Investimentos

IRBR3: Ações do IRB Brasil Resseguros, prós e contras

IRBR3 passa por um cenário difícil, que vai de Warren Buffett até CVM

Por Matheus Egydio

11 dez 2020, 09:55

O IRB Brasil Resseguros (IRBR3) é uma relíquia do segmento de resseguros no Brasil, fundada há mais de 80 anos. As suas ações não são indicadas em nenhuma das nossas carteiras na Empiricus.

Neste artigo, nosso propósito é esclarecer os principais motivos pelos quais a ação não está entre as recomendadas pelo nosso time.

O conteúdo deste artigo está dividido nos seguintes tópicos, para facilitar sua leitura:

IRB Brasil… Resseguros (IRBR3)?

Talvez você se pergunte: o que é esse tal de resseguro? Bom, trata-se do seguro das seguradoras. Quando uma pessoa física ou jurídica contrata uma companhia de seguros, esta assume o risco financeiro do cliente. Só que ela pode dividir esse risco com uma resseguradora, cedendo parte do prêmio (nome dado ao dinheiro pago pelo cliente final).

O IRB Brasil Resseguros (IRBR3) oferece 12 linhas de resseguros. Há os mais tradicionais, como automotivo, de vida ou patrimonial — a seguradora que é cliente do IRB monta uma carteira de seguros automotivos, por exemplo, e faz um resseguro sobre ela para reduzir seu risco. E existem também os produtos mais diferentões, como para usinas nucleares (sim, se explodir tem seguro…) ou grandes projetos de petróleo e gás, além de resseguros marítimos (grandes embarcações, por exemplo), aeronáutico, entre outros.

Do monopólio estatal à iniciativa privada

Antes de sair de sua vida para entrar na história, Getúlio Vargas criou o Instituto de Resseguros do Brasil, em 1939.

Até então, as seguradoras brasileiras buscavam resseguros no exterior — quase não havia a oferta desse serviço no país. Vargas, então, proibiu essa prática, criando um monopólio para o IRB.

Funcionários do IRB Brasil Resseguros contando dinheiro em 1960

Em 1996, há o primeiro passo para o mercado privado: a empresa é transformada numa sociedade de economia mista (um mix de participação pública e privada) e passa a se chamar IRB Brasil Resseguros S.A.

Em 2007, finalmente, o mercado brasileiro de resseguros foi aberto para a competição. Chegava ao fim o ciclo de 69 anos de monopólio. 

Então, em 2013, a transição se completa: a empresa é privatizada e deixa de ser uma sociedade de economia mista, atuando independentemente da participação estatal.

Em 2017, a empresa abre capital na B3. Desde 2019, o IRBR3 é uma corporation, ou seja, uma empresa de capital pulverizado, sem um controlador definido, isto é, “com vários donos”, como bem destaca nosso analista Max Bohm aqui na Empiricus.

Warren Buffett e CVM: o que eles têm a ver com a companhia?

Tudo ia muito bem. De janeiro de 2018 a dezembro de 2019, a empresa valorizou mais de 240%.

O IRB se apresentava como “a resseguradora mais rentável do mundo”. A comparação com empresas estrangeiras era bizarra:

Até que…

No começo de 2020, o IRB foi acusado de erros graves de governança. A cotação da ação foi de R$ 44 em 31 de janeiro para R$ 7,30 em 20 de março — como você pode ver no tombo acima.

Não teve nada a ver com a pandemia. Tudo começou com dois relatórios da Squadra Investimentos, em fevereiro de 2020. Neles, a gestora de recursos justificava sua posição short, ou seja, o porquê estava apostando na queda das ações da resseguradora.

A Squadra fez uma vasta análise dos balanços do IRB e de informações da Susep (a autarquia que regulamenta seguros no Brasil) e apontou que a empresa fazia de tudo para inflar artificialmente seu lucro.

As seguradoras têm uma espécie de reserva futura para sinistros (ou seja, para os valores que desembolsam para os clientes quando o seguro é exercido). A principal iniciativa criticada pela Squadra era esta: o IRB reduzia mais e mais essa reserva, na prática transformando o dinheiro em lucro, embora isso deixasse a empresa vulnerável no futuro.

“Acreditamos que a rentabilidade do negócio é muito menor do que grande parte do mercado acredita ser”, escreveram os gestores. Como as empresas de seguro têm caixa positivo (recebem agora para pagar no futuro), “o ciclo longo do setor pode requerer anos até que se conheça a real performance de tais negócios”.

A carta da Squadra caiu como uma bomba sobre o IRB, cuja cotação caiu 20%. Mas o pior ainda estava por vir.

Para acalmar o mercado, a gestão do IRBR3 divulgou em uma teleconferência que a Berkshire Hathaway, de Warren Buffett, havia montado uma grande posição na empresa. Esse voto de confiança vindo da empresa de um dos investidores mais famosos do mundo desperta certa tranquilidade, não é?

E foi justamente esse o resultado: houve uma recuperação de 6,25% na cotação do IRBR3.

A questão, entretanto, é que a Berkshire Hathaway não havia investido na empresa. E a verdade veio à tona em março. No comunicado do conglomerado, deixaram claro que ela “não é atualmente acionista do IRB, nunca foi uma acionista do IRB e não tem intenção de ser acionista do IRB”.

A queda foi agressiva: 32% no dia seguinte. Ainda em 04/03, o CEO e CFO da companhia, José Carlos Cardoso e Fernando Passos, respectivamente, declararam a saída de seus cargos.

A CVM abriu uma investigação sobre o caso, que ainda está em andamento.

IRBR3 vai ser a GameStop (GME) do Brasil?

Nas últimas semanas, o caso da GameStop explodiu no mercado e na mídia. Você, nessa altura do jogo, já deve saber grande parte do enredo, mas, se não for o caso, nós explicamos a situação toda aqui.

Para garantir que estamos alinhados, vamos resumir os principais pontos neste artigo também.

A GameStop (GME) é uma empresa analógica em tempos digitais. Trata-se de uma varejista do setor de jogos de videogames, que sofreu com a pandemia e, antes disso, já apanhava de grandes plataformas digitais — as pessoas não precisam mais ir numa loja física para comprar videogames e, muitas vezes, até o jogo não é mais físico.

O mercado interpretou que o futuro da GameStop seria parecido com o da Blockbuster. Na prática, grandes fundos de investimento entraram short nos papéis da empresa (GME), ou seja, apostaram na queda do seu valor futuramente.

Para entendermos melhor como funciona essa dinâmica, vamos imaginar o seguinte cenário: você está acompanhando a Copa do Mundo no Brasil, no dia 5 de julho de 2014.

O time brasileiro venceu a seleção colombiana no dia anterior e o preço da camiseta da nossa seleção disparou para a casa dos R$ 200. Mas, sua análise técnica te diz que seremos atropelados pela Alemanha no dia 8 de julho.

Aí, você decide pegar a camiseta emprestada de um amigo e vende pelo preço atual (R$ 200). No fatídico jogo, dito e feito: 7×1. O preço da camiseta despenca para R$ 20 e você a compra de volta, devolve para seu amigo e embolsa R$ 180.

E foi isso que os grandes players financeiros fizeram com a GameStop (GME). As apostas contra a varejista eram tão altas que havia mais contratos futuros do que ações da empresa sendo negociadas na Bolsa.

Mas, bem… já sabemos que deu muito errado.

Um grupo no Reddit resolveu fazer o oposto dos fundos bilionários e a iniciativa viralizou. É como se milhões de pessoas soubessem que você estava apostando contra a seleção brasileira e, revoltadas, comprassem o produto numa quantidade imensurável.

Só que a sua não era realmente sua, lembra? Você pegou emprestada do seu amigo e, portanto, precisa devolvê-la — mesmo que o preço da camiseta, com a explosão da demanda, esteja na casa dos R$ 2.000.

Essa estratégia, como podemos ver, envolve um risco enorme porque as perdas são ilimitadas.

E nesse cenário, quem apostou contra a GameStop perdeu bilhões de dólares. Depois disso, espalharam-se rumores de que a ideia foi importada para o Brasil.

Aqui, a empresa da vez seria a IRB Brasil Resseguros (IRBR3).

Os investidores interessados no movimento criaram um grupo no Telegram, nomeado “Short Squeeze IRB”, que já conta com mais de 38 mil pessoas.

A reação foi rápida e intensa, como podemos ver abaixo:

IRBR3 tem alta de 17,46% em um dia

Entretanto, para além desse suposto “ganho fácil”, você já parou para pensar nas possíveis implicações financeiras — e até jurídicas — desses acontecimentos?

Vamos começar pelo aspecto financeiro da coisa: esse tipo de jogada é especulativa. Engana-se quem pensa que a única forma de sair perdendo é investindo short. Nesses casos, as análises técnicas indicam que essas empresas (GameStop e IRB) não valem todo o dinheiro que estão recebendo dos investidores.

O momento é de venda e os investidores inexperientes, ludibriados com uma possível oportunidade de ganhos estratosféricos, colocam muito dinheiro onde não devem.

Com a continuidade desse cenário cada vez mais digital, por exemplo, a GameStop pode muito bem continuar seu caminho rumo à falência. No curto prazo, os mercados são imprevisíveis e os investidores que preencheram fatias gigantes dos seus portfólios com GME podem se arrepender muito.

Há, inclusive, quem já se arrependeu: aqueles que compraram GME no dia 28 de janeiro, às 10h, e a seguram até o dia 1 de fevereiro, às 10: 30, viram o preço do papel despencar de US$ 469,42 para US$ 213,07.

GME sofre desvalorização de 54,61% em quatro dias

Quem se (des)aventurou nesse furor com um investimento de US$ 10 mil está, agora, com pouco mais de US$ 4.500. É razoável aferir que colocar seu dinheiro nessas ondas é, no mínimo, perigoso, certo?

Bom, para quem ainda quer tentar a sorte, precisamos destacar os riscos legais de se envolver nesses fenômenos. A iniciativa brasileira sobre IRBR3 não foi bem vista por órgãos reguladores e especialistas no assunto.

Em participação especial na newsletter Day One da Empiricus, Daniel Kalansky, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial, e Isac Costa, especialista em Regulação Financeira, deixaram uma advertência aos leitores e investidores em geral:

“Em suma, o caso GameStop não é uma simples ‘brincadeira’. E, se o caso IRB seguir os mesmos passos, também não será. Vale lembrar que, além de ilícito no mercado de capitais, a manipulação de mercado também configura crime. Deve-se, portanto, olhar sempre se há um comportamento real orquestrado com o propósito de aumentar ou diminuir o preço de uma ação com o objetivo de induzir outros a comprar ou vender aquele título”.

Já cogitou o cenário onde alguma autoridade federal decide investigar o grupo do Telegram e seu número de telefone estiver lá?

Por esses motivos, nós, da Empiricus, defendemos que não é sensato enveredar-se nessas iniciativas, quer você simpatize com elas ou não. Para ganhar dinheiro de verdade na Bolsa, é preciso ter uma visão de longo prazo e fundamentos mais robustos do que meras especulações.

Pontos positivos de IRBR3

Mas, nem tudo são trevas para o IRBR3. Vamos levantar, também, alguns contrapontos positivos acerca da empresa.

No terceiro trimestre de 2020, a empresa demonstrou um desempenho bastante positivo: houve geração de caixa de R$ 182 milhões, situação que não acontecia desde o primeiro trimestre de 2019. Em meio à pandemia do novo coronavírus, a empresa conseguiu crescer consistentemente.

Além disso, a empresa conta com nova direção desde o episódio de Buffett. Assim, é razoável entender que ela ampliará a transparência e não cometerá os mesmos erros de quem criou o incêndio que está apagando.

Conclusão sobre as ações do IRB Brasil Resseguros

Os danos recentes causados à credibilidade da companhia se refletiram sobre o preço das suas ações (IRBR3). Ainda que ela tenha se sobressaído financeiramente na pandemia, houve um impacto dessa crise no valor dos seus papéis.

Os pontos positivos que citamos podem florescer no futuro, mas, no momento, existem mais contras do que prós. Portanto, a indicação de vender IRBR3, feita por Max Bohm em maio de 2019, continua em vigor.

Sobre o autor

Matheus Egydio

Escreve para o site da Empiricus, MoneyTimes e Seu Dinheiro.