de um “elo” e a queda nos resultados

A partir de 2009, porém, o segmento viraria de cabeça para baixo. Nesse ano, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), pôs fim à exclusividade que a Visanet possuía com as bandeiras Visa e Mastercard. A medida tinha como objetivo estimular a concorrência e assim beneficiar o consumidor.

Até 2008, Visanet e Redecard, de fato, controlavam o mercado brasileiro de cartões de crédito. As empresas eram responsáveis por 94% das transações financeiras e por 90% do volume monetário movimentado por meio de cartões, o que equivalia a R$ 375 bilhões naquele ano.

Após a cisão da exclusividade, a Visanet se tornou Cielo. A Cielo nasceu para navegar em mares muito mais turbulentos do que a sua antecessora, dado o novo cenário de concorrência. “O recente desenvolvimento de novas tecnologias de pagamento e a agressividade de alguns players específicos, como a Stone (Nasdaq: STNE), fez com que os lucros da Cielo despencassem nos últimos anos”, aponta Felipe Miranda. 

O resultado:

 

Após a quebra de exclusividade de bandeiras, o setor, que contava com 20 adquirentes, passou a ter 200. E o marketshare da empresa passou de 50% para 30%. Os lucros caíram de maneira aguda: os R$ 4 bilhões contabilizados em 2018 rapidamente se tornaram R$ 490 milhões em 2020.

Por que ser um “contrarian”?

Se engana quem pensa que 2009 foi um ano marcante para a Cielo apenas pelo baque da quebra da exclusividade. Nesse mesmo ano, a empresa abriu seu capital na bolsa brasileira — na época ainda chamada Bovespa —, no maior IPO (oferta pública inicial) da história do Brasil até então: 8,4 bilhões de reais.

O mundo dá voltas. Após mais de uma década, em 2021, um potencial evento societário da Cielo, que poderá envolver o fechamento do capital da empresa, é o primeiro dos motivos para comprar CIEL3.

Atualmente, o controle da adquirente é compartilhado por acionistas do Banco do Brasil e do Bradesco, cada grupo com 28,5% das ações ON (ordinárias) da empresa. “O movimento natural [para o fechamento de capital] seria o Bradesco adquirir a fatia do Banco do Brasil e, então, realizar a deslistagem”, aponta Miranda. 

Outra razão para acreditar na Cielo é o desempenho da empresa no quarto trimestre de 2020. No período foram contabilizados R$ 298 milhões de lucro, valor muito acima das expectativas do mercado. As cifras representam 35% de aumento em comparação com o quarto trimestre de 2019 e 197% em relação ao terceiro de 2020. Um sinal sólido de recuperação da empresa.

Miranda entende que os resultados negativos acumulados pela Cielo no passado já estão “mais que precificados no preço de suas ações, que não estão refletindo os potenciais de upside do case”. Enquanto isso, para Sérgio Oba, dadas as perspectivas atuais, as ações podem ter sido, inclusive, “penalizadas em excesso”.

Considerados os atuais R$ 3,80 por ação, o valor de mercado da Cielo é de R$ 10,5 bilhões. O que equivale a um múltiplo preço/lucro (P/L) de 12 vezes para 2021. “Nossas estimativas apontam para crescimento do lucro da ordem de 15% ao ano, dando um PEGY bastante comprimido, na casa 0,65, um dos menores do mercado”, aponta Oba.

Empresas com um PEGY abaixo de 1.0 — caso da Cielo — costumam representar boas oportunidades de investimentos. A razão leva em consideração os dividendos distribuídos pela empresa, assim como seu potencial crescimento e o atual preço do papel. 

Num momento em que a pandemia fez as vendas no varejo terem o pior desempenho desde 2014 no Brasil, a Cielo surpreende positivamente. O volume de pagamentos processados e receitas de vendas líquidas ficaram estáveis em 2020.

“Entendemos que a Cielo não recuperará as margens de antigamente, mas a grande capilaridade e a base de clientes são ativos importantes e estratégicos que vêm sendo muito bem precificados pelo mercado de ações”, comenta Miranda.

O atual presidente da empresa, Paulo Rogério Caffarelli, deixa claro em entrevistas recentes o foco da Cielo em penetrar no mercado de varejo. Hoje com 37,5% de seus serviços voltados para o segmento, a companhia visa, até o fim do ano, se dividir “50/50” entre pequenos lojistas e grandes contas.

As máquinas oferecidas atualmente pela Cielo. (Imagem: Reprodução/Cielo)

O CEO entende que a Cielo deixou de ser incumbente no setor e que, portanto, precisa disputar espaço por espaço no mercado. Exatamente dessa linha de pensamento surge o desejo por ampliar a penetração no varejo. A companhia, que há pouco tempo atrás concentrava 70% de seus serviços em grandes contas, entende que o varejo, apesar de movimentar menores quantia, possibilita maiores margens.

As grandes contas, no entanto, ainda recebem atenção da empresa. Caffarelli afirma que elas vêm sendo renegociadas com alto índice de sucesso. Além disso, a adquirente mudou recentemente sua dinâmica de captação de clientes. E o resultado vem sendo positivo: a Cielo firmou contrato com 500 novos clientes nos primeiros dias de 2021. 

A Cielo ainda inova?

A empresa que se destacou ao revolucionar o segmento de transações financeiras no início de sua trajetória sucumbiu ao não acompanhar a agressividade de novos players. Reviravolta digna de um romance. Mas se engana quem pensa que o histórico impede que Cielo continue em busca da inovação.

Uma das mais animadoras iniciativas em que a empresa está envolvida é o Whatsapp Pagamentos, que provavelmente terá recurso empregado ao PIX. Quando lançado, em junho de 2020, o novo projeto fez com que as ações da adquirente tivessem alta expressiva. Contudo, o Banco Central e o Cade suspenderam o empreendimento para avaliar riscos e concorrências.

O Whatsapp Pagamentos é um dos trunfos da Cielo para os próximos anos. (Imagem: Shutterstock)

Sobre o impasse, o presidente da companhia ressalta que o Whatsapp passou por uma seleção rigorosa com quase todas as adquirentes e que a Cielo foi selecionada como a parceira ideal. Além disso, aponta que todo o desenvolvimento da plataforma foi realizado em conjunto entre as empresas e que o Banco Central foi convidado para acompanhar os processos desenvolvidos. 

Na visão de Caffarelli, a liberação por parte dos órgãos estatais deve acontecer ainda neste ano. Mas a empresa trabalha também com outras possibilidades. Opção também interessante seria uma parceria com a Caixa Cartões, que deve escolher até abril um parceiro para operar, distribuir e comercializar produtos de adquirência nos próximos anos.

A quantidade de investidores que apostam na queda da Cielo ainda é alta. Porém, todas essas movimentações — potencial reunião societária, bons resultados no último trimestre e possibilidades de parcerias — levantam questionamentos sobre até quando esse pessimismo permanecerá intocável.

Caso bons números e novidades continuem aparecendo, Miranda acredita que pode haver uma “virada de mão’, com consequências positivas para os preços das ações e, automaticamente, para os “contrarians”. Haveria possibilidade, inclusive, de um short squeeze, potencializando a alta do ativo.

Sobre o autor

Danilo Moliterno

Jornalista em formação pela Universidade de São Paulo (USP), com passagem pela redação do Jornal da USP