Investimentos

Jogadores de apostas esportivas e especuladores da Bolsa têm vieses cognitivos em comum, explica analista

Segundo Larissa Quaresma, analista da Empiricus, os mesmos mecanismos psicológicos que influenciam o comportamento de um apostador também são observados em especuladores.

Por Nicole Vasselai

10 out 2024, 16:22 - atualizado em 10 out 2024, 16:22

apostas esportivas

Imagem: iStock.com/South_agency

No Brasil, as apostas esportivas têm se tornado cada vez mais crescente entre a população. Até julho deste ano, 25 milhões de brasileiros estavam envolvidos em jogos de azar, segundo pesquisa recente do Instituto Locomotiva.

Esses números despertam preocupações tanto por seus impactos financeiros como pelo comportamento especulativo que eles revelam, semelhante ao que ocorre também no mercado de ações.

O que muitas vezes não é falado, entretanto, é que as apostas e o investimento em ações têm mais em comum do que se imagina, principalmente quando se trata dos vieses psicológicos que podem levar à perda de dinheiro.

Larissa Quaresma, analista de ações da Empiricus Research, comenta sobre esse comportamento especulativo no mercado financeiro, destacando que os investidores, assim como os apostadores, podem ser vítimas de ilusões que os levam a tomar decisões prejudiciais no longo prazo.

Para ela, os mesmos mecanismos psicológicos que influenciam o comportamento de um apostador também são observados em muitos investidores que acabam especulando e assumindo riscos excessivos.

O comportamento especulativo: sem garantias de sucesso

De acordo com o estudo do Instituto Locomotiva, 86% dos apostadores possuem dívidas e 64% estão com o nome negativado no Serasa. Esse cenário revela que ganhar dinheiro em apostas esportivas é extremamente difícil, especialmente no longo prazo.

Quaresma faz um paralelo importante: assim como nas apostas, a bolsa de valores também não é um ambiente fácil para lucrar, apesar de oferecer oportunidades baseadas em metodologias comprovadas de longo prazo.

“Na bolsa, o investidor pode seguir uma estratégia que, com o tempo, demonstrou ser vencedora, como a análise fundamentalista, por exemplo”, explica Larissa. “Já as apostas esportivas não oferecem qualquer tipo de estratégia sólida, o que torna o resultado puramente aleatório.”

Esse aspecto aleatório, segundo a analista, pode fazer com que o comportamento especulativo em ações e o vício em jogos de azar compartilhem características perigosas, como a busca por padrões falsos e a sensação de controle sobre o incontrolável.

Vieses psicológicos em comum: apofenia, ilusão de controle e aversão à perda

A analista destaca três principais vieses psicológicos que tanto apostadores quanto especuladores em bolsa devem evitar. O primeiro é a apofenia, que é a tendência de encontrar padrões em eventos aleatórios.

“Em um campeonato esportivo, alguém pode acreditar que, se o time X vencer um jogo em que o jogador Y estiver em determinada posição, isso se repetirá nos próximos jogos”, afirma. “No mercado, isso se traduz na crença de que, após uma queda de preço em uma ação, ela necessariamente se recuperará no pregão seguinte.” Esses padrões são ilusórios e não garantem resultados consistentes.

Outro viés perigoso, ela cita, é a ilusão de controle, em que tanto apostadores quanto especuladores acreditam que têm mais controle sobre o resultado do que realmente possuem.

“O apostador pode achar que se usar uma camiseta do time favorito terá mais chances de ganhar”, diz Quaresma. “O investidor, por sua vez, pode se sentir responsável por uma alta em uma ação e acreditar que se tivesse feito algo diferente, poderia ter evitado uma perda.”

Além disso, a aversão à perda e a ganância são dois fatores que também desempenham um papel crucial no comportamento especulativo.

“Quando alguém está perdendo no jogo ou no mercado, há uma tendência de aumentar os investimentos para tentar recuperar o prejuízo. Isso, na prática, leva a uma espiral de perdas”, alerta a analista. Da mesma forma, a ganância pode levar o especulador a assumir riscos excessivos quando está ganhando, ampliando os ganhos de forma descontrolada e potencialmente ruinosa no longo prazo.

O viés de sobrevivência: a exceção que vira regra

Outro fenômeno comum tanto entre apostadores quanto investidores especulativos é o viés de sobrevivência. “Muitas pessoas se lembram do amigo que ficou rico com a day trade ou que multiplicou seu dinheiro em apostas”, diz Quaresma. “Esses casos raros se tornam a exceção que confirma a regra, mas a grande maioria perde dinheiro.”

Segundo ela, esse viés pode levar os investidores a ignorar as estatísticas e os riscos reais, pois a memória coletiva tende a valorizar apenas os casos de sucesso.

A diferença entre especulador e investidor

Quaresma é enfática ao afirmar que a principal diferença entre um especulador e um investidor está na abordagem em relação ao risco.

“O investidor em ações toma decisões baseadas em uma análise profunda dos ativos e respeita as incertezas do mercado”, explica. “Ele sabe que perdas fazem parte do processo e não tenta controlar os elementos incontroláveis.”

Já o especulador, afirma, está sempre à procura de atalhos e acredita que pode manipular o mercado a seu favor, o que é uma ilusão.

Neste momento de pessimismo no mercado brasileiro, quando a bolsa está abaixo dos 130 mil pontos, Quaresma sugere que o investidor pode encontrar boas oportunidades a preços atrativos. “O valuation está convidativo, mas é preciso ter paciência e seguir uma estratégia bem definida, sem cair nas armadilhas da especulação”, conclui a analista.

Tanto as apostas esportivas quanto a especulação em ações envolvem riscos e podem levar a prejuízos se não forem tratadas com cautela. No entanto, enquanto no mercado financeiro há estratégias de longo prazo que podem ajudar a mitigar esses riscos, nas apostas o resultado depende quase que exclusivamente da sorte.

Para Larissa Quaresma, a vitória está em se afastar do comportamento impulsivo e especulativo e adotar uma abordagem racional, fundamentada em análise e disciplina.

No fim, seja nas apostas ou no mercado de ações, a chave para o sucesso é saber controlar os próprios vieses e evitar se deixar levar pela emoção.

Sobre o autor

Nicole Vasselai

Editora do site da Empiricus. Jornalista formada pela Faculdade Cásper Líbero, com MBA em Análise de Ações e Finanças e passagem por portais de notícias e fintechs.