Investimentos

Qualidade do pacote fiscal é mais importante do que o valor do corte, defende analista da Empiricus – entenda os pontos mais relevantes do ajuste 

A estrutura fiscal, velho calcanhar de Aquiles brasileiro, requer um corte de gastos para os próximos anos que foi prometido desde o início de 2024.

Camila Paim Figueiredo Jornalista

Por Camila Paim

22 nov 2024, 08:36 - atualizado em 22 nov 2024, 08:41

brasil pacote fiscal corte de gastos economia

Imagem: iStock/ themotioncloud

Quase tão aguardado quanto o hexa brasileiro, o pacote fiscal só não pode virar piada porque mexe com o bolso de tanta gente. Os sucessivos adiamentos para a entrega do plano de corte de gastos do governo já cansaram o mercado. “A gente sabe que toda a estrutura fiscal é o calcanhar de Aquiles do país”, comenta o analista macroeconômico da Empiricus Research, Matheus Spiess. 

“Tivemos dois governos [Temer e Bolsonaro] que adotaram uma camisa de força muito dura [com os gastos], que foi remodelada ao longo da pandemia justamente para abarcar gastos extraordinários”, recapitula Spiess em participação ao Giro do Mercado, programa ao vivo de notícias diárias do Money Times, portal do Grupo Empiricus, nesta quinta-feira (21).

Agora, a grande dúvida do mercado reside no tamanho e quão bom – em termos qualitativos –  será esse ajuste fiscal.

Um ano de discursos sobre ajuste fiscal

Desde o início de 2024, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, adotou uma postura firme ao falar sobre “fazer um pente fino nos gastos federais”. Contudo, na visão de Spiess, até agora não vimos frutos disso, provocando uma deterioração da credibilidade nos discursos do dirigente. 

“O mercado agora precifica um aperto monetário muito duro, porque na falta de uma âncora fiscal precisamos de uma âncora monetária”, explica o analista, justificando previsões da Taxa Selic chegando a níveis entre 13% e 14% ao ano. 

A ‘ciranda’ de Lula

Enquanto isso, as tentativas de comunicação do governo foram “truncadas”, afirma o analista, com o posicionamento da Fazenda e do Ministério do Planejamento – liderado por Simone Tebet – perdendo sua força. 

“O presidente Lula fica nessa ciranda entre falar mal do mercado e do ajuste fiscal e fazer as reuniões com Haddad, para justamente aprovar um ajuste”, critica o analista. 

Qual será o tamanho do corte de gastos?

Sobre o pacote de cortes de gastos em si, os números seguirão incertos até o anúncio oficial do governo. Nesta quinta-feira (21), o ministro Haddad afirmou à imprensa que será feito um bloqueio em torno de R$ 5 bilhões no Orçamento de 2024, somando aos R$ 13,3 bilhões que já estão travados hoje. 

Para 2025 e 2026, as expectativas são de um plano de contingência da ordem de R$ 70 bilhões.

“Mais importante do que o valor a ser cortado é a qualidade desse corte – no final do dia o que estamos debatendo aqui é o quão sustentável é a trajetória do endividamento brasileiro”, comenta Spiess. 

Na visão do analista, uma das questões mais críticas é a dívida/PIB do Brasil, que atualmente está em cerca de 80%. “Esse número em países desenvolvidos como Japão e Estados Unidos é ‘ok’, mas é ruim em um país emergente como o Brasil, com o efeito de juros muito altos e o impacto disso na curva [de juros]”, explica. 

Ademais, as previsões de alta da Selic também podem mudar a depender do pacote fiscal apresentado, afirma o analista. “Um pacote mais bem estruturado faz com que não seja necessário que a taxa básica de juros suba para 14% ao ano e, no próximo Copom de dezembro, pode haver um aumento menor, de 50 pontos-base ao invés de 75 pontos-base”, calcula. 

Para Spiess, um pacote fiscal avaliado como “ruim” seria se apenas incluísse cortes de despesas pontuais e com um valor total “medíocre”. 

Empresas brasileiras estão melhores, mas economia não reflete os dados

Ainda na entrevista ao Giro do Mercado, Spiess conta que as empresas brasileiras listadas na bolsa de valores, que reportaram seus balanços trimestrais nas últimas semanas, não estão tão mal. “Não foi uma temporada tão ruim. As empresas melhoraram ao longo dos últimos anos, e a gente só não vê esses bons resultados se traduzindo nos preços, porque tem essa trava do fiscal”, justifica. 

Na noite desta quinta-feira (21), o ministro da Fazenda anunciou que as medidas devem ser anunciadas no começo da semana que vem, mais provavelmente na segunda-feira (25) ou na terça-feira (26). 

No quadro abaixo você pode conferir o programa do Giro do Mercado desta quinta-feira (21) completo:

Camila Paim Figueiredo Jornalista

Sobre o autor

Camila Paim

Jornalista formada na Universidade de São Paulo (USP), com mobilidade acadêmica na Université Lumière Lyon 2 (França). Trabalhou com redação de jornalismo econômico e mercado financeiro, webdesign e redes sociais, além de escrever sobre gastronomia e literatura.