Um jogo que eu inventei de jogar quando era adolescente é: “o mundo pode ser dividido em dois tipos de pessoas”.
É meio fácil de jogar.
Você simplesmente vomita essa frase despretensiosa e então a aplica a qualquer contexto pertinente, sem grande rigor científico.
Por exemplo: “o mundo pode ser dividido em dois tipos de pessoas – aquelas que gostam de jogos idiotas e as que não gostam”.
Com alguma sorte, é possível capturar doses mundanas de sabedoria nessas clivagens aparentemente arbitrárias.
Na barraca da praia, nota-se que existem pessoas que pedem caipiroska e outras que pedem caipirinha de vodka.
Particularmente, costumo admirar a turma da caipiroska – mais imaginativa e tropicalista –, embora não funcione para a variação da caipisakê, que me transmite o efeito contrário.
Aquelas pessoas que dizem “caipisakê” estão tentando imitar a criatividade da caipiroska por meio de paralelismos sintáticos, mas sem o mesmo charme.
Eu tenho um amigo que – graças a deus, não trabalha no mercado financeiro – vai na mesma barraquinha de sempre, só que aquela era sua primeira vez; faz um tempo já.
– Bom dia! Solzão maravilhoso, hein? Por favor, você pode me fazer uma caipirinha?
– Claro! Você quer caipirinha de quê?
Esse meu amigo ficou transtornado.
– Como assim, caipirinha de quê? Caipirinha de caipirinha, uai! Limão, cachaça, açúcar, gelo. Sabe como é?
A moça da barraquinha deu risada, pediu desculpas, entendeu, e hoje não pergunta mais pra ele.
– Você tá certo, antes era assim, mas é que o mundo mudou muito, hoje o cliente tá criativo demais, e a gente se acostumou a perguntar, pra não correr o risco, né?
Esse é o risco de se dividir o mundo em dois tipos de pessoas. Sujeito começa a jogar e não consegue mais parar. Vai dividindo, dividindo e, de repente, surgem 256 modalidades diferentes de caipirinha, feitas para todos os gostos.
Meu amigo me ligou boquiaberto pra perguntar se o pregão de ontem era normal.
Eu respondi que o mundo pode ser dividido em dois tipos de investidores.
No primeiro tipo, estão aqueles investidores que entendem o pregão de ontem como algo raro, mas que acontece.
No segundo tipo, estão os investidores que entendem o pregão de ontem como algo que acontece, mas é raro.
– Uai, Rodolfo, mas aí onde estão os investidores que veem o pregão de ontem como algo normal?
Esses não são investidores.