Day One

Empiricus, 12 anos: abaixo a ditadura (do argumento)

Completamos 12 anos nesta semana. Valeram por uns 120. A caminhada trouxe muitas cicatrizes, menos cabelos — e, surpreendentemente, depois, mais cabelos de novo. Para algumas coisas, ainda existe Mastercard. Piada interna, desculpa.

Por Felipe Miranda

01 nov 2021, 10:39

Completamos 12 anos nesta semana. Valeram por uns 120. A caminhada trouxe muitas cicatrizes, menos cabelos — e, surpreendentemente, depois, mais cabelos de novo. Para algumas coisas, ainda existe Mastercard. Piada interna, desculpa.

É bom ver que, doze anos depois, ainda somos os mesmos. A edição de 1º de novembro de 2009 do já falecido jornal Brasil Econômico trazia uma foto nossa grandona no Museu do Ipiranga, antecipando, ipsis litteris, o “grito pela independência do research no Brasil”.

Ontem, almocei com um grande amigo e gestor, vizinho, que me disse: seu último relatório foi seu “7 de setembro”, uma bela demonstração de independência. 

Aniversários são, de algum modo, encontros consigo mesmo. O dia do ano em que o calendário lembra da sua própria vida, daquilo que você tem de mais íntimo e caro. Sempre um momento para a autorreflexão.

Preservar a essência não significa falta de flexibilidade ou estagnação. Muitas vezes, inclusive, precisamos mudar para continuarmos os mesmos. A liderança do BlackBerry não foi preservada porque a empresa foi incapaz de mudar, por exemplo. Deitou no berço esplêndido do teclado em relevo e resistiu ao touchscreen. Quando acordou, era tarde demais.

Temos planos bem definidos para nossa próxima primavera. 

Dispomos de uma equipe muito robusta de analistas de ações. Equity guys por natureza. Nascemos assim: com a ideia de levar ao investidor pessoa física, muitas vezes um pouco mais leigo e/ou com menos tempo, aquelas ideias anteriormente restritas ao smart money. Continuamos com o mesmo espírito, levando aquilo que se discute em jantares presenciais ou em grupos de WhatsApp de grandes banqueiros, gestores e empresários como sobremesa para os investidores de varejo. Uma perseguição obstinada pelas melhores ideias de investimento disponíveis, iguais (ou até melhores em determinadas circunstâncias) do que aquelas dos grandes profissionais da área. 

Isso não significa, obviamente, que não possamos e que não devemos melhorar nessa área. Estamos ampliando a equipe com a contratação de mais dois analistas de ações e, quase como um sonho íntimo, eu, Felipe, carrego a intenção de fazer um M&A para fortalecer ainda mais essa cobertura — mas esse é papo para depois. Tudo tem sua hora.

Mesmo que ninguém queira saber de Bolsa brasileira neste momento, dadas as cicatrizes recentes e a ressurreição da renda fixa, nós queremos. Talvez até haja correlação positiva entre as coisas. O desinteresse alheio freia a demanda por ações domésticas, tornando-as, como qualquer outro bem, mais baratas. Deveríamos mesmo aproveitar a temporada de descontos para comprar aquilo que está largado. Pode ser meio fora de moda falar de ações brasileiras agora. Mas quem disse que nós andamos na moda por aqui? O que está na moda costuma estar caro e, portanto, deveria ser vendido (não comprado). Depois de 12 anos, ainda nos apegamos à lição mais elementar das finanças: comprar barato, vender caro. O plano para o próximo ano está bem claro e vamos executá-lo.

Também temos sensibilidade ao momento. 

Sabemos das oportunidades excepcionalmente boas na renda fixa com esse patamar de juros. Queremos aproveitá-las com mais intensidade. Nosso assinante merece isso. Apesar de já termos um time bem competente nesse ambiente e ótimas alternativas na Vitreo, vamos dar um passo além nesse segmento e promover uma verdadeira revolução em renda fixa, em prol de nossos assinantes. Aguardem novidades em breve.

Ao mesmo tempo, estamos ampliando também nosso time de cobertura internacional, em linha com nossa estratégia consistente de diversificação regional e entre moedas. Começamos essa caminhada de maneira mais estruturada há dois anos. A insistência junto a nossos assinantes para internacionalizar suas carteiras foi colocada, publicamente no relatório, como grande meta dos assinantes do Palavra do Estrategista ao final de 2019. Colhemos ganhos importantes aqui, mas queremos ir além.

E para completar as quatro pontas, demos um mandato bem objetivo ao André Franco: monte um plano para sermos a principal casa de criptomoedas do Brasil. Foi nosso próprio momento Mario Draghi: “Whatever it takes”. Na minha opinião, André Franco é hoje o maior analista de criptomoedas do Brasil. E falo isso por uma razão tangível. Ele não pertence ao “beatiful people” descolado ou à pseudointelectualidade anarco-capitalista defensora teórica das criptos em redes sociais ou em eventos de autoajuda disfarçados de empreendedorismo e liderança. André é um ganhador de dinheiro na área, com o melhor track record da indústria há vários anos. Money talks, bullshit walks. Temos planos muito ambiciosos para nos consolidarmos ainda mais em cripto, nicho que exploramos desde 2016 e agora nos sentimos prontos para, dada a maior institucionalização dos criptoativos, dar um passo além. 

Para o curtíssimo prazo, temos novidades interessantes também. Nestes dias, acontece nossa semana de aniversário, com promoções muito interessantes para nossos assinantes. Fica o convite para aproveitá-las, pois elas ocorrem em características sem precedentes.

Já na semana que vem, temos nosso evento anual. Cinco dias com conversas muito legais, como tradicionalmente fazemos em nossos aniversários. Alguns encontros especiais: Pedro Malan, Gustavo Franco, Morgan Housel, André Jakurski, Daniel Goldberg, Eduardo Giannetti, Maria Homem, Stephen Schwarzman, entre outros.

Confesso interesse especial no papo entre o Rodolfo e o Terrance Odean. Sabe como é: sempre bom ver um gênio conversando. E o Odean é um sujeito inteligente também. 

Deixe-me fazer um pequeno desabafo sobre isso: acho que só a Empiricus poderia trazer o Terry Odean para um evento ao varejo. Suspeito que seja porque ele — e nós — somos de verdade. E por essas bandas, quase ninguém se importa mesmo com a verdade. Cada um defende o seu, apoiado em falsas narrativas e demagogias. Já havíamos trazido Daniel Kahneman e Richard Thaler; com Odean, é como se fechássemos o triângulo canônico das Finanças Comportamentais.

A conversa entre Rodolfo e Odean reforçou uma ideia minha antiga. Contrariando os manuais de gestão corporativa, inclusive muitos deles amados na Faria Lima, sempre critiquei a ideia da “ditadura do argumento”. Executivos e empresários se orgulham de, em suas corporações, não haver necessariamente uma vitória do chefe nos embates de ideias. “Se um subordinado tiver o melhor argumento, ele pode sair vencedor de um debate.” Ocorre que, como muito bem demonstrado por Persio Arida e Deirdre McCloskey, quem ganha um debate não é necessariamente a melhor teoria ou ideia, apenas aquela com as melhores regras de retórica. Se você for melhor orador, leva, ainda que seu argumento seja, na verdade, mais fraco. Lembro de Schopenhauer e sua defesa de como ganhar um debate sem ter razão.

Em determinada hora da conversa, Rodolfo e Odean falam das criptomoedas. Por que é tão difícil corrigir potenciais anomalias com criptomoedas?

Ora, se estamos no campo do intangível por natureza, a realidade nunca se impõe materialmente. Um fundo chamado “CUBA” pode subir bastante por conta de novidades amigáveis sobre Guantánamo, ainda que ele não tenha ligação alguma com Cuba. Ocorre a distorção, chegam as notícias da imperiosa realidade indicando a falta de relação com as coisas, e as cotas se ajustam para baixo. São meras anedotas para Eugene Fama. Agora, se falamos de uma hipótese intangível, de algo imaterial e não concreto, como a realidade vai se impor? Como lutar com uma ideia que só vai poder ser falseada, sei lá, daqui dez anos? 

Se não estamos no campo das possibilidades do falseacionismo popperiano, então aquilo não é ciência. É mera discussão de bar. Talvez por isso, entre outras coisas, seja tão difícil modelar as criptomoedas e identificar seu valor justo.

Curiosamente, vale raciocínio semelhante para os casos de growth investing. Para situações de value, você tem critérios tangíveis e materiais para comprovar uma ideia. “Essa empresa vale x vezes lucros ou patrimônio.” Você sabe o que é o lucro ou o patrimônio, pode medir aquilo. Aconteceu ou está prestes a acontecer. Agora, se você me fala que a empresa vai valer x vezes os lucros de 2030, basicamente eu não tenho muito como confrontar aquela ideia cientificamente. O lucro de 2030 pode ser qualquer coisa. O sujeito promete um lucro irreal, se escora em premissas irreais e aquela teoria não pode ser falseada pelos próximos oito anos.

Ainda mais impressionante é que o mesmo raciocínio pode valer para a atual situação fiscal brasileira. Os dados, em si, não são tão ruins. Ao contrário, a cada indicador fiscal anunciado, temos uma surpresa positiva. E não há entre os países mais relevantes alguém que tenha reduzido seu déficit primário de forma tão rápida quanto o Brasil em dois anos. O problema é justamente o medo de que venham novidades negativas adicionais sobre o rombo. Você não sabe onde para e quais as ferramentas da caixa de maldades. 

Conseguimos fazer conta e talvez até toleraríamos um rombo no teto de R$ 100 bilhões. Mas ninguém consegue transitar por um ambiente intangível, em que, a qualquer momento, pode pintar uma emenda parlamentar adicional, um aumento do fundo partidário, um novo “vale alguma coisa”, um subsídio para uma determinada corporação.

Tudo que precisamos neste momento é uma demonstração concreta e objetiva de que não teremos aumento permanente da despesa pública, além do já anunciado, em 2022. Contra os tangíveis R$ 100 bilhões de rombo, conseguimos lutar concretamente. Sem a certeza de alguma âncora fiscal, os preços dos ativos continuarão afundando, desancorados por construção.

Sobre o autor

Felipe Miranda

CIO e estrategista-chefe da Empiricus, é ex-professor da FGV e autor da newsletter Day One, atualmente recebida por cerca de 1 milhão de leitores.

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