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Pecado capital

Ele era um cidadão exemplar. Tímido e reservado, traços comuns em asiáticos, ele conduzia sua vida de forma absolutamente modesta. 

Por Caio Mesquita

10 abr 2021, 01:53

“Overkill, enough is enough
There’s nothing left of me to devour
You’ve had your fill, I’m all I have left
What can stop your hunger for power?”

The Ultimate Sin – Ozzy Osbourne

 

Ele era um cidadão exemplar.

Tímido e reservado, traços comuns em asiáticos, ele conduzia sua vida de forma absolutamente modesta. 

Dono de uma fortuna bilionária, morava no subúrbio e fazia questão de dirigir sua SUV Hyundai todos os dias ao escritório.

Sempre levando às costas uma surrada mochila, ele tinha na japonesa Uniqlo, conhecida por seus preços ultraeconômicos, sua marca de roupas favorita.

Ele tinha a ética de trabalho dos incontáveis imigrantes que deixaram suas casas para “fazerem a América”.

Partiu da Coreia do Sul em 1982 junto com a sua mãe viúva.

Excelente aluno, recebeu seu diploma universitário pela renomada Universidade da Califórnia (UCLA) e tornou-se MBA pela Carnegie Mellon de Pittsburgh, conhecida por seu currículos com ênfase em matérias quantitativas. 

Uma vez formado, mudou-se para Nova York, realizando seu antigo sonho. Depois de duas passagens como vendedor em corretoras, juntou-se ao lendário Fundo Tiger como analista de investimentos.

Exceto por uma investigação da Securities and Exchange Commission, a CVM dos Estados Unidos, acusando-o de insider trading e que resultou no pagamento de US$ 60 milhões, ele sempre conduziu sua vida acima de qualquer suspeita. 

Extremamente religioso, criou uma fundação destinada a apoiar diversas causas cristãs. Na sua sede em Manhattan, ele pessoalmente conduzia três leituras semanais de passagens bíblicas.

Sua firma de investimentos seguia a escola do Fundo Tiger, fundamentando suas decisões em um research profundo e detalhista.

A estratégia estava baseada em selecionar ações com fortes teses de investimentos, muitas delas do ramo de tecnologia. Entre suas escolhas bem-sucedidas destacam-se Netflix, Facebook e LinkedIn. Outra escolha sua que rendeu excelentes retornos foi a Alphabet, holding do Google. Ele acreditava que a empresa era amada por Deus, já que fornecia a “melhor informação a todos”.

O personagem descrito acima ocupou as manchetes do noticiário financeiro dos últimos dias. 

Bill Hwang, ou Sung Kook Hwang, foi protagonista da mais rápida destruição de um patrimônio individual de que se tem notícia. Sua líquida fortuna de US$ 20 bilhões evaporou-se em menos de 48 horas.

 

A causa do colapso de sua firma de investimentos Archegos é um tema pouco entendido e raramente explicado aos investidores individuais, especialmente aqui no Brasil.

Alavancagem.

Para cada US$ 5 investidos por Bill Hwang, apenas US$ 1 era seu. O restante era emprestado de bancos, entre os quais figuravam os principais de Wall Street. 

As posições alavancadas por dívida amplificam os retornos obtidos na valorizações dos ativos. Em contrapartida, perdas são multiplicadas quando comparadas com desvalorizações sem o uso de dívida.

Tomando o caso de Bill Hwang como exemplo, de uma maneira simplificada, se sua carteira subisse 20%, isso implicaria uma valorização de 100% sobre o seu capital próprio.

Funcionava assim: Bill colocava US$ 20 do seu bolso e tomava mais US$ 80 emprestados. Com isso, comprava uma ação de US$ 100. Com uma alta de 20%, a ação comprada por Bill passava a valer US$ 120. Como seguia devendo os mesmos US$ 80 ao banco, sua posição líquida passava a ser de US$ 40, nada menos do que o dobro que investira.

Por outro lado, seu investimento viraria pó se a mesma ação caísse 20%, pois o que restasse seria suficiente apenas para pagar o banco e mais nada.

Operações de alavancagem são extremamente rentáveis a bancos e corretoras. Assim, você raramente ouvirá deles os devidos alertas e avisos.

Certa vez, Warren Buffett disse:

“Só há três modos de uma pessoa inteligente quebrar: bebida, mulheres e alavancagem.”

Com sua vida modesta, Bill Hwang desmoronou da única maneira que lhe era possível.

Deixo você agora com os destaques da semana.

Um abraço e boa leitura,
Caio

Sobre o autor

Caio Mesquita

CEO da Empiricus