Há bastante complexidade nesta entrada de 2022. Mal começamos o ano e já fomos atormentados por um fluxo grotesco de notícias. Pelo menos, em meio ao tumulto, os ativos brasileiros têm perseverado, ressoando a rotação setorial derivada da precificação do aperto monetário nos países desenvolvidos.
Bom para nós, da série Double Income, aqui da Empiricus, que nos beneficiamos de movimentos como este, que privilegia teses descontadas e de qualidade.
Agora, mais recentemente, nutre-se uma necessidade incessante de comentar sobre o conflito na fronteira entre a Rússia e a Ucrânia. Apesar de soar distante para muitos, o tema guarda, na verdade, bastante relação com nossa realidade de investidores.
Isso por conta dos desdobramentos econômicos diretos e indiretos reservados aos países envolvidos no conflito. Sem falar no drama humanitário de uma possível guerra.
Mais do que discutir pura e simplesmente as razões já bastante conhecidas enraizadas na região, precisamos discernir os potenciais beneficiados pelo contexto.
Quando se avalia a Rússia e a Ucrânia, uma das primeiras elucubrações que nos saltam aos olhos é a relação dos dois países com commodities energéticas, aqui mais precisamente petróleo e gás.
Não é de hoje que falamos de um boom de commodities. Aliás, muito pelo contrário, ventilamos tal cenário já há bastante tempo. Embalados pela retomada da economia em nível global e quebra da cadeia de suprimentos, experimentamos um choque relevante nos preços das matérias-primas, as quais, por sua vez, impactam os índices de preço ao produtor e ao consumidor.
Se estruturalmente já entendíamos como esperados, dada a conjuntura, preços mais altos para as commodities em 2022, os choques exógenos provocados pelo receio de um conflito geopolítico de grandes proporções aceleram o movimento. Tanto é verdade que nesta semana já chegamos perto do patamar de US$ 97 o barril de petróleo, o nível mais alto em mais de sete anos.
Se as commodities energéticas ficam mais caras, entretanto, o custo da energia também aumenta. Quando isso ocorre, gera-se inflação na economia, como vimos ao longo de 2021, em especial no segundo semestre — crise energética na Zona do Euro, na China e no Brasil, além de preços de combustíveis mais elevados (lembre-se de que, no final do dia, a alta do petróleo chega no posto).
Notadamente, a inflação e suas consequências fazem parte dos temas que julgamos mais relevantes para o ano. Se os investidores brasileiros sofreram por conta da resposta do Banco Central à desestabilização dos preços já em 2021, vemos algo semelhante acontecendo lá fora, desta vez, nos mercados desenvolvidos.
A alta dos preços e a falta de ancoragem das expectativas fará com que as autoridades monetárias contraiam liquidez, de modo a deixar de estimular a economia como tem feito desde o início da pandemia de maneira bastante grosseira. O aperto monetário, porém, gera uma série de outras consequências: a alta de juros provoca correção dos ativos de risco e medo de recessão.
Em certo grau, nasce disso o movimento de rotação setorial de que tanto falamos, com a migração de recursos de ativos caros para ativos baratos, de teses de crescimento (duration longo) para teses tradicionais (duration mais curto, ao menos relativamente), da nova economia para a velha economia. Note como já era um processo que estava acontecendo, mas que a crise na Ucrânia acaba acelerando pelo seu impacto nos preços de energia.
O que vale a pena ter na carteira?
1- Ativos de renda fixa atrelados à inflação: Com a inflação em patamar elevado, é interessante ter títulos de renda fixa indexados à inflação (que pagam IPCA+ taxa). Para o momento atual, gosto de uma combinação de vértices relativamente mais curtos, como o título do Tesouro IPCA+2026, e mais longos, como o IPCA+ 2055.
2- Fundos Imobiliários também indexados: Outras alternativas podem ser fundos imobiliários (FIIs) de tijolo, que reajustam aluguéis conforme índices de inflação, além de fundos de crédito imobiliário – os chamados fundos de papel, que também sejam atrelados aos índices de inflação. Meus preferidos são o Kinea Securities (KNSC11) e o Mauá Capital Recebíveis Imobiliários (MCCI11).
2- Ações bem selecionadas: É preciso fazer o picking, escolher ações de companhias com bons fundamentos e baratas. Como comentei, o cenário de aperto monetário privilegia papéis da velha economia como de produtoras de commodities e bancos tradicionais, bem como de companhias de setores cíclicos domésticos descontadas. As posições em ações tendem a ganhar em ambiente inflacionário, pois são ativos que costumam andar nominalmente. Gosto particularmente das companhias do setor de energia, como Alupar (ALUP11) e Eneva (ENEV3).
Logicamente, essas são algumas alternativas, mas você precisa fazer um planejamento com o devido dimensionamento das posições em cada ativo, conforme seu perfil de risco, considerando a diversificação da sua carteira, incluindo algumas proteções associadas.
As ideias que apresentei aqui são complementares, ou seja, isoladamente, elas não fazem um portfólio, mas podem participar de um.
O fluxo gringo na Bolsa
Ressalto ainda que a rotação setorial tem beneficiado os ativos brasileiros. O fluxo de capital estrangeiro para a Bolsa vem aumentando significativamente, afinal, quem não quer fazer bons investimentos para o longo prazo quando tudo está tão barato?
Para se ter uma ideia, o saldo dos investimentos gringos na Bolsa é de R$ 49,22 bilhões no acumulado deste ano até o último dia 15.
Os nossos ativos estão negociando a múltiplos baixos relativamente ao que vemos lá fora — se consideramos que carteiras de renda são tradicionalmente de maior qualidade, podemos assumir que nossos nomes são candidatos claros para se beneficiar desse contexto.
Ou seja, nossas carteiras Double Income, graças ao seu foco em renda, conseguem reunir os nomes mais claros para o movimento global que temos visto nos mercados financeiros. Já temos observado isso nos retornos, que há mais de três meses já são positivos para nós, apesar da volatilidade inerente ao processo e da correção nos ativos internacionais. O longo prazo acabará sendo positivo para nossas posições, da maneira que planejamos inicialmente.