A ascensão do Ibovespa, principal índice de ações brasileiras, neste ano é amplamente atribuída ao setor financeiro, contribuindo com mais de 5 mil dos 17 mil pontos adicionados ao índice em 2023. Sozinho, o papel de Itaú (ITUB4) responde por mais de 2 mil pontos, com uma alta de quase 30% no ano, enquanto Bradesco (BBDC4) e Santander (SANB11) sobem 11%.
Para Felipe Miranda, sócio-fundador e CIO da Empiricus, apesar da confiança contínua na tese do Itaú, que pode resultar em um aumento de payout (dividendos distribuídos por ação) em breve, existe possibilidade de uma correção técnica neste momento.
“Portanto, optamos por manter nossa exposição à ação que consideramos a melhor do setor [ITUB4], ao mesmo tempo em que implementamos uma proteção por meio de uma posição vendida: Santander Brasil (SANB11), que pode valer também para o investidor de maneira isolada, caso ele já esteja posicionado em Itaú, BTG Pactual e/ou Nubank com alguma intensidade”, recomenda.
Larissa Quaresma, analista da casa, ainda reforça que, sim, a ação do banco pode ainda se valorizar, mas não seria uma alta fundamentada, uma vez que a companhia não tem entregado resultados bons o suficiente.
“Porque estamos recomendando shortear (posição vendida) a ação, quer dizer que ela vai cair? Não necessariamente. Se você tiver um mercado super pró-risco e se continuarmos com ciclo de queda de juros, tudo sobe. Só que mesmo se as ações do Santander subirem, a gente acredita que os resultados do banco vão continuar com uma fotografia não muito boa, de forma que a alta possa não se sustentar se vier a acontecer“, afirma Quaresma.
Os bancos brasileiros continuam atrativos?
Um dos debates mais intensos no setor bancário atualmente gira em torno da atratividade dos grandes bancos, como o Santander, negociado a um preço sobre o valor patrimonial para 2024 de 1,26x, considerado historicamente “barato” pelos analistas da Empiricus Research.
Segundo Miranda, muitos investidores estrangeiros experientes, com décadas de cobertura das finanças dos mercados emergentes, sustentam a visão de que muitos dos desafios enfrentados pelo Santander são cíclicos e, com base no desempenho passado, é provável que ocorra uma reversão à média em algum momento.
“No entanto, na nossa visão, a distância entre players como o Santander e outros gigantes, como o Itaú, não apenas aumentou, mas também tende a continuar crescendo“, afirma o CIO.
A discrepância entre o ROE do Itaú e do Santander vem crescendo
De janeiro de 2010 a dezembro de 2022, a ação ITUB4 registrou um aumento de cerca de 190%, e o papel de Santander, de forma quase idêntica, atingiu um aumento total de 170% no mesmo período.
Analisando o ‘gap’ médio do ROE (retorno sobre patrimônio líquido) entre Itaú e Santander nesse período, percebe-se estabilidade em torno de 200 pontos-base, indicando desempenhos operacionais muito semelhantes na maior parte do tempo.
“Porém, desde dezembro de 2021, o Itaú superou o Santander de maneira impressionante. Essa diferença se destaca ainda mais quando examinamos o ROE ou EBT antes de impostos, proporcionando uma visão mais clara do poder de lucro de cada banco”, explica Miranda.
Muito se falou no mercado sobre as considerações de Santander sobre uma “recuperação gradual do ROE” que, segundo os analistas da Empiricus Research, não se concretizou.
“O modo de risco que o banco foi compelido a adotar para conter perdas e esclarecer a situação resultou em uma desaceleração significativa no crescimento dos empréstimos e uma queda acentuada no resultado de intermediação financeira do cliente no terceiro trimestre. Esses fatores, combinados, provavelmente resultarão em um efeito de transferência altamente negativo para o ano que vem. Por isso, antecipamos uma recuperação extremamente lenta do ROE para o Santander”.
Ao mesmo tempo, Miranda acredita que a exposição consideravelmente maior do Itaú a pessoas físicas de alta renda, a liderança no segmento atacado/grandes empresas (líder em gestão de caixa) e a transformação digital mais ágil o posicionam de maneira mais robusta para sustentar um ROE mais elevado por mais tempo. Nesse contexto relativo, o Santander estaria em desvantagem.
Os desafios do Santander: inadimplência e rentabilidade
A primeira área de negócios relacionada ao banco de varejo do Santander que passou por uma mudança significativa no cenário competitivo foi a aquisição de comerciantes. A contribuição final dos bancos proveniente dos adquirentes caiu de um dígito alto em 2017 para um dígito baixo na atualidade.
“Posteriormente, observamos a disrupção no segmento de investimentos, ao mesmo tempo em que testemunhamos uma transformação no segmento de emissão de cartões de crédito e contas correntes”, cita Miranda.
Ele ainda acrescenta o aumento da concorrência e alterações regulamentares que impactaram a rentabilidade dos bancos históricos. Dentre elas estão: o limite de taxas de intercâmbio de cartões de débito (outubro de 2018), o limite de taxas de juros do cheque especial (janeiro de 2020) e a eliminação do overhedge (janeiro de 2021).
Portanto, o Santander enfrenta desafios adicionais no cenário em transformação. “Além de sua maior exposição ao segmento de baixa renda, percebe-se uma perda de status como ‘relacionamento bancário principal’ para muitos clientes, agravada pela redução de sua participação de mercado nas transações com cartão de débito e depósitos à vista”, menciona o sócio-fundador.
Outro fator, complementa Larissa Quaresma, é o aumento da inadimplência do Santander no segmento de pessoa física muito acima da média do mercado. “Isso veio das concessões de crédito que chamamos de ‘mar aberto’, para quem não era correntista e o banco não conhecia, feitas em 2020 e 2021, o que machucou os resultados mais recentes. Apesar da inadimplência já ter iniciado alguma queda, o que é bom, a gente acha que vai levar mais um tempo para haver um apetite maior para a concessão voltar a crescer”.
Além disso, a analista cita a gestão da Tesouraria do banco, cujo papel é muito importante para a rentabilidade do banco. “Essa parte do banco é responsável por cuidar da parte da margem com o mercado, da entrada e saída de recursos financeiros. É uma área que faz literalmente trades no próprio balanço, e o Santander está muito atrás nessa linha de negócio, entregando prejuízos muito altos há vários trimestres”.
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Conclusão sobre o case
Em resumo, a escolha pelo Santander é motivada por sua avaliação esticada, especialmente em comparação com seus pares privados. No terceiro trimestre de 2023, o Santander e o Bradesco registraram ROEs recorrentes de 13,1% e 11,3%, respectivamente, enquanto o Itaú alcançou 21,1%.
“Espera-se que o ROE do Santander permaneça abaixo do custo de capital próprio por algum tempo. Em termos de múltiplos de preço/valor patrimonial, eles são de 1,4x, 1,1x e 1,7x, respectivamente”, explica Quaresma.
Segundo ela, isso implica que o Santander apresenta uma rentabilidade 16% superior ao Bradesco, mas seu múltiplo é 27% mais elevado.
“De maneira alternativa, o prêmio do Itaú pode ser considerado modesto: sua rentabilidade é 61% superior à do Santander, mas seu múltiplo é apenas 21% maior. Portanto, sugerimos a posição short no Santander como uma estratégia isolada para se proteger contra uma possível correção no setor, reconhecendo uma certa ‘gordura a ser queimada’ na avaliação de SANB11″, finaliza a analista.