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Day One

Não temos mais história para contar (por enquanto)

O Brasil está quase sempre em desequilíbrio fiscal; ainda que haja algumas novidades ruins nesse sentido, não são novidades crônicas.

Por Rodolfo Amstalden

29 maio 2024, 16:18 - atualizado em 29 maio 2024, 16:18

De quem é a culpa pela aparente letargia da Bolsa brasileira em 2024?

Seria fácil responsabilizar a fragilidade do arcabouço fiscal, mas não me parece que teríamos aí uma explicação completa.

O Brasil está quase sempre em desequilíbrio fiscal; ainda que haja algumas novidades ruins nesse sentido, não são novidades crônicas.

O humor local melhora e a Bolsa sobe não por termos resolvido o fiscal, mas sim quando oferecemos algo de bom para ofuscar ou compensar nossos pecados capitais.

No momento, porém, não estamos conseguindo oferecer nenhuma tese construtiva que possa convencer aos gringos ou a nós mesmos…

A verdade é que o Brasil ficou sem narrativa de curto prazo.

Até pouco tempo atrás, tínhamos uma história bem clara e interessante para contar: dentre os primeiros a apertar o torniquete monetário, mereceríamos também a vanguarda quando chegasse a hora de cortar a Selic.

Mas essa trajetória foi interrompida bem antes do que todos imaginavam, e não existem perspectivas tangíveis de resgatá-la em 2024.

Ao contrário, aliás; em uma leitura pragmática das últimas publicações do Focus, de pura e simples desancoragem das expectativas de inflação, até mesmo a hipótese de aumento dos juros passa a ser reconsiderada.

Em meio a tantas notícias desoladoras, aqueles investidores hipermétropes e esperançosos (dentre os quais me incluo) já caem na tentação de sugerir o potente gatilho das próximas eleições presidenciais. 

Com Lula se afastando da Frente Ampla, Haddad buscando seu caminho e Tarcísio ganhando popularidade, vão se acumulando chances reais de um governo mais market friendly a partir de 2027.

No entanto, esta é uma agenda ainda um pouco distante para o mecanismo de precificação do mercado. Talvez funcione bem quando nos aproximarmos da virada entre 2025 e 2026, mas é uma fruta verde por enquanto.

Isso tudo para constatarmos algo doloroso, mas necessário: enquanto não surgir uma nova narrativa promissora de curto prazo, não devemos alimentar grandes esperanças de valorização para a Bolsa brasileira.

De pouco adianta os múltiplos estarem negociando a preços atrativos.

Bolsa barata sem tecido narrativo não fica cara.

E paciência aqui: esse impasse pode continuar por mais tempo do que gostaríamos.

Sobre o autor

Rodolfo Amstalden

Sócio-fundador da Empiricus, é bacharel em Economia pela FEA-USP, em Jornalismo pela Cásper Líbero e mestre em Finanças pela FGV-EESP. É autor da newsletter Viva de Renda.