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Jackson Hole, evento mais importante da agenda internacional da semana, começa nesta quinta-feira (22); veja o que esperar e destaques do dia

Os investidores estarão de olho no tão esperado Simpósio de Jackson Hole, com discursos de Roberto Campos Neto e Jerome Powell

Por Matheus Spiess

22 ago 2024, 08:52 - atualizado em 22 ago 2024, 08:52

Imagem representando o ticker, um código usado na bolsa de valores para identificar e negociar um determinado ativo.

Há uma palpável ansiedade no ar. Os investidores estarão atentos a partir de hoje (22) ao tão esperado Simpósio de Jackson Hole, que promete trazer novas diretrizes sobre a condução da política monetária global, com destaque para os Estados Unidos.

As atas recentes do Federal Reserve revelaram que vários membros do comitê consideraram plausível um corte nas taxas de juros durante a reunião de 30 a 31 de julho, embora a decisão final tenha sido manter as taxas inalteradas. Esse registro sugere um crescente consenso entre os formuladores de políticas de que um corte de juros pode ocorrer na reunião de setembro. A questão agora é se esse corte será de 25 ou 50 pontos-base, e qual será o caminho dos juros após essa primeira redução.

Neste cenário, os mercados europeus e os futuros americanos apresentam alta nesta manhã, mostrando uma maior sincronização do que os índices asiáticos, que tiveram uma quinta-feira mista, mas majoritariamente positiva. Na agenda de hoje (22), destacam-se também dados de atividade econômica na Europa e nos Estados Unidos, além de pesquisas de opinião sobre o sentimento empresarial.

A ver…

· 00:51 — Anatomia de uma alta

Ontem, o Ibovespa registrou mais uma alta, avançando 0,28% e alcançando um novo recorde de fechamento aos 136.464 pontos, marcando a terceira máxima consecutiva. Esse desempenho foi impulsionado em parte pelos índices de Nova York, que também fecharam em alta após a divulgação da ata do Federal Reserve e a revisão dos dados de emprego nos EUA, revelando um mercado de trabalho menos aquecido e aumentando as chances de um corte de juros.

No cenário doméstico, além da movimentada agenda em Brasília, com os desdobramentos do acordo entre os três Poderes sobre as emendas parlamentares, o mercado local tem intensificado suas expectativas de alta na Selic, com muitos apostando em um aumento já em setembro. Diante das incertezas destacadas pelo Banco Central em suas comunicações recentes e nas falas de seus diretores, as expectativas do mercado acabaram sendo ancoradas. Na minha opinião, teria sido mais adequado adotar um discurso mais coeso anteriormente, o que poderia ter evitado essa ancoragem e permitido a manutenção dos juros no nível atual. Contudo, o caminho trilhado até aqui torna essa projeção inviável.

Embora o Brasil já tenha uma taxa de juros real alta em comparação com os EUA e outros pares, parece ser necessário elevar ainda mais os juros para evitar um prejuízo significativo à credibilidade do Banco Central.

O percurso até aqui foi o seguinte:

  • (i) Entre junho e julho, com um cenário fiscal extremamente desordenado, o dólar alcançou R$ 5,70, e o BC, que já havia mantido os juros inalterados, endureceu o discurso;
  • (ii) Em julho, com a apresentação dos pontos de corte de gastos por Haddad, o mercado se acalmou e o câmbio se estabilizou, mas o BC manteve um discurso rígido;
  • (iii) Entramos em agosto com uma reversão de carry trade, levando o câmbio, que havia se acomodado na segunda metade de julho, a saltar rapidamente para R$ 5,80, superando o patamar de R$ 5,70 registrado em julho. O BC, que já havia ancorado parte das expectativas, intensificou ainda mais seu discurso, mencionando a possibilidade de alta de juros;
  • e (iv) Posteriormente, o mercado se acalmou, mas o estrago já estava feito, e uma alta nos juros se tornou inevitável.

Hoje, a melhor maneira de encarar uma eventual alta dos juros é vê-la como um investimento: aumentamos agora para reduzir mais cedo e mais vezes no futuro. Vale também ficar atento à possibilidade de Lula anunciar o novo presidente do Banco Central ainda este mês. Além disso, os dados de arrecadação que serão divulgados hoje podem ajudar a ajustar as expectativas fiscais.

· 01:46 — Certeza de corte

Nos EUA, as ações subiram após a divulgação da ata da última reunião do Federal Reserve e uma significativa revisão para baixo dos dados de emprego, fortalecendo as expectativas de cortes nas taxas de juros em setembro. Quase todos os principais setores do S&P 500 avançaram, fazendo com que o índice fechasse em seu nível mais alto em cinco semanas.

Esse movimento foi impulsionado pelo anúncio do Bureau of Labor Statistics, que revelou a maior revisão para baixo nas estimativas de crescimento do emprego em mais de uma década, com uma redução de 818.000 empregos nos ganhos líquidos de folha de pagamento relatados anteriormente para os 12 meses encerrados em março—uma revisão mais acentuada do que o esperado.

Com poucos lançamentos econômicos programados para esta semana, as revisões receberam maior atenção do mercado. Embora o temor de uma recessão ainda esteja presente, a perspectiva de uma desaceleração organizada, que permitiria cortes de juros de forma responsável, está ganhando força. Nesse contexto, os investidores estão novamente precificando mais de 1 ponto percentual de flexibilização até o final deste ano, com o início esperado para o próximo mês.

Acredito que considerar um corte de 75 pontos-base (distribuídos em 25 pontos em cada uma das reuniões restantes) seja mais realista, conforme sugerido pela ata do Federal Reserve. Na agenda de hoje, teremos ainda os dados sobre pedidos de auxílio-desemprego, que também devem atrair a atenção dos investidores.

· 02:32 — O simpósio

Os banqueiros centrais estão reunidos esta semana para um dos mais importantes fóruns econômicos do mundo: o Simpósio de Jackson Hole, em Wyoming, organizado pelo Fed regional de Kansas City. No entanto, essas autoridades chegam ao encontro mais divididas do que em qualquer outro momento desde antes da pandemia. A incerteza é, talvez, o único ponto em comum entre todos.

Durante anos, as avaliações do Federal Reserve, do Banco Central Europeu e de outros grandes bancos centrais do mundo desenvolvido eram bastante alinhadas. Quando a crise da Covid-19 atingiu em 2020, eles responderam de forma coordenada, cortando taxas de juros e injetando liquidez. Posteriormente, quando ficou claro que a inflação persistente não desapareceria sozinha, lançaram as campanhas de aperto monetário mais agressivas em décadas. Curiosamente, o movimento foi uníssono e bem alinhado.

Há pouco mais de um ano, os principais líderes monetários estavam em sintonia na conferência anual do BCE em Sintra, Portugal, com a visão unânime de que ainda havia trabalho a ser feito para conter a inflação. Hoje, no entanto, com a inflação em queda, mas ainda acima das metas de 2%, as divergências aumentaram. As autoridades estão divididas entre o risco de manter as pressões inflacionárias elevadas e o perigo de empurrar suas economias para uma desaceleração. Para os investidores, isso cria um cenário de maior volatilidade. Enquanto o BCE já reduziu sua taxa de referência há mais de dois meses, o Fed ainda não tomou essa decisão. O banco central britânico, por sua vez, agiu no início de agosto, mas a decisão foi apertada, com uma votação de 5 a 4 em seu comitê de política monetária. Diante dessas direções distintas, vale a pena prestar atenção ao que Jerome Powell dirá amanhã (23). Antes dele, o presidente do BC do Brasil, Roberto Campos Neto, discursará no evento hoje.

· 03:29 — Game changer

A última vez que um terceiro candidato teve relevância significativa nas eleições americanas foi em 1992, quando o magnata Ross Perot desviou votos de George H. W. Bush, contribuindo para a vitória de Bill Clinton. Sem a presença de Perot na disputa, a história poderia ter seguido um rumo diferente. Em 2024, vemos um cenário que, se não repete, ao menos rima com o passado. Ontem, Robert Kennedy Jr., candidato independente à presidência dos EUA, anunciou sua retirada da corrida eleitoral, declarando apoio ao ex-presidente Donald Trump. Essa decisão pode render a Kennedy um espaço próprio em um possível retorno de Trump à Casa Branca.

As pesquisas mais recentes apontam que Kennedy contava com cerca de 5% das intenções de voto. Embora a transferência desses votos para Trump não seja automática, em uma disputa tão acirrada, onde o resultado será decidido em apenas alguns estados, até mesmo uma pequena mudança pode ser decisiva. Essa notícia chega em um momento estratégico, às vésperas do discurso de Kamala Harris na Convenção Democrata, que se encerra hoje, e pode ser o impulso que Trump precisava na reta final da campanha.

· 04:13 — Não é uma Covid

Hans Kluge, diretor regional da OMS para a Europa, afirmou em um texto publicado no site da organização que a mpox, anteriormente conhecida como varíola dos macacos, não deve ser comparada à covid-19. Já discutimos anteriormente nesta newsletter sobre a doença e a importância crucial da aquisição de vacinas e medicamentos antivirais para aqueles que mais necessitam, conforme estratégias de risco. Podemos e devemos combater a mpox em conjunto.

A forma como responderemos agora e nos próximos anos será um teste decisivo para a Europa e o mundo. Recentemente, a OMS declarou o recente surto de mpox na África como uma emergência de saúde pública de preocupação internacional, após a identificação de uma nova variante.

Em relação a isso, a Bavarian Nordic, uma empresa dinamarquesa que fornece uma vacina essencial contra a mpox, deve alcançar o limite superior de suas previsões financeiras para o ano, após garantir um pedido significativo de vacinas da Europa. O contrato, envolvendo 440 mil doses de vacina para um país europeu não divulgado, deve gerar uma receita de cerca de US$ 790 milhões neste ano, além de US$ 201,5 milhões em lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização.

Esse pedido foi antecipado e não comprometerá a capacidade de produção restante de vacinas para o ano. E devemos esperar ouvir mais sobre a mpox. Especialistas em doenças que estão se dirigindo à África Central para conter o contágio estão enfrentando um cenário complexo, com diferentes padrões de infecção envolvendo várias cepas virais.

· 05:07 — Folga da Tesla

A Tesla obteve uma vantagem significativa após a União Europeia (UE) reduzir as tarifas adicionais sobre veículos elétricos importados da China, resultando em uma taxa mais baixa para a empresa em comparação com outras montadoras. Embora essa mudança não represente uma vitória completa, dado que a concorrência acirrada pode aumentar os custos dos veículos que a Tesla importa de sua fábrica em Xangai para a Europa, a notícia ainda é positiva.

No entanto, a questão que permanece é se isso será suficiente para sustentar o otimismo em relação às ações da Tesla…

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.