Respeitando a praxe dos fechamentos de mês, o indicador macro mais aguardado da semana deveria ser o PCE americano, agendado para sexta-feira (30).
Mas suponha que o RH te obrigue a pegar um dia de descanso, isolado do mundo. Por algum motivo idiota, você só pode escolher quarta-feira ou sexta-feira; e aí, o que você escolhe?
Hoje é dia de resultado da Nvidia (NVDC34), e isso muda tudo.
Tempos atrás, apenas os acionistas de Nvidia estariam interessados nos números da empresa.
No entanto, desde o início de 2023, o evento foi ganhando contornos sistêmicos, para agora se tornar um dos marcos obrigatórios do calendário financeiro universal.
Há uma discussão legítima e profunda sobre se Nvidia é ou não uma meme stock, amarrada no debate sobre o próprio conceito de meme stock.
Na versão mais superficial, em que as meme stocks são catapultadas tão somente pelo frenesi das redes sociais, Nvidia não se encaixa muito bem.
Já conforme a provocação moderna de que o valor metonímico de uma ação pode superar em várias vezes seu valor intrínseco, a definição cai como uma luva.
No caso, a empresa parece sintetizar não apenas o entusiasmo técnico com a inteligência artificial, mas toda uma esperança de que as coisas chatas do mundo possam ser 100% terceirizadas (ao menos até percebermos que essas coisas chatas ajudam a dar sentido à vida).
E isso não é para dizer que aqui não existe valor intrínseco, pois certamente existe. O crescimento dos resultados é impressionante, e a capacidade de bater guidances ambiciosos também demanda respeito para com a “tese fundamentalista” de Nvidia.
Porém, não deixa de soar estranho que o evento mais importante do calendário seja o resultado trimestral de uma única empresa, qualquer que ela seja.
Desde que o ChatGPT ganhou publicidade ampla, em novembro de 2022, a capitalização de mercado de Nvidia aumentou em mais de 3 trilhões (!) de dólares.
Como consequência, a ação passou a responder por 6,5% do peso do S&P 500, pisoteando qualquer outro recorde histórico de guinada instantânea rumo ao topo.
Isso não é uma maluquice?
Imaginar que, daqui a um ano, um ticker hoje desconhecido pode vir a ser uma das forças determinantes por trás do principal índice de ações do mundo?
E, se isso é verdade, o oposto pode ser verdade também. Quem é grande pode desaparecer em questão de minutos.