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Por que renda fixa pagando taxas altas é vista como atrativa, mas a bolsa passa a ser considerada um mau investimento?

Mesmo o Tesouro IPCA+ 2035 pagando um juro real altíssimo, o retorno esperado para as ações brasileiras é 5,2% anuais acima.

Por Larissa Quaresma, CFA

27 jun 2024, 16:16 - atualizado em 27 jun 2024, 16:16

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(Imagem: Blog Messem)

Quando os títulos de renda fixa passam a pagar taxas altas, eles são vistos como atrativos. Entretanto, quando a bolsa paga taxas elevadas, passa a ser vista como um mau investimento.

Por quê?

Os títulos do Tesouro IPCA+ com vencimento em 2035 estão pagando um juro real altíssimo (como mostra o gráfico abaixo). Quem os comprar atualmente, receberá IPCA+6,4% anualmente, caso segure-os até 2035. De fato, estamos em uma zona bem interessante para comprá-los.

Fontes: Tesouro Nacional, Empiricus Research

Por outro lado, a bolsa de valores também está pagando uma elevada taxa de retorno. A diferença é que essa taxa não é sabida com exatidão antes de efetivamente realizada; é preciso estimá-la.

Para isso, olhamos para o chamado earnings yield, que consiste no lucro gerado pelas empresas como percentual do valor de mercado, ou, em termos unitários, o lucro por ação dividido pelo preço por ação. Em formato matemático, earnings yield = Lucro/Preço, ou L/P (exatamente o inverso do índice Preço/Lucro).

É claro que essa taxa deveria ser maior que aquela do título do Tesouro, porque investir em empresas é mais arriscado do que em títulos soberanos.

Portanto, para estimar o retorno adicional obtido para se investir em ações, ou o Prêmio de Risco da Bolsa, subtraímos a taxa dos títulos do Tesouro do earnings yield. Ou seja, Prêmio de Risco de Bolsa = earnings yield – Taxa do Tesouro IPCA+ 2035. Observe como esse prêmio de risco também está elevado:

Fontes: BTG Pactual, Empiricus Research

Isso significa que o investidor, ao comprar ações brasileiras hoje, tem um retorno esperado de 5,2% anuais acima do Tesouro IPCA+ 2035.

  • VEJA TAMBÉM: Conheça os títulos de renda fixa exclusivos que são os prediletos dos milionários e estão pagando mais de 2% ao mês; saiba como investir

Mas se o retorno das ações seria maior, por que, então, os investidores não saem correndo para comprar bolsa?

Como palpites, apresentamos duas possíveis explicações.

A primeira: para tomar decisões de investimento em renda fixa, os investidores olham para a taxa, e não para o preço do título. Na bolsa, é o contrário; o patamar de preço é constantemente monitorado para a tomada de decisão (mas da forma errada).

Ocorre que, na renda fixa, quando as taxas ficam mais altas, elas imediatamente penalizam o preço de mercado do título. A taxa maior é, na verdade, consequência de um preço menor. Veja, no gráfico abaixo, como o preço do título Tesouro IPCA+ é o espelho da sua taxa:

Fontes: Tesouro Nacional, Empiricus Research

Na bolsa, é a mesma coisa: maiores taxas de retorno esperadas comumente vêm com preços também mais baixos. Entretanto, os preços mais baixos são o que fica mais disponível aos olhos, de forma que é necessária uma certa abstração cognitiva para chegar a essa conclusão. Assim, investidores podem acabar acreditando, irracionalmente, que preço baixo = retorno baixo.

Esse é um erro comum, que vem do chamado “viés de enquadramento“. Esse é um vício cognitivo que nos leva a tirar conclusões diferentes a depender da forma que as informações são apresentadas a nós. Portanto, para evitá-lo nos investimentos, é interessante comparar os ativos utilizando métricas equivalentes (preço para tudo ou retorno para tudo).

Lucros esperados para as ações estão sujeitos à volatilidade

A segunda explicação para o baixo apelo dos prêmios de bolsa tem, essa sim, alguma racionalidade. O earnings yield pode ser considerado mais incerto no Brasil. A volatilidade das nossas políticas econômicas e das regras de negócio gera uma volatilidade também nos lucros esperados, diminuindo o valor preditivo dessa métrica.

Nessa lógica, o prêmio de risco deveria ser estruturalmente muito alto, principalmente quando a incerteza aumenta conjunturalmente, como é o caso agora.

Nós acreditamos que a incerteza diminuirá em algum momento, embora não para os patamares compatíveis com um governo pró-mercado. O primeiro passo nesse sentido foi dado na semana passada, com a decisão unânime do Comitê de Política Monetária (Copom) pela manutenção da taxa Selic em 10,50% anuais.

O veredito contou inclusive com o voto dos diretores indicados pelo governo atual, uma importante sinalização da independência técnica do órgão, mesmo frente à forte pressão política por mais cortes.

Com isso, a âncora monetária, um importante gatilho para a redução do prêmio de risco (e consequente alta das ações) parece voltar gradualmente.

Ademais, temos mais dois gatilhos possíveis para redução de prêmio: diminuição de gastos pelo governo (mesmo que marginal) e o corte de juros nos EUA, que seguimos enxergando para breve.

Cabe ressaltar que existem empresas mais ou menos sujeitas a essa volatilidade da política econômica, de forma que seus lucros são mais previsíveis. Na Empiricus Research, priorizamos exatamente essas, ou, se forem sensíveis às políticas governamentais, que sejam para o lado positivo – como é o caso da Direcional, recomendada por nós e beneficiada pelos programas de moradia popular.

Separar o joio do trigo é fundamental; mas é preciso muita convicção nos fundamentos para segurar as empresas verdadeiramente vencedoras (não são muitas no Brasil).

Sobre o autor

Larissa Quaresma, CFA

Analista de Ações focada em Bancos e Instituições Financeiras, integra a equipe da Carteira Empiricus, o portfólio multimercado da casa. Mais de 5 anos de experiência em análise de empresas, com passagens pela Núcleo Capital e pelo Credit Suisse. Administradora formada pelo Ibmec-MG, com certificações CFA, CNPI e CGA.