Com 245 metros de comprimento, o Hindenburg era mais longo do que três Boeings 747 enfileirados.
Considerado a maior aeronave já construída, o dirigível construído pela empresa alemã Zeppelin teve vida breve e um fim trágico, no famoso acidente de 1937, que vitimou 36 pessoas.
Aos olhos modernos, a ideia de atravessar o oceano a bordo de um balão parece absurda. Na década de 30 do século passado, porém, era a maneira mais rápida de viajar entre continentes.
Ricos de ambos os lados do Atlântico adotaram a novidade de maneira rápida e entusiasmada. Em vez de gastar uma semana a bordo de um navio, passageiros atravessavam o oceano em cerca de três dias, desfrutando de serviços e acomodações equivalentes a um hotel cinco estrelas.
Curiosamente, o Brasil foi o principal destino dos voos que partiam da Alemanha, já que os americanos resistiam à origem alemã da aeronave, ainda por conta do rescaldo da Primeira Guerra Mundial.
No total, o Graf Zeppelin, o antecessor do Hindenburg, viajou 177 vezes ao Brasil. Tal frequência exigiu a construção de um aeroporto no Rio de Janeiro, o Bartolomeu de Gusmão, com toda a estrutura necessária para receber e abrigar o colosso.
A atual Base Aérea de Santa Cruz, da Força Aérea Brasileira, está localizada onde outrora estava o Bartolomeu de Gusmão. Inclusive, o monumental hangar que abrigava os dirigíveis ainda é utilizado para armazenar os aviões da FAB. No Recife, até hoje pode-se visitar a torre de atracação do atracamento do dirigível, preservada no Parque do Jiquiá.
Hangar do Zeppelin, onde ficava o Hindenburg, na Base Aérea de Santa Cruz (Ala 12) |
Antes de sua destruição num pouso em Nova Jersey, nos Estados Unidos, o próprio Hindenburg chegou a realizar algumas viagens aqui para o Brasil. Portando a suástica nazista em sua cauda, a aeronave realizou voos de exibição em cidades como São Paulo (lembro do meu avô comentando a maravilha de ter visto aquele gigante nos ceús), Curitiba e algumas cidades do Sul com colonização alemã.
O curto domínio do Hindenburg chegou ao seu ocaso em 6 de maio de 1937 quando, ao chegar à base aérea naval de Lakehurst, o dirigível pegou fogo a partir de um incêndio iniciado em sua cauda, provavelmente causado pela descarga elétrica de um raio. A alto poder inflamável do gás hidrogênio fez com que a aeronave fosse reduzida quase que instantaneamente a cinzas.
Esta semana, um outro Hindenburg ocupou os noticiários, desta vez financeiros, mexendo com os alicerces do grupo econômico mais poderoso da Ásia.
O Hindenburg da vez, a Hindenburg Research, é uma pequena firma de trading e análise (tem cerca de 10 colaboradores) cujo foco está em analisar, identificar e se posicionar contra empresas – e suas ações – envolvidas em fraude. Seu modo de operar é chamado de forensic research (pesquisa forense) e está baseado em um profundo trabalho de investigação em cima de potenciais esquemas fraudulentos que visam lesar investidores.
No ano passado, a firma liderada por Nathan Anderson, desmascarou Trevor Milton, fundador e CEO da Nikola Motors, fabricante de carros elétricos, cujas mentiras e manipulações causaram enormes prejuízos aos investidores. A partir do trabalho de Hindenburg Research, Trevor Milton terminou sendo condenado por fraude, aguardando no momento sua sentença final, que pode chegar a até 25 anos de reclusão.
Agora, o alvo da vez da Hindenburg Research é o Adani Group, do multibilionário indiano Gautam Adani, nada menos do que o quarto homem mais rico do mundo e o mais rico da Ásia.
Em um relatório de 106 páginas, fruto de dois anos de trabalho investigativo, a Hindenburg Research acusa o Adani Group de um imenso esquema de manipulação de mercado e fraude contábil, com décadas de práticas nocivas.
O peso das acusações fez com que o Adani Group perdesse cerca de 50 bilhões de dólares em valor de mercado em poucas horas de pregão, quase um quarto de sua capitalização total antes da publicação do relatório. Gautam Adani, por sua vez, ficou 20 bilhões de dólares menos rico. Foi a maior e mais rápida destruição de valor na história dos mercados de capitais asiáticos.
Como é típico de acusados de fraude, o grupo indiano negou veementemente todas as acusações e ameaça processar judicialmente a empresa de research, tanto nos Estados Unidos como na Índia. Apesar da retórica violenta do contra-ataque, o grupo indiano ainda não apresentou uma resposta sequer às 88 perguntas formuladas pela Hindenburg Research em seu relatório.
Interessante a coincidência de ver, quase que simultaneamente, empresas dos maiores bilionários dos seus respectivos países, Adani na Índia e os 3Gs no Brasil, envolvidas em acusações gravíssimas de conduta fraudulenta em suas empresas.
No caso da Americanas, os seus ex-controladores ainda mantêm o discurso, pouco crível, de que nada sabiam. Custa muito acreditar que o então CEO Sérgio Rial tenha sido capaz de descobrir, em poucos dias, o que os mais experientes financistas do País não viram durante anos.
Independentemente do desfecho final, a inacreditável queda da Americanas, que chegou a ter um valor de mercado de quase 100 bilhões de reais há cerca de dois anos, lembra a rapidez com que o Hindenburg foi destruído.
Em retrospecto, começa a ficar claro que o frágil modelo de negócios da empresa somente conseguiu produzir resultados “positivos” por conta de uma contabilidade muito além de criativa.
Caso não apresentem respostas rápidas e claras sobre o que acontecia na empresa, a reputação e a biografia dos 3Gs parecem ter também um destino similar ao do dirigível alemão.
Deixo você agora com os destaques da semana.
Boa leitura e um abraço.