Eduardo Gianetti, sobre o momento político do Brasil hoje, afirma: “abstraiam a guerra ideológica burra que nós estamos vivendo”. Segundo o cientista político, formado em Economia e Ciências Sociais pela USP e com Ph.D. em Economia pela Universidade de Cambridge, as pessoas agora dividem muito os seus pensamentos.
“Se você gosta do governo, tudo que ele faz é bom e toda a crítica é em detrimento. Se você detesta o governo, tudo que ele faz é péssimo”, analisa o especialista em participação ao evento de 15 anos da Empiricus.
Em sua interpretação, o seu viés de confirmação te faz ler o mundo de acordo com a sua preferência e as pessoas estão quase “perdendo o contato com a realidade”.
A informação e conhecimento intransferível na formação do pensamento
Em seus estudos, Gianetti acredita que existem dois tipos fundamentais de informação que vêm de fora – do meio externo. São elas:
- Informações formalizáveis e transferíveis, como o trabalho de pesquisa da Empiricus Research, que comunica os seus estudos e está fundamentada no experimento;
- Informações tácitas e não formalizadas, também chamadas por alguns filósofos de informações idiossincráticas, do conhecimento e dos sentidos.
Como exemplo, Gianetti menciona grandes jogadores de futebol que entendem muito bem suas jogadas e têm um talento tácito para o esporte. Por outro lado, físicos acadêmicos que podem nem saber chutar uma bola descrevem com perfeição matemática tudo que foi executado pelo atleta.
“São conhecimentos não formalizados, intransferíveis”, explica.
O paradoxo da economia da informação
Neste fio de raciocínio, o cientista político aborda o denominado “paradoxo da economia da informação”, baseado no conceito de um economista matemático do século XX, Kenneth Arrow.
“O valor da informação para um comprador potencial não é conhecido até que ele a possua. Mas quando ele a possui, não há mais como cobrar por ela”, cita Gianetti.
Ou seja, antes de conhecer o produto, não há como o comprador realmente saber o seu valor. Contudo, a partir do momento que o vendedor lhe passa o produto, ele também não pode mais exigir novos custos dele.
É sob essa lógica que o cientista explica o surgimento de produtos por assinatura, por exemplo, que garantem a fidelização e continuidade do consumo, assim como o paradoxo da patenteação, que envolve a exposição do conhecimento em busca de créditos.
Paradoxo e confiança
Para terminar a linha de pensamento sobre o paradoxo da informação, Gianetti retoma que a presença do informacional na vida econômica força a importância da ética e da confiabilidade.
“Existe um nível de exigência e confiança muito maior quando você está lidando com um bem informacional. Porque são transações que não dificilmente vão poder retroagir e vão poder ser refeito, caso haja algum tipo de apontamento ou frustração, porque não há como objetivamente determinar que falhou a expectativa”, explica.
Por exemplo, ele toma o convite da Empiricus para a participação no evento. “Como eles sabem o que vou apresentar? Não sabem. Eu posso chegar aqui e falar grego. É confiança, que depende da característica muito cruel e de lenta formação da reputação”, explica.
Ele compara as relações pessoais e empresariais com os casos de desconfiança nas companhias observados recentemente, como o caso de fraude contábil na Americanas (AMER3).
Como recebemos e digerimos notícias econômicas
Na visão de Gianetti, devemos sempre lembrar que não é possível fazer previsões econômicas da mesma forma que é visto em ciências exatas. “Como é que se recebe notícias econômicas? Como é que se digere propostas e soluções apresentadas? Enquanto nós não entendermos melhor o ser humano e o processo de formação de crenças, nós vamos continuar tateando no escuro”, afirma.
Como um crítico das expectativas racionais, o cientista acredita que nem todas as expectativas são totalmente irracionais, mas uma combinação de busca de conhecimento objetivo com elementos de não racionalidade.
“O processo econômico resulta dessa combinação. E cá entre nós não é de todo mal, porque o que nos salva no fundo é a não racionalidade”, conclui e finaliza sua fala citando o poeta Fernando Pessoa:
Sem a loucura que é o homem
Mais que a besta sadia,
Cadáver adiado que procria?
Brasil que vale a pena ser sonhado
Em uma análise macro do Brasil, Eduardo Gianetti afirma que tem em sua intuição um conceito de “um Brasil que vale a pena ser sonhado”. Em sua definição, este seria um país que conquista um mínimo de civilização sem perder a força emotiva e afetuosa pré-moderna, que entram na nossa cultura graças ao consumo afro-indígena.
“Seria a civilização sem o mal-estar. A essa utopia, entretanto, corresponde uma distopia: o mal-estar sem a civilização. Nós não alcançamos um patamar elementar de civilização. Metade dos domicílios brasileiros não têm coleta de lixo e não temos tratamento de esgoto universal. Como é que nós chegamos ao século XXI sem ter feito o mais elementar da modernidade? Teve [governo de] direita, teve [governo de] esquerda, teve ditadura, teve democracia, teve o que vocês quiserem, mas chegamos no século 21 sem isso”, critica.
Para o Brasil fazer justiça a essa possibilidade de utopia, segundo o cientista, ainda é preciso enfrentar os seus problemas mais elementares de segurança. “Começando por saúde, educação e condições mínimas de oportunidade para que cada brasileiro possa desenvolver o seu potencial humano”, defende.