Investimentos

Plano Safra, lançado nesta quarta (3), é ofuscado por declarações de Lula e perspectivas de aumento da Selic; saiba mais

Nos EUA, mais dados do mercado de trabalho são divulgados hoje, véspera do Dia da Independência do país.

Por Matheus Spiess

03 jul 2024, 08:59 - atualizado em 03 jul 2024, 09:23

Lula ibovespa interferência política
Imagem: Montagem/Julia Shikota

Bom dia, pessoal. O dia começa com o que podia ser um clima desfavorável vindo da China, após o PMI de serviços de junho apresentar resultados bem abaixo do esperado. Felizmente, embora as ações chinesas tenham recuado, os demais mercados asiáticos não foram tão afetados.

No Japão, por exemplo, o índice Nikkei 225 retomou sua máxima histórica, impulsionado pelas expectativas de que o Banco do Japão terá pouco espaço para apertar a política monetária este ano, devido aos dados econômicos fracos do país.

Esse movimento reflete também a alta observada ontem em Wall Street, onde o S&P 500 e o NASDAQ Composite atingiram recordes após o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, sinalizar algum progresso na redução da inflação.

O otimismo persiste nesta manhã, com os mercados europeus em alta após mais de duzentos candidatos desistirem de disputas no segundo turno, enfraquecendo o partido de Le Pen. Os futuros americanos também estão em alta.

Nos EUA, novos dados do mercado de trabalho serão divulgados hoje, seguindo o relatório Jolts de ontem, que abordou vagas abertas e rotatividade do trabalho. Teremos o relatório ADP, detalhando a criação de vagas no setor privado, e os pedidos de auxílio-desemprego.

É véspera de feriado nos EUA, o que faz com que os negócios com Treasuries terminem mais cedo, podendo aumentar a volatilidade do pregão, especialmente se houver surpresas nos dados de emprego. As commodities também registram alta nesta manhã.

A ver…

· 00:53 — Contenção de danos

As recentes declarações do Presidente Lula sobre os gastos públicos e suas críticas ao presidente do Banco Central do Brasil contribuíram diretamente para a valorização do dólar, que ontem voltou a se aproximar de R$ 5,70. Apesar das medidas emergenciais para estabilizar a situação, os danos já causados são substanciais.

Além disso, um movimento de stop loss na curva de juros futuros agora antecipa um aumento de 1,0 ponto percentual na Selic ainda este ano. Essa reação não resulta de um ataque especulativo, mas de uma defesa automática do mercado, exacerbando a espiral negativa.

O governo parece ter percebido a necessidade de moderar sua comunicação, mas os estragos já são significativos e impactam até mesmo a inflação.

O lançamento do Plano Safra, que poderia ser um evento de destaque hoje, acaba ficando em segundo plano diante da urgência de ajustar as declarações presidenciais, que continuam a desafiar a estabilidade do mercado. O alívio momentâneo veio apenas com rumores de que o Banco Central estaria considerando uma intervenção cambial.

Além disso, embora os dados de produção industrial sejam importantes, a prioridade dos investidores é ver progressos na política econômica, especialmente no campo fiscal. A responsabilidade fiscal, um dos pilares do tripé macroeconômico, é agora o ponto mais fraco, com um histórico de inconsistências desde 2009, quando o Brasil começou a ter dificuldades em gerar superávits primários consistentes. A falta de credibilidade fiscal reflete diretamente nos resultados econômicos decepcionantes dos últimos anos. O cenário atual é grave, e o governo precisa estar ciente disso. Sem uma política fiscal crível, o custo de controlar a inflação se torna ainda mais alto. A ministra da Economia, Simone Tebet, anunciou que apresentará ao presidente Lula uma proposta concreta de ajuste fiscal na próxima semana. É crucial que essas medidas sejam substanciais para restaurar a confiança e garantir a estabilidade econômica.

· 01:41 — Novas máximas

As bolsas de Nova York fecharam em alta ontem, estabelecendo novos recordes. Os investidores estavam atentos à participação de Jerome Powell no Fórum do BCE em Portugal. O índice S&P 500 superou os 5.500 pontos, enquanto o Nasdaq ultrapassou a marca dos 18 mil pontos pela primeira vez, impulsionados pelas ações de empresas de tecnologia. A Tesla, que já mencionamos anteriormente, destacou-se como a ação de melhor desempenho pelo segundo dia consecutivo, com um aumento de 10% devido a um relatório de entregas que superou as expectativas. O S&P 500 fechou em 5.509,01 pontos e o Nasdaq em 18.028,76 pontos.

Os dados econômicos mais recentes indicam um aumento modesto nas vagas de emprego no final de maio. Apesar de uma tendência de queda desde o ápice em 2022, o número de vagas ainda está acima do patamar pré-pandemia. Além disso, as declarações recentes de Jerome Powell, presidente do Banco Central dos EUA, foram recebidas como moderadas pelo mercado. Ele evitou se comprometer com uma redução nas taxas de juros em setembro, o que contribuiu para uma estabilização dos rendimentos dos Treasuries, destacando os avanços no controle da inflação nos Estados Unidos. Nos próximos dias, o Comitê Federal de Mercado Aberto divulgará a ata de sua última reunião de política monetária, e ainda aguardamos o relatório ADP sobre o emprego em junho. O foco da semana, contudo, será o relatório payroll de sexta-feira, que promete ser o principal evento.

· 02:39 — Regulação

Na Europa, a ofensiva regulatória contra as grandes empresas de tecnologia chamou atenção. Desde a entrada em vigor da nova lei de concorrência digital da União Europeia, os reguladores acusaram a Apple, Microsoft e Meta de violarem as novas diretrizes. Se a UE concluir que essas empresas agiram de maneira anticoncorrencial, elas poderão ser multadas em até 10% de suas receitas globais, ou mais em casos de reincidência. Agora, a Nvidia, protagonista do rali de inteligência artificial, parece ser a próxima a enfrentar um possível confronto regulatório.

Os reguladores antitruste franceses estão prestes a acusar a Nvidia de conduta anticompetitiva, o que faria da França o primeiro país a acusar a fabricante de chips de abusar de sua posição dominante no setor de IA. Embora as acusações específicas ainda não tenham sido divulgadas, um relatório publicado na semana passada pelo regulador francês sobre a concorrência no espaço de IA generativa levantou preocupações sobre possíveis más práticas por parte dos fabricantes de chips.

Com linhas de batalha claramente definidas entre a UE e as grandes empresas de tecnologia, alguns defensores da tecnologia argumentam que a Europa, que ainda não produziu um gigante tecnológico local, será a mais prejudicada nessa disputa. As empresas de tecnologia podem decidir que operar na Europa não vale a pena, resultando em serviços digitais de baixa qualidade e uma economia digital menos competitiva para os europeus. Há também a possibilidade de que, em caso de reeleição de Biden, movimentos semelhantes possam ocorrer nos EUA.

· 03:28 — E por falar nos europeus

Durante um encontro internacional com a participação de Jerome Powell, do Federal Reserve, Christine Lagarde, do Banco Central Europeu (BCE), e Roberto Campos Neto, do Banco Central do Brasil, Lagarde destacou que as preocupações inflacionárias na Zona do Euro ainda persistem. Essa visão foi reforçada pelo economista-chefe do BCE, Philip Lane, aumentando as expectativas de que o BCE poderá pausar os cortes de juros neste mês.

Com o mercado de trabalho da Zona do Euro ainda robusto, o BCE tem tempo para avaliar cuidadosamente os dados econômicos recentes. Os números da inflação de junho, por exemplo, podem não ser suficientes para uma análise completa dos preços dos serviços. Desde o ajuste de juros de junho, Lagarde tem sido o foco dos investidores, que buscam entender o ritmo futuro das reduções nas taxas de juros. Se os dados econômicos evoluírem conforme o esperado, novos cortes de juros ainda podem ocorrer este ano, alinhando-se às tendências da política monetária dos Estados Unidos. Qualquer desvio na rota, contudo, poderá mudar tal perspectiva.

  • Stock Picking Day 2024: descubra como os melhores investidores do Brasil encontram as ações vencedoras da Bolsa de Valores; retire seu ingresso gratuito

· 04:12 — Tensões geopolíticas

Na próxima semana, o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, realizará uma viagem importante a Moscou para se encontrar com o presidente russo Vladimir Putin. Esta será a primeira visita de Modi à Rússia desde a polêmica invasão da Ucrânia pelo Kremlin em 2022 e também sua primeira visita bilateral desde sua reeleição na Índia. O encontro oferece a Putin uma chance de combater os esforços ocidentais para isolá-lo internacionalmente, sucedendo sua viagem à China dois meses atrás — a primeira visita internacional de Putin em seu novo mandato. A ocasião anterior destacou a crescente aliança entre Moscou e Pequim, algo que a Índia observa com cautela.

Paralelamente, em um movimento que eleva as tensões regionais na Ásia, a Guarda Costeira da China apreendeu um barco de pesca taiwanês e seus seis tripulantes. O incidente ocorreu próximo à ilha de Kinmen, que, embora controlada por Taiwan, está a apenas três quilômetros da costa chinesa. A ação foi conduzida por dois navios da Guarda Costeira chinesa na noite de terça-feira. Embora eu não preveja um conflito armado iminente por Kinmen, esses eventos aumentam a incerteza e a preocupação no cenário internacional, evidenciando a delicada situação de segurança na região.

· 05:07 — O que para o rali?

A dominância das grandes empresas de tecnologia nos índices acionários dos Estados Unidos provavelmente persistirá, a menos que ocorra um recuo de mercado comparável ao que abalou investidores em 2022.

A equipe de analistas do JPMorgan destacou essa perspectiva, antecipando que o crescimento dos lucros no índice S&P 500 se estenderá além dessas gigantes tecnológicas até o fim do ano. No entanto, o que realmente poderia interromper este rali?

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.