Day One

Papo com Howard Marks, hoje, às 13h30

Este Day One é um convite. Só um aperitivo para o que vai acontecer hoje, às 13h30.

Por Felipe Miranda

19 abr 2021, 01:23

Este Day One é um convite. Só um aperitivo para o que vai acontecer hoje, às 13h30.
 
Nesse horário, converso com Howard Marks, da Oaktree e uma das maiores referências em investimentos do mundo. Se você precisa de argumentos para acompanhar a conversa pois não conhece o Howard, talvez eu possa recorrer ao argumento de autoridade: Warren Buffett já disse que, quando identifica a chegada dos memorandos de Howard Marks em sua caixa de e-mail, para o que está fazendo para lê-los. Se até o Buffett encontra uma brecha na agenda, vale o nosso esforço.
 
Registro publicamente meus agradecimentos aos craques da Itajubá, que viabilizaram esse bate-papo.
 
Tenho um apreço especial pelas ideias dele. Talvez lhe soe oportunista essa afirmação neste momento. Eu não o julgaria por isso. Mas, com um pouco mais de afastamento, poderíamos recuperar seu nome em vários Day Ones anteriores. Howard Marks também é citado várias vezes no meu último livro.
 
Noto uma coisa rara nele: Howard tem preocupação epistemológica com sua abordagem de investimento. Quando leio seus livros e memorandos, sinto como se ele estivesse reunindo as ideias de Warren Buffett e Nassim Taleb — esse é, inclusive, um dos tópicos sobre os quais pretendo falar com ele. Howard fala da importância de sempre se comparar preço com valor intrínseco, calculado de maneira parcimoniosa. Ao mesmo tempo, ele discorre com frequência sobre imprevisibilidade, complexidade, incerteza. Entre seus memorandos mais recentes, estão “Something About Value”, o que mostra sua natureza buffettiana, e “You Can’t Predict. You Can Prepare”, denotando sua veia talebiana. 
 
Eu, Felipe, costumo dizer que minha tentativa pessoal como investidor/analista é, grosseiramente (me desculpe por isso), juntar as ideias de Buffett e Taleb. Sempre achei essa convergência mecanicista e vitoriana do preço atual para o valor intrínseco como algo excessivamente simplificador, como se pudéssemos precisar esse tal valor intrínseco de maneira científica, replicando um instrumental da Física ou de outras ciências naturais. Alguém já esbarrou com esse sujeito chamado “Valor Intrínseco” por aí? Eu nunca vi mais gordo. 
 
A questão central é que o valor intrínseco, se formos pensar friamente, não é um parâmetro, mas, sim, uma variável, de distribuição de probabilidade com variância infinita. Temos um valor intrínseco para cada cenário prospectivo possível — e temos uma infinidade de cenários prospectivos possíveis. Entregue o cenário futuro, eu lhe devolvo o preço-alvo! Mas quem poderá conhecer o cenário? Por favor, se você o tiver, envie à portaria da Empiricus.
 
Como viver num mundo que não entendemos direito? Essa é a grande pergunta para um leitor de Nassim Taleb. A complexidade e a incerteza não podem ser confundidas com uma postura niilista sobre investimentos, como se nada houvesse a ser feito. 
 
O bom investidor sabe de suas fraquezas. Esse é o seu principal mérito. Ele conhece as sutilezas e as fragilidades das estimativas do valor intrínseco, não esperando essa convergência mecanicista da cotação atual para essa projeção.
 
Usamos todo o instrumento buffettiano clássico não para identificar cirurgicamente qual é esse tal valor intrínseco. Mas, simplesmente, para comprar num preço tentando nos certificar de que as surpresas à frente (não se engane: elas vão ocorrer) estarão do lado positivo. 
 
As cotações já estariam tão depreciadas que incorporariam a maior parte das futuras possibilidades negativas. Minimizamos o espaço para novas quedas, aumentamos os ganhos potenciais. Muito mais a ganhar do que a perder, assimetria convidativa. É a essência da antifragilidade de Nassim Taleb. Nada mais é do que um jeito diferente de se olhar para a “margem de segurança” de Seth Klarman, outro value investor clássico.
 
Essa veia epistemológica de Howard Marks desemboca em outra lição muito interessante, rara entre os value investors mais tradicionais. Ele tem uma preocupação recorrente com o risco. Até aí, nada de novo. O ponto é: como você mede risco? Risco tem a ver com a chance de as coisas não irem conforme o esperado, certo?
 
O mercado financeiro costuma medir risco a partir da volatilidade, pelo desvio-padrão da variável em análise. Já estamos bem grandinhos para sabermos se tratar de uma bobagem. Está na clássica parábola do Peru de Natal de Bertrand Russell, apropriada por Taleb e traduzida como “falácia do granjeiro” no “Trópicos Utópicos”, de Eduardo Giannetti. De maneira mais simples: qual era a volatilidade das torres gêmeas americanas no dia 10 de setembro de 2001? Ou mais perto da nossa realidade: qual era a volatilidade das ações de distribuidoras de energia às vésperas da MP 579, da nossa criativa ex-presidente Dilma?
 
Se você se guiar pela volatilidade para medir o risco da sua carteira, você vai se dar mal. Não é uma hipótese. É quase uma lei física. A supressão da volatilidade apenas empurra para baixo do tapete os verdadeiros riscos. Aumentam os riscos escondidos, que são os piores. Ninguém escorrega na casca de banana vista ali na frente. O risco mesmo é sobre o que está oculto, não mapeado. A calmaria antes da tempestade. A volatilidade é um mecanismo de revelação da verdade. Não devemos fugir dela.
 
Alguns diriam que o risco só pode ser conhecido a posteriori, depois do ocorrido. Mas a situação é ainda pior. Nem assim ele pode ser devidamente conhecido.
 
Em cenários de complexidade e incerteza, precisamos falar, necessariamente, de distribuição de probabilidades de ocorrência. É uma tautologia. Se há incerteza, não há certeza. Logo, só há probabilidade. Em casos assim, se um avião cai, qual era o risco de o avião cair? Jamais saberemos. Depois do ocorrido, a probabilidade vira 100%. Mas e antes, que é quando interessa?
 
Qual o risco de chover forte amanhã? Você pode me falar 50%. E se chover, você estava certo? Não sabemos. A História nunca vai nos contar qual era a distribuição de probabilidades. Ela só vai narrar o que aconteceu de fato.
 
Muito mais do que uma medida em si, risco é sobre controlar o downside, sobre considerar a ocorrência de coisas bem ruins, mesmo que não consigamos vislumbrar quais serão exatamente essas coisas. 
 
Como diz Howard Marks, você não pode prever. Mas você pode se preparar. Uma das melhores formas de preparação é ouvir pessoas melhores do que a gente. Que tal começar hoje às 13h30?

Sobre o autor

Felipe Miranda

CIO e estrategista-chefe da Empiricus, é ex-professor da FGV e autor da newsletter Day One, atualmente recebida por cerca de 1 milhão de leitores.