Day One

O paradoxo da ignorância

“Mark Twain foi um bem-sucedido escritor americano, conhecido por obras como […]”.

Por Larissa Quaresma, CFA

19 jul 2022, 10:29 - atualizado em 19 jul 2022, 10:29

O paradoxo da ignorância
Fonte: Free Pik

“Não é o que você desconhece que te coloca em apuros. É o que você sabe ‘com certeza’, mas que, na realidade, não sabe.” 
Mark Twain

Mark Twain foi um bem-sucedido escritor americano, conhecido por obras como “As Aventuras de Tom Sawyer”. O que poucos sabem é do seu lado investidor, em que o escritor usava seu nome verdadeiro: Samuel Clemens. Mark Twain era o pseudônimo que Samuel usava para escrever.

Twain foi um dos escritores mais bem-pagos da sua geração, mas isso não era suficiente. Samuel Clemens, o investidor, expôs seu patrimônio a riscos consideráveis na busca de fazer seu nome nos investimentos também. Suas maiores apostas foram em empresas nascentes e donas de “grandes invenções”, ou no que chamaríamos de start-ups hoje.

Por vários anos, Clemens investiu pesadamente na Paige Typesetter, uma máquina que prometia revolucionar a forma de imprimir jornais. Uma vez que a invenção estivesse pronta, seria muito mais rápida que sua principal competidora. Uma vez que estivesse pronta. O problema é que a máquina nunca ficou pronta. No começo, Samuel Clemens chamou o empreendedor de “o Shakespeare da invenção mecânica”, para depois desejar que nunca tivesse o conhecido, diante dos prejuízos que havia lhe causado.

Não existe o próximo Shakespeare dos negócios. Nenhum empreendedor é tão bom a ponto de passarmos vários anos investindo nele sem ter nenhum retorno. O que existe é uma estimativa de valor justo da empresa, que deveria ser o limite do que estamos dispostos a pagar por ela. Se ela está sendo vendida por menos do que isso, você compra. Se não, você vende.

Esse processo, que aliás usamos na Carteira Empiricus, exige alguma paciência para entrar nos detalhes de cada empresa. E Samuel nunca teve essa virtude. Ele não se importava com os pormenores.

A Paige Typesetter foi apenas uma das várias apostas malsucedidas que Clemens fez durante os pouco mais de 10 anos em que passou investindo. Nesse período, ele falhou em praticar a sua própria máxima, que abriu esse texto: reconhecer a própria ignorância. Twain era um excelente escritor, mas um mal investidor. Ele errava a grande maioria das apostas e, pior, errava grande.

Nas suas últimas, Samuel Clemens processou um dos empreendedores em que havia apostado, na tentativa de reaver parte do dinheiro investido. Durante a audiência, o juiz perguntou-lhe se aquela era a primeira vez que foi enganado. Ele respondeu: “Não, roubaram-me mais dinheiro do que há no planeta”. 

Então, fez uma pausa. 

“Não devo dizer que fui roubado de todo o dinheiro”.

“A maior parte foi perdida por maus negócios. Sempre fui ruim nos negócios.”

Já era tarde demais para reconhecer a própria ignorância: o escritor já havia perdido quase toda sua fortuna investindo de forma inadequada. 

Samuel Clemens deveria ter aceitado, desde o início, que sua melhor versão era Mark Twain.

Um abraço.

Sobre o autor

Larissa Quaresma, CFA

Analista de ações há 10 anos, é responsável pela série As Melhores Ações da Bolsa e pela carteira mensal Empiricus 10 Ideias, além de integrar a equipe da Carteira Empiricus, o portfólio multimercado da casa. Ao longo da carreira, teve passagens pela Núcleo Capital, tradicional fundo de ações brasileiro, e pelo Credit Suisse. Administradora formada pelo Ibmec-MG, aluna visitante da Stanford University e com certificações CFA, CNPI e CGA.