Crypto Insights

Um olho em cripto e o outro no macro: Cenário regulatório nunca esteve tão alinhado, mas ainda falta o principal: estabilidade e liquidez

No Crypto Insights de hoje trago uma visão mais ampla, que pode servir de alento para quem está disposto a expandir seu horizonte de investimento

Por Luis Kuniyoshi

28 mar 2025, 14:26 - atualizado em 28 mar 2025, 14:29

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Imagem: iStock.com/Vertigo3d

Nos últimos meses, muito se falou sobre Donald Trump como um catalisador para o mercado de criptomoedas. No entanto, os preços não reagiram da forma esperada, o que levanta a pergunta: seria tudo mentira?

Essa narrativa de que a presidência de Trump traria uma performance excepcional para o Bitcoin tem funcionado como um grande atrativo para novos investidores. Não é à toa que, desde sua vitória, as buscas por “criptomoedas” no Google Trends (Brasil) cresceram significativamente, alcançando seu pico no dia anterior à sua posse. Isso sugere que uma leva de novos investidores pode ter chegado para conhecer o mercado, separando parte de seus portfólios para esta classe.

Fonte:  Google Trends

Entretanto, a performance dos ativos nas últimas semanas não tem atendido às expectativas, especialmente daqueles mais ansiosos, que se concentram exclusivamente na movimentação de preços no curto prazo. Muitos podem ter sido atraídos pelo “Trump trade” e, como recém-chegados, acabam sendo mais sensíveis às flutuações do mercado. 

Por isso, no Crypto Insights de hoje, trago uma visão mais ampla, que pode servir de alento para quem está disposto a expandir seu horizonte de investimento. Nossa convicção é que, apesar dos ruídos momentâneos, quem tiver paciência, convicção e a estratégia correta, está diante de uma oportunidade única.

Primeiramente, é essencial entender o que movimenta o preço dos ativos de risco, de forma simples: o fluxo de dinheiro. Mas o que faz esse fluxo ser direcionado a um ativo específico? São os fundamentos, ou seja, a narrativa, a qualidade do produto, o valor percebido e outros fatores que geram confiança e atraem os investidores.

Fundamento

No caso das criptomoedas, a infraestrutura da blockchain tem se destacado por reduzir custos, garantir segurança e promover transparência. Esses benefícios têm sido cada vez mais reconhecidos e se aprimorado ao longo do tempo.

No entanto, nesta coluna, gostaria de destacar a importância da narrativa. Desde a posse de Trump na Casa Branca, um novo capítulo se abriu para o setor cripto, com uma mudança significativa na postura do governo em relação ao segmento. Esse novo posicionamento tem se refletido no desenvolvimento de políticas regulatórias mais favoráveis e em um apoio crescente à adoção de criptomoedas no mercado institucional. Alguns exemplos disso são:

  • Criação de uma reserva estratégica de Bitcoin;
  • Criação de uma força tarefa de cripto, presidida por David Sacks (czar de cripto e IA) e incluindo grandes nomes como o Secretário do Tesouro americano (Scott Bessent), o presidente da SEC e chefes de outros departamentos;
  • Aprovação da SAB122, permitindo a interação entre bancos e criptomoedas;
  • Propostas de reservas estratégicas em nível estadual correndo pelo congresso;
  • Câmara dos EUA aprovou a H.J. Res. 25, que derrubou uma regra do IRS que impunha novos requisitos de relatórios para plataformas de finanças descentralizadas (DeFi).

Essas são apenas as principais, mas mesmo assim não foram suficientes para elevar o ânimo dos investidores. O que falta? Liquidez.

Liquidez

Em tempos de incerteza, as pessoas tendem a arriscar menos, pois a necessidade de planejamento e a preocupação com o futuro se tornam mais evidentes. Isso reflete a expressão “viver o momento, com os olhos no futuro”.

Outro fator crucial é a liquidez, que pode ser entendida como a quantidade de dinheiro circulando no sistema. Quando estabilidade e liquidez estão alinhadas, há mais dinheiro disponível para consumo e para investimentos em ativos de risco, como as criptomoedas.

Atualmente, temos um cenário em que o governo de Trump está promovendo mudanças regulatórias importantes, mas também gerando incertezas globais, especialmente com sua política tarifária. Essas tarifas, implementadas de forma agressiva e imprevisível, têm restringido a liquidez no sistema, alimentando temores de pressões inflacionárias. O próprio presidente do Federal Reserve alertou sobre o impacto dessas políticas, o que tem neutralizado, em parte, os esforços para injetar liquidez no mercado.

Além disso, o rumor de uma possível recessão paira no ar. Embora ainda não seja uma certeza, não pode ser descartado. No curto prazo, estamos começando a ver sinais de desaceleração econômica, conforme discutido nas últimas reuniões do Banco Central. Por isso, é crucial acompanhar a divulgação de novos dados macroeconômicos. 

Olhando para liquidez, o momento exige cautela e paciência para avaliar os próximos passos. Isto é, menos exposição ao risco.

Visão de longo prazo

Estamos vivendo num momento histórico para criptomoedas com um cenário regulatório favorável se desenvolvendo na maior economia do mundo. Vale destacar que esse processo não acontece da noite para o dia; a evolução legislativa exige tempo, o que é fundamental para evitar abusos e garantir um ambiente legal robusto.

Paralelamente, grandes players institucionais como BlackRock, Fidelity, Goldman Sachs e o próprio governo estão, gradualmente, se integrando à tecnologia blockchain, sinalizando um caminho de adoção mais ampla e consolidada. 

Isso vem se materializando, especialmente através do setor de stablecoins (criptomoedas lastreadas em ativos tradicionais, como o dólar), que têm funcionado como um verdadeiro “cavalo de tróia” (no bom sentido) para a penetração das criptomoedas no sistema financeiro tradicional. 

Dentro do universo cripto, esse é um setor que merece atenção, pois, além de servir como porta de entrada tanto para investidores institucionais quanto para o varejo, as stablecoins são o coração do ecossistema DeFi. Em outras palavras, à medida que as stablecoins ganham mais adoção, o impacto no setor DeFi será significativo (importante sempre lembrar que é preciso alinhamento com cenário macro), o que torna interessante separar uma parte do portfólio dedicado a esse segmento.

Apesar de tudo, o atual momento de incerteza econômica está afastando investidores (dinheiro) mais arrojados, mas essa é uma dinâmica cíclica, típica de mercados voláteis.

Dado isso, em minha visão, os fundamentos e os preços das criptomoedas estão temporariamente descorrelacionados. Com a eventual melhora do cenário macroeconômico, acredito que os sólidos fundamentos do setor atrairão uma quantidade significativamente maior de capital, impulsionando os preços a novas alturas. No entanto, o cenário atual ainda exige cautela, o que implica em uma maior exposição a ativos mais consolidados. Para dar o próximo passo, é essencial estar preparado para ajustar as alocações no momento oportuno, aumentando a exposição ao risco conforme o mercado evolui. 

Variações semanais (18/03/25 a 27/03/25)

  • Bitcoin (BTC): US$ 87.223 | Var. +5,46%
  • Ethereum (ETH): US$ 2.002 | Var. +3,55%
  • Dominância Bitcoin: 61,52% | Var. -0,5%
  • Valor total do mercado cripto: US$ 2,64t | Var. +3,13%
  • Valor de mercado de stablecoins: US$ 234,305b | Var. +1,02%
  • Valor total travado (TVL) em DeFi: US$ 96,437b

Dados referentes ao fechamento em 27/03/25

Gráfico da semana

O gráfico abaixo mostra os spreads de crédito, que são a diferença entre a taxa de juros que um investidor recebe ao comprar um título de dívida corporativa e a taxa de juros de um título de dívida do governo.

Fonte: FRED

Sempre que um investidor compra um título de dívida, ele está basicamente emprestando dinheiro para a entidade que o emite. Em troca, ele receberá de volta o valor emprestado acrescido de juros. 

Não são apenas os governos que emitem esses títulos; as empresas também podem emitir títulos de dívida, conhecidos como títulos corporativos, para levantar capital. Esses títulos funcionam de forma semelhante aos títulos do governo, mas com o risco adicional de que a empresa emissora possa enfrentar dificuldades financeiras e não conseguir pagar os juros ou o valor principal.

Perceba que atualmente, os spreads estão em níveis baixos. Isso significa que, apesar da incerteza macroeconômica, o investidor ainda não está exigindo uma grande compensação pelo risco de investir em títulos corporativos em comparação com os títulos do governo. 

Em outras palavras, os investidores estão relativamente confiantes em relação à capacidade das empresas de honrar suas dívidas, algo que não é característico de um cenário recessivo, quando muitas vão à falência. 

Isso reflete uma percepção mais otimista sobre o risco de crédito, mostrando que ainda há apetite ao risco no mercado e indica um afastamento de um cenário recessivo, se esse for o caso, ainda estamos em estágios iniciais.

Atenciosamente,
Luis Kuniyoshi

Sobre o autor

Luis Kuniyoshi

Analista de criptomoedas na Empiricus Research.