A queda de 50 pontos-base da taxa básica de juro brasileira, Selic, na reunião de ontem (20) já era amplamente esperada pelo mercado. Neste sentido, como explicar uma reação tão negativa do Ibovespa no pregão desta quinta-feira (21)?
O tom hawkish (rigoroso) dos comunicados, tanto do Banco Central no Brasil quanto do Fed nos Estados Unidos, explicam a queda brusca. O movimento de baixa pode ser observado não só no mercado doméstico, mas em âmbito global.
Segundo o analista Matheus Spiess, da Empiricus Research, os comunicados mais conservadores geram ajuste nas curvas de juros, o que causa volatilidade e prejudica os ativos no curto prazo.
“É natural que a gente tenha volatilidade nos dias subsequentes às decisões de política monetária, porque o ajuste na curva de juros muda a taxa de desconto dos fluxos de caixa. O choque pode ser positivo ou negativo, como o que está acontecendo agora”.
O que explica o tom mais conservador do Banco Central?
Aqui no Brasil, o analista explica que o comunicado mais duro tem fundamento nos acontecimentos dos últimos 45 dias.
Desde a última reunião do Copom, no começo de agosto, alguns fatores internacionais pesaram negativamente.
O principal deles, a alta no valor de rendimento (yield) dos títulos do tesouro norte-americano (treasuries), que se deu por fatores técnicos.
Os dados fracos da China, principal parceiro comercial brasileiro, também impactaram o cenário.
No ambiente doméstico, as preocupações fiscais ligadas à arrecadação do governo para cumprir as metas predominaram. Spiess também lembra que os dados de inflação – exceto o IPCA de agosto, que foi bom – frustraram.
“Tudo isso fez com que o banco central se sentisse menos confortável com uma movimentação dovish (amena). Se a gente tem riscos de mudança de meta fiscal e instabilidade internacional, o BC ganha muito pouco em ser flexível”, explicou.
Com isso, o Banco Central acenou com cortes da mesma magnitude nas duas reuniões restantes de 2023.
O comunicado esfriou o otimismo de alguns investidores com relação a um corte de 75 pontos-base na reunião de dezembro. Isso diminui, ao menos momentaneamente, a euforia com os ativos de risco domésticos. A probabilidade de a Selic terminar o ano em 11,75%, que já era grande, agora é quase certa.
“É muito improvável um corte de 75 pontos-base nas duas reuniões que restam. Está dependendo de dados, claro, mas ainda assim o cenário base é de manutenção do ritmo de 50 pontos até o final do ano”, avalia Spiess.
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Fed dá sinais de que vai aumentar taxa de juro na próxima reunião
Nos Estados Unidos, a decisão de manutenção da taxa de juro entre 5,25% e 5,5% também veio em linha com o esperado.
No entanto, o comunicado deixa em aberto a possibilidade de mais uma alta na taxa em 2023.
“Podemos ter mais 25 pontos, um ajuste tímido mas que tem efeito nos ativos financeiros. Por isso a gente vê esse movimento de aversão a risco em nível global, fortalecimento do dólar, alta dos yields e queda das bolsas”.
Ainda que a provável alta na próxima reunião do Fed deva decretar o fim do ciclo de aumento do juro, a questão que se coloca na mesa é até quando a taxa ficará em níveis elevados – a percepção é que isso ocorrerá por mais tempo que o esperado, o que é ruim para os ativos de risco.
Por isso, a ata da reunião, que será divulgada nas próximas semanas, será importante para entender os contextos e detalhes da decisão.
Cenário no médio e longo prazo segue favorável para o Ibovespa
Apesar do choque que acredita ser de curto prazo, o analista segue construtivo com a bolsa brasileira em uma janela de 12 meses.
Os dados apontam que ciclos de queda de juro, como o atual, costumam trazer retornos de, em média, 35% ao Ibovespa. No entanto, ele frisa que a caminhada não será linear e momentos de baixa, como o atual, farão parte do processo.
“Historicamente, em momentos em que a bolsa está descontada, temos atratividade para entrada de capital, aliado à queda de juros, os ativos brasileiros ganham”.
Outro dado histórico é que o primeiro mês depois do início do processo de flexibilização monetária costuma ser negativo para o Ibovespa.
“O que aconteceu faz parte do histórico, está correspondente. Não muda o fato de que ano que vem a gente pode acelerar o ritmo de queda da Selic e isso é muito importante. Choques de curto prazo fazem parte do jogo e para quem tem uma posição estrutural de longo prazo, que é o que funciona em bolsa, esse tipo de coisa acontece e temos que estar preparados”.
O analista reforça a importância de uma carteira bem diversificada. “Precisamos ter caixa e posições em proteção, como ouro e dólar, para contrabalancear esses momentos de maior estresse”.
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