Investimentos

Quais os desdobramentos globais da suspensão do acordo de grãos do Mar Negro pela Rússia?

Com suspensão do acordo por parte da Rússia, inflação do preço de alimentos pode impactar principalmente países pobres do sul global; entenda

Por Nicole Vasselai

19 jul 2023, 15:34 - atualizado em 19 jul 2023, 15:55

Imagem das delimitações fronteiriças entre Rússia e Ucrânia em menção à guerra entre esses dois países Rússia Ucrânia Grupo Wagner
Reprodução: Shutterstock

Uma das principais notícias macroeconômicas da semana é a suspensão do acordo de grãos entre Rússia e Ucrânia, que permitia o livre transporte de produtos agrícolas ucranianos e russos no Mar Negro desde julho de 2022. Agora, com a saída da Rússia, isso pode causar impactos globais para centenas de países, como inflação do preço dos alimentos.

Matheus Spiess, analista da Empiricus Research, explica: “Esse acordo foi fundamental para a cadeia de suprimentos, principalmente para países do sul do globo, mais pobres, como os africanos, que dependem de grãos que vêm da Rússia e principalmente da Ucrânia”.

Ao longo dos últimos meses, ele conta, mais de 30 milhões de toneladas de alimentos foram transportados por aquele canal e mais de mil embarcações passaram pelo Mar Negro com essa finalidade. “Agora temos cerca de 45 países sendo beneficiados por essas medidas”.

Por que a Rússia quis suspender o acordo?

“A Rússia acusou a Ucrânia de que a maioria dos beneficiários eram países ricos e não pobres, mas os ucranianos e a Turquia, que buscam uma negociação, um tratado de paz, já mostraram que os mais afetados são de fato os países mais pobres”, contextualiza o analista.

Não é a primeira vez que a Rússia sai do acordo. Desde que ele foi instaurado, o país já saiu três vezes do acordo e, em duas delas, houve suspensão antes do retorno. O objetivo dos russos, segundo Spiess, é “para pressionar e ter uma fatia maior do bolo para si”.

Nesse momento, o país pleiteia duas demandas:

  • liberação de gasoduto para prover amônia para fertilizantes;
  • retomada das relações com o swift de um banco em específico, que é o banco de agricultura russa.

Na visão do analista, no curto prazo a probabilidade de aceitação desses termos pelos demais envolvidos no acordo é baixa. “Talvez sejam aceitos outros pontos, caso a Rússia volte à mesa de negociação”, afirma.

A suspensão do acordo de grãos pode disparar preço de alimentos

A pausa no acordo, explica Spiess, impacta o preço dos grãos, já que há menos oferta, e beneficia países exportadores, entre eles o próprio Brasil. “Patamares de commodities mais elevados favorecem a balança comercial brasileira e, consequentemente, propicia um patamar de PIB mais elevado”, pontua.

“É claro que a gente está falando de um choque muito curto, não necessariamente isso se manterá por muito tempo”, alerta.

Segundo ele, para os países envolvidos no acordo, o entendimento é de que a Rússia vai voltar à mesa de negociação e renovar esse acordo, ainda que em um modelo ou formato diferente.

“Enquanto isso, observamos nos últimos meses preparativos da União Europeia e da Ucrânia de rotas alternativas, para endereçar essa questão da cadeia do suprimentos sem o Mar Negro. Encarece a logística e fica muito mais complicado, mas é muito mais viável. Então o choque que tivemos ano passado não vai se repetir. Até mesmo porque o mercado já está amortecido dessa temática”, tranquiliza.

Ou seja, produtos agrícolas poderão subir de preço por conta desse fluxo e, em um segundo momento, a fome pode se intensificar nos países do sul global.

Por fim, o analista reforça que ainda é difícil decifrar todas as perspectivas após essa decisão da Rússia, uma vez que tudo está acontecendo em tempo real e pode mudar “de um instante para o outro”.

Para conferir a entrevista completa de Matheus Spiess sobre o acordo de grãos para o programa Giro do Mercado, é só dar “play” neste vídeo:

Sobre o autor

Nicole Vasselai

Editora do site da Empiricus. Jornalista formada pela Faculdade Cásper Líbero, com MBA em Análise de Ações e Finanças e passagem por portais de notícias e fintechs.