Quando Vicente Feola, técnico da nossa seleção campeã em 1958, apresentou aos seus comandados sua complexa jogada ensaiada, que pressupunha uma série de reações dos então favoritos soviéticos (sempre eles), o craque Garrincha, entre inocente e provocador, perguntou:
“Tá legal, seu Feola, mas o senhor combinou tudo isso com os russos?”
Não imagino que Putin tenha recebido o mesmo questionamento quando mostrou seu plano aos comandantes.
Como escrevi na newsletter de 24 de fevereiro, “Guerra e Paz”, nas guerras, via de regra, sabe-se como começa, mas desconhece-se como termina. Com duas semanas completas, a invasão da Ucrânia nos dá a impressão de ter começado há muito mais tempo.
Seguimos inundados pelo fluxo constante de notícias, reverberadas e amplificadas nas redes sociais, que cobrem as diversas dimensões do conflito.
Na edição do Palavra do Estrategista desta semana, “Invasões Bárbaras: a queda do Império Americano” (imperdível, por sinal), o Felipe fez referência à névoa da guerra (“the fog of war”), do estrategista militar prussiano Carl von Clausewitz, para expressar a inerente dificuldade em prever os próximos lances de um conflito armado.
Por mais arguto que seja, dada sua carreira de agente da KGB, Vladimir Putin provavelmente não antecipava a duríssima reação do Ocidente, com suas severas sanções econômicas, muito menos esperava o êxodo sem precedentes das empresas privadas, pressionadas pela opinião pública.
Assim como num jogo de xadrez, modalidade dominada justamente pelos russos, como lembrou nosso consultor Rodolfo Castro, contribuinte do Palavra do Estrategista, ganha a guerra aquele com melhor capacidade de prever as reações do oponente às suas próprias ações.
Diferente de uma briga de rua, cuja unidimensionalidade implica na simples subjugação do oponente, uma guerra envolve um constante processo de negociação, onde cada movimento sinaliza avanço ou distanciamento de uma resolução acordada.
Desde antes do início da guerra, os mercados nervosamente já trabalhavam com as repercussões do conflito.
Como reação natural ao aumento da incerteza, ampliou-se o movimento de “risk-off” que já havia sido iniciado com as perspectivas de aumento das taxas de juros, especialmente nos Estados Unidos, diante da maior inflação vista nos mercados desenvolvidos desde o início dos anos 1980.
Com a guerra colocando ainda mais combustível para as pressões inflacionárias, com commodities sendo negociadas a preços recordes, os bancos centrais se veem numa sinuca de bico, pois o necessário aperto monetário parece menos bem-vindo no atual cenário de guerra.
Com um setor externo e uma Bolsa dominada por commodities, o Brasil tem tido um comportamento relativamente positivo.
Quem poderia prever, no início do ano, um dólar a R$ 5, especialmente se soubesse da confusão geopolítica que entraríamos?
Contribuindo para a estabilidade da moeda, claro, está a atuação do nosso Banco Central, que, diferentemente de seus pares internacionais, vem praticando uma vigorosa política de juros reais positivos.
De certa forma, o investidor individual brasileiro hoje tem uma situação relativamente confortável quando comparado aos americanos, posto que lá as aplicações em renda fixa garantem uma perda contratada contra a inflação, especialmente num horizonte de curto prazo.
Para nós, enquanto a névoa da guerra não se dissipa, a prudência neste momento está sendo bem remunerada.
Deixo você agora com os destaques da semana.
Boa leitura e um abraço,
Caio
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