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Debêntures participativas da Vale (VALE3): oportunidade ou risco? Entenda os impactos nos dividendos da companhia

Em seu relatório do produção do 4T24, a Vale (VALE3) apresentou uma possibilidade de gatilho para os preços. Entenda.

Por Matheus Spiess

05 fev 2025, 11:14 - atualizado em 05 fev 2025, 11:22

vale vale3 mineradora

Imagem: iStock/ Morsa Images

A Vale (VALE3) divulgou seu relatório de produção referente ao quarto trimestre de 2024 na última semana. Entre os impactos da publicação, destacou-se a gatilização da consideração do Sistema Sudeste na Debênture Participativa da Vale (CVRDA6), um fator relevante para investidores que acompanham esse instrumento financeiro.

As Debêntures Participativas da Vale continuam sendo um tema recorrente e de grande importância em nossa análise, especialmente diante das recentes movimentações no mercado. Esses títulos híbridos, que combinam características de renda fixa e variável, voltaram a despertar forte interesse como uma potencial oportunidade de compra, principalmente em períodos de maior volatilidade, como o que estamos atravessando atualmente.

O que são as debêntures participativas da Vale (VALE3)?

Para quem não está familiarizado, as Debêntures Participativas da Vale foram criadas em 1997, no contexto da privatização da companhia. Sua estrutura é única no mercado brasileiro, e esses papéis ganharam maior liquidez a partir de 2021, quando a União e o BNDES reduziram suas participações, vendendo uma parcela significativa no mercado. Esse movimento ampliou a oferta de títulos e atraiu novos investidores, consolidando o papel dessas debêntures como ativos de interesse crescente no mercado financeiro.

Diferentemente das ações, esses títulos não conferem participação societária na Vale, mas oferecem aos detentores direito a prêmios semestrais vinculados à produção de minério de ferro em determinadas minas da companhia. Seu valor está diretamente atrelado ao faturamento líquido de operações específicas, principalmente dos sistemas Norte e Sudeste.

Estrutura e funcionamento das debêntures da Vale

As Debêntures Participativas da Vale são títulos perpétuos, sem data de vencimento, e geram pagamentos aos investidores sempre que a produção de minério de ferro da empresa atinge certos marcos definidos na sua escritura.

Os pagamentos são vinculados às receitas de minas específicas, como o Sistema Norte, que inclui Carajás – a maior reserva de minério de ferro do mundo, com uma vida útil estimada em 250 anos – e o Sistema Sudeste, que também desempenha um papel relevante na geração de caixa da companhia.

As debêntures participativas são especialmente atrativas para quem busca diversificação e proteção cambial, além de oferecer uma alternativa interessante para exposição indireta à alta do minério de ferro e aos resultados operacionais da Vale. Tanto pelo seu perfil único de remuneração, quanto pelo potencial de valorização em momentos de recuperação do mercado de commodities, esses títulos continuam sendo uma opção relevante no radar de investidores.

No contexto das Debêntures Participativas da Vale, é essencial compreender que o termo “participativa” reflete a relação direta entre a remuneração desses títulos e o desempenho dos ativos subjacentes da companhia. A compensação financeira dos detentores dessas debêntures está intrinsecamente atrelada às variações no preço do minério de ferro, tornando os pagamentos altamente sensíveis ao ciclo das commodities.

Como funciona a remuneração das debêntures da Vale

Diferente de títulos tradicionais com cupons fixos, as Debêntures Participativas da Vale oferecem uma remuneração variável, baseada em uma porcentagem das receitas líquidas da empresa provenientes de diferentes minerais.

O cálculo dos prêmios semestrais segue uma lógica dolarizada, ou seja:

  1. A receita gerada pelas operações da Vale é inicialmente calculada em dólares, refletindo a natureza global do mercado de commodities.
  2. Somente no momento do pagamento, o valor é convertido para reais e distribuído aos investidores.

Essa estrutura faz com que o retorno desses títulos esteja diretamente exposto às condições do mercado internacional, gerando fluxos de caixa potencialmente elevados em momentos de alta das commodities, mas também introduzindo volatilidade quando os preços do minério de ferro recuam.

Um ativo diferenciado para exposição ao setor de mineração

A forte correlação entre os pagamentos das debêntures participativas e o faturamento da Vale confere aos investidores uma exposição diferenciada ao desempenho da empresa e às tendências do setor mineral global. Essa estrutura torna esses papéis uma alternativa atrativa para determinados perfis de investidores, especialmente aqueles que buscam diversificação e exposição indireta ao ciclo das commodities, sem a necessidade de investir diretamente em ações da companhia.

Com a divulgação do último relatório de produção da Vale, o volume do Sistema Sudeste passou a ser considerado para a remuneração das Debêntures Participativas. Esse gatilho foi acionado ao atingir a marca de 1,7 bilhão de toneladas em produção acumulada.

Ao final do primeiro semestre de 2024, a produção acumulada do Sistema Sudeste estava em 1,66 bilhão de toneladas. No segundo semestre, a produção atingiu 48 milhões de toneladas, um crescimento de 17% em relação ao mesmo período de 2023. Com esse marco alcançado, o volume considerado para remuneração das debêntures aumenta em mais de 30%, impactando diretamente o yield desses papéis.

Impacto no pagamento de dividendos da Vale

Nos últimos 12 meses, as debêntures da Vale pagaram R$ 3,35 por unidade em dividendos, resultando em um yield de 9,5%, considerando a cotação de R$ 35,00. Vale lembrar que essa remuneração é dolarizada, uma vez que está atrelada às receitas de minério de ferro.

O pagamento do segundo semestre historicamente supera o do primeiro, devido à sazonalidade climática, especialmente as chuvas, que impactam a produção. Para efeito de comparação, o dividendo referente ao segundo semestre de 2023 foi de R$ 1,9705 por debênture. Já o preço médio do minério de ferro, em reais, no segundo semestre de 2024, ficou 20% acima do mesmo período de 2023, impulsionando ainda mais a expectativa de crescimento dos retornos.

Dessa forma, com o novo volume considerado na remuneração e assumindo um cenário de câmbio e preços de minério de ferro estáveis, a projeção aponta para um cupom dolarizado entre 13% e 15%. Para efeito de comparação, o bond da Vale com vencimento em 2042 negocia com um cupom de 6%, evidenciando o diferencial atrativo das debêntures.

Perspectiva para as Debêntures Participativas

Os fundamentos das Debêntures Participativas da Vale (CVRDA6) permanecem sólidos, sustentados por receitas em dólares provenientes de operações estratégicas como o Sistema Norte e a mina de Sossego. Com a entrada em operação do Sistema Sudeste e o aumento da eficiência operacional, espera-se que o fortalecimento dos volumes de produção amplie ainda mais a atratividade desses papéis.

Dessa forma, as Debêntures Participativas da Vale continuam sendo uma alternativa de investimento diferenciada, oferecendo uma rara combinação entre renda fixa e variável, ao mesmo tempo em que proporcionam exposição ao desempenho de longo prazo da Vale e às dinâmicas do mercado global de commodities.

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.