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O melhor ataque é a defesa

“A poucos dias da estreia do Brasil na Copa, fica cada vez mais difícil não tratar do tema […]”.

Por Caio Mesquita

21 nov 2022, 07:04 - atualizado em 21 nov 2022, 08:42

O melhor ataque é a defesa
Imagem: Freepik

A poucos dias da estreia do Brasil na Copa, fica cada vez mais difícil não tratar do tema.

Além do mais, o recente desarranjo nos mercados domésticos, por conta das incertezas quanto à gestão econômica do próximo governo, nos dá poucos motivos para nos animar, pelo menos no curto prazo.

Apesar de gostar e acompanhar futebol, naturalmente não tenho o mesmo envolvimento que antes, espacialmente com a Seleção Brasileira.

Além dos nomes mais conhecidos, confesso dificuldade em elencar os prováveis jogadores titulares do escrete canarinho. E, diante da escalação, confesso que não sei apontar com precisão em quais clubes atualmente jogam.

Nesta Copa, porém, estou revivendo o entusiasmo pela competição através dos meus filhos. Depois de completarem os seus respectivos álbuns de figurinhas, nos quais devo ter colado pelo menos metade dos cromos, a criançada está contando os dias para o pontapé inicial.

David, caçula e único menino da prole, está especialmente envolvido e me garante que o Hexa vem desta vez – “afinal, papai, somos os melhores do mundo, os únicos com cinco estrelas bordadas no escudo”.

A Seleção já ocupou um espaço maior no meu coração. Tive o privilégio de ter assistido presencialmente duas finais de Copa do Mundo com o Brasil presente e, na primeira, comemorei o título abraçado com os meus pais naquela calorenta e inesquecível tarde californiana no Rose Bowl.

Apesar de não termos ido à final, de todas as Copas que acompanhei, a mais marcante porém foi mesmo a de 1982, não só a mim mas provavelmente à toda minha geração.
Com o envolvimento genuíno que somente a tenra idade permite, envolvi-me de corpo e alma na torcida por aquele time mágico montado por Telê Santana.

Embalado pelo tema “Voa Canarinho”, hit do lateral-cantor Junior “Capacete”, o Brasil de 82 só tinha olhos para o encantador toque de bola daquele time que finalmente resgatava nosso futebol-arte, após tentativas fracassadas de adotar a força como atributo principal nas versões de 74 e 78.

“Waldir Peres, Leandro, Oscar, Luisinho e Júnior, Cerezo, Falcão, Sócrates e Zico, Serginho e Éder – com entradas pontuais de Paulo Isidoro, Dirceu e Batista”. Até hoje dispenso o Google para recordar o inacreditável elenco de craques.

Como se sabe, o sonho do tetra, meu e de outros milhões de adolescentes da época, foi dramaticamente adiado naquele dia que ficou conhecido como a “Tragédia de Sarriá”, com os 3 gols do italiano Paolo Rossi mandando nossos ídolos de volta para casa, muito mais cedo do que gostaríamos.

Em 1982, a Copa tinha um formato diferente, com a segunda fase sendo disputada em quatro grupos de três, com somente o vencedor de cada grupo passando para a semifinal. Antes do confronto, Brasil e Itália venceram a então campeã Argentina, mas fizemos um saldo melhor de gols. Assim, nos bastava um empate para vencer o grupo.

Essa vantagem inicial nos daria uma posição confortável de jogar no erro da Itália, com o contra-ataque a nosso favor. Infelizmente, isso acabou logo de cara, com o gol aos 5 minutos do adversário.

Conseguimos empatar logo depois, mas em seguida, aos 25 do primeiro tempo, os italianos recuperaram novamente a vantagem.

Mais uma vez, coube ao Brasil o esforço de virar um placar que não era seu. O alívio finalmente chegou aos 23 minutos do segundo tempo, quando Falcão acertou uma bela canhota na entrada da área, empatando a partida.

Até hoje tenho gravado na memória a visão das veias saltadas nos braços do meio campista em sua efusiva comemoração, enquanto eu comemorava o empate com meus amigos de oitava série em uma churrascaria em Curitiba, a caminho de uma excursão a Foz do Iguaçu.

Falcão comemorando o empate no Sarriá

O resultado vantajoso, porém, acabou em um escanteio com Junior (o mesmo do “Voa, Canarinho”) plantado no poste direito de Waldir Peres, dando assim condição para Paolo Rossi colocar novamente, e irreversivelmente, os italianos à frente do placar.

Algumas décadas depois, aquela derrota ainda ressoa nos corações de uma geração.

Com o tempo, porém, alguns aspectos ficam mais claros, pondo luz à traumática derrota.

Se de um lado tínhamos um belíssimo poder de criação, o mesmo não pode ser dito da nossa contenção. Combinávamos dois laterais apoiadores com um meio de campo sem marcadores natos. Para piorar, nossos técnicos zagueiros careciam de certa combatividade e o goleiro estava inseguro desde sua grotesca falha na estreia contra a União Soviética.

Na frente, também, havia deficiências.

Serginho, o Chulapa, era um voluntarioso centroavante de clube, mas muito distante do nível dos seus colegas de equipe. Talvez a história tivesse sido outra se Careca não tivesse se machucado às vésperas da convocação.

Do outro lado, tinha o fortíssimo esquadrão italiano. À época não dávamos o devido crédito, especialmente depois da sofrível campanha sem vitórias na fase inicial.

O time comandado por Enzo Bearzot combinava, com fineza, equilíbrio defensivo e força ofensiva. Começando com Dino Zoff no gol, passando por Scirea e Cabrini na defesa e Gentile na volância, chegando ao meio de campo com Tardelli e Altobelli. Isso sem falar no letal Paolo “Bambino d’Oro” Rossi.

A força deste time foi comprovada com os subsequentes e convincentes vitórias na semifinal e final, contra Polônia e Alemanha Ocidental respectivamente.

Voltando aos investimentos e economia, cabe aqui alguns paralelos com o momento que vivemos hoje no Brasil.

É inegável que convivemos com níveis inaceitáveis de pobreza e, assim, é nosso dever como sociedade envidar os maiores esforços para diminuir o sofrimento daqueles que precisam.

O afã da esquerda é focar nos sintomas e não nas causas. Dizer que a estabilidade social está acima da fiscal é lançar-se numa aventura perigosa que certamente termina mal.

Jogar-se ao ataque sem uma defesa equilibrada é uma receita comprovada de fracasso para equipes que aspiram a vitórias e títulos.

Da mesma forma, imaginar que a distribuição de recursos sem origem como contrapartida pode até gerar algum alívio no curto prazo mas nos torna frágeis e vulneráveis no longo prazo.

Com o fim do teste de gastos, resta-nos torcer, além do sucesso da nossa Seleção na Copa, para que bom senso prevaleça e que seja substituído por um novo mecanismo que defenda nossa estabilidade.

Afinal, como aprendemos em 1982, o melhor ataque é a defesa.

Deixo você agora com os destaques da semana.

Boa leitura e um abraço.

Sobre o autor

Caio Mesquita

CEO da Empiricus