“Os maiores prazeres estão separados
do desgosto por uma linha muito tênue”.– Marcus Tullius Cicero
Um dos conceitos mais perigosos em Economia é o de “ceteris paribus”.
A expressão latina era (sabiamente) usada por Cícero na Roma Antiga de maneira intuitiva, não-técnica.
Cícero gostava de experimentar com análises de causalidade nas quais apenas um fator é evidenciado, tentando deduzir seus efeitos específicos.
Assim, frequentemente traduzimos o ceteris paribus como “tudo o mais constante” ou “mantidas inalteradas todas as outras coisas”.
Tudo o mais constante – Cícero escreveu em seu famoso ensaio sobre o novo versus conhecido -, gostamos sempre de montar o cavalo a que estamos acostumados, aquele que cavalgamos há mais tempo. Agora, se esse cavalo estiver machucado, violamos o ceteris paribus e passamos a preferir uma outra montaria.
As Ciências Naturais foram as primeiras a emprestar a ideia de Cícero, com grande sucesso.
No mundo hermeticamente controlado de um laboratório de Física ou Química, é mais fácil estabilizar n-1 parâmetros, observando o efeito exclusivo do enésimo parâmetro a se mexer.
Com inveja dos “cientistas de verdade”, os economistas decidiram levar o ceteris paribus para os laboratórios de econometria, jogando para baixo do tapete uma série de fragilidades estatísticas.
No dia a dia do mercado, o problema se torna ainda maior.
À medida que as narrativas financeiras se impõem, elas assumem o status de WYSIATI (vide Kahneman), mantendo retoricamente inalteradas todas as outras coisas.
Perdemos a capacidade de encarar o tabuleiro como um jogo de múltiplos parâmetros maleáveis, e passamos a focar em uma única peça de xadrez (o cavalo?).
Em determinado momento, talvez essa peça seja a melhora fiscal, a reforma tributária ou um novo ciclo de corte da Selic.
Mas, de repente, enquanto olhamos para frente, vestidos pelo cabresto do ceteris paribus, somos atropelados lateralmente por uma ameaça de recessão na China, alta adicional da Fed Funds Rate, ou por qualquer outra coisa que a realidade se esqueceu de travar.
Por isso, ainda que haja momentos propícios a dobrar a aposta e “ir para a jugular do mercado” (usando a sábia expressão de Druckenmiller), devemos saber dosar essas decisões para que o mercado também não venha em nossa própria jugular.