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China diz que vai revidar tarifas ‘até o fim’, Ibovespa perde o fôlego e dólar sobe: fique por dentro do que move os mercados nesta terça-feira (8) 

O presidente Donald Trump deu até o fim da tarde de hoje (8) para que a China remova a tarifa de 34% imposta em retaliação às tarifas americanas de mesmo valor

Por Matheus Spiess

08 abr 2025, 09:29 - atualizado em 08 abr 2025, 09:31

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Imagem: iStock.com/narvikk

Os mercados financeiros viveram um verdadeiro carrossel de emoções ontem (7), impulsionados por rumores infundados sobre uma suposta suspensão de 90 dias nas tarifas comerciais impostas pelos EUA. A comoção revelou um problema maior: a política comercial errática da Casa Branca criou um ambiente propício para alarmes falsos, no qual qualquer boato reverbera com intensidade desproporcional. De um lado, a reação do mercado evidencia o caminho que o governo americano deveria seguir — um alívio tarifário imediato e abrangente. De outro, pode passar a mensagem equivocada de que dá para continuar esticando a corda sem consequências graves, já que os ativos globais parecem se recuperar com rapidez dos choques mais recentes.

Entre uma trégua ilusória e novas ameaças de retaliação, o impasse continua. O presidente Donald Trump deu até o fim da tarde de hoje (8) para que a China remova a tarifa de 34% imposta em retaliação às tarifas americanas de mesmo valor. Caso contrário, uma nova rodada será disparada: mais 50% de tarifa adicional, de forma cumulativa — o que elevaria a taxa total para espantosos 104%, se somarmos aos 20% já aplicados em março, sob o pretexto do tráfico de opioides. O degrau da escalada tarifária impressiona, e o jogo diplomático entra numa fase decisiva.

No entanto, há outras frentes que merecem atenção. O Japão deve ser o primeiro grande país a sentar-se com os EUA para negociar. Se esse diálogo sinalizar alguma abertura para acordos, os mercados podem encontrar estabilidade nas próximas semanas. De fato, os índices asiáticos encerraram o pregão de forma majoritariamente positiva, com destaque para as bolsas de Tóquio e Xangai. Taiwan e Indonésia, por outro lado, destoaram do tom mais otimista. Na Europa, os mercados tentam uma recuperação ainda tímida nesta manhã, refletindo a incerteza do cenário, mas aliviados — ao menos temporariamente — pela ausência de novos choques imediatos.

· 00:52 — Cortina de fumaça

No Brasil, os mercados continuam extremamente sensíveis ao cenário externo. Ontem, o Ibovespa chegou a ensaiar uma recuperação com os rumores de uma suposta trégua de 90 dias na guerra comercial global, mas bastou a narrativa perder força para que a bolsa voltasse a mergulhar, acumulando uma queda de 3,27% em apenas dois pregões. A busca por proteção empurrou o dólar para cima, que já está em R$ 5,91 novamente, num reflexo claro do aumento da aversão ao risco.

No front doméstico, o pessimismo foi amplificado por mais um capítulo da novela Petrobras (PETR4). Com o barril de petróleo em queda, puxado pelo receio crescente de recessão global, o governo aproveitou para intensificar a pressão sobre a estatal, insinuando — sem muita sutileza — uma nova rodada de cortes no preço dos combustíveis. Em outras palavras, a guerra comercial internacional não apenas serve como conveniente cortina de fumaça para a falta de direção clara no governo, como também pode, de quebra, ajudar a reduzir a inflação por vias externas. Claro que, com o dólar em disparada, a estratégia perde força — mas eles vão tentar mesmo assim.

Se der certo, esse mix de desinflação importada e pacotes de estímulo internos pode funcionar como colchão político, atenuando a queda de popularidade de Lula, que já vinha rondando seu piso. Para o mercado, no entanto, esse movimento é tudo menos animador. Afinal, quanto mais o governo conseguir se manter em pé artificialmente, menor a chance de que 2026 traga a esperada guinada na política econômica. Nem mesmo a aparente boa vontade do presidente da Câmara, Hugo Motta, ao propor discutir cortes nas emendas parlamentares como sinal de compromisso fiscal, foi suficiente para melhorar o humor local. O mercado quer ajuste de verdade…

· 01:42 — Volátil

Nos EUA, os mercados continuam presos à instabilidade crônica da guerra comercial. Depois da hecatombe da semana passada, quando trilhões evaporaram das bolsas em reação ao tarifaço, a segunda-feira (7) trouxe novo baque, interrompendo qualquer tentativa de retomada. E o mais irônico: bastou um rumor infundado sobre uma possível pausa de 90 dias nas tarifas para que, em questão de minutos, quase US$ 4 trilhões fossem magicamente “reacendidos” no S&P 500, como se toda a lógica de valuation pudesse ser reprogramada por uma manchete. Mas o suspiro durou pouco. A tensão já voltou à cena com o risco crescente de nova escalada protecionista.

Visto com alguma distância, o maior aumento tarifário de nossas vidas parece cada vez mais próximo de se concretizar — e, pior, sem um plano claro de reversão. É possível que parte dessas tarifas funcione como alavanca de negociação, e que, após as concessões desejadas, venha algum alívio. Mas isso pressupõe uma racionalidade que a política comercial atual parece ter abandonado. Se a maior parte dessas tarifas permanecer ativa por apenas nove meses, já será o suficiente para provocar estragos econômicos substanciais. E aí, não será boato de trégua que apagará o dano.

· 02:37 — Subiu o tom

O presidente Trump elevou novamente o tom na guerra comercial com a China, ameaçando impor uma tarifa adicional de 50% — o que, somado às taxas anteriores, pode levar a tarifa total contra os produtos chineses a inacreditáveis 104%. Tudo isso porque Pequim ousou retaliar com uma tarifa de 34% sobre importações dos EUA, respondendo à última rodada de provocações de Washington. Em resposta, o governo chinês classificou a ameaça como “um erro em cima de um erro” e prometeu “lutar até o fim”. O tom dramático não parou por aí: a Embaixada da China nos EUA chegou ao ponto de desenterrar um discurso de Ronald Reagan de 1987, no qual o então presidente criticava abertamente o protecionismo tarifário. A ironia histórica é irresistível. Aquela brincadeira que fiz ontem, sobre estarmos vivendo numa realidade alternativa na qual a China se transforma em defensora do livre comércio enquanto os EUA defendem tarifas e muros, está cada vez menos piada e mais diagnóstico.

Enquanto isso, outros países tentam, com graus variados de sucesso, manter algum diálogo com Washington. O Vietnã, um dos alvos mais penalizados pelas tarifas de Trump simplesmente por ter superávit comercial com os EUA — o novo critério mágico de “injustiça” —, ofereceu eliminar todas as tarifas sobre produtos americanos. A resposta? Peter Navarro, conselheiro comercial da Casa Branca, disse que isso ainda não era suficiente. Não ficou claro o que mais o Vietnã deveria fazer. A lógica é tão tortuosa que parece que até o governo perdeu o fio da meada, especialmente depois do impacto negativo nos mercados.

Já a União Europeia, tentando demonstrar boa vontade, propôs um acordo de “tarifa zero por tarifa zero” para produtos industriais. Nem isso adiantou. A recusa americana deve agora empurrar os europeus para o campo das retaliações. Em resumo: a disposição da Casa Branca para negociar parece diretamente proporcional ao grau de caos que ela mesma conseguiu provocar. 

· 03:25 — Medo de desaceleração

As tarifas de Donald Trump vêm colecionando cada vez mais desafetos entre os figurões do mercado financeiro americano. Após o colapso da semana passada e uma nova rodada de quedas que ontem chegou a empurrar o S&P 500 para o território de bear market, nomes de peso começaram a verbalizar o desconforto. Jamie Dimon, CEO do JPMorgan, usou sua carta anual aos acionistas para fazer um alerta claro: quanto mais rápido essa disputa comercial for resolvida, melhor — do contrário, o risco de desaceleração do crescimento econômico se intensifica. Péssimo sinal.

Larry Fink, CEO da BlackRock, engrossou o coro ao afirmar que, entre os executivos com quem conversa, a maioria já vê a recessão como um fato consumado. E Stanley Druckenmiller, bilionário veterano dos mercados e crítico tanto de Trump quanto de Kamala Harris, foi direto ao ponto: é contra qualquer tarifa acima de 10%, ponto. Os alertas não param por aí. As tarifas não apenas ameaçam o crescimento, mas acendem de imediato o risco inflacionário — algo que o mercado, já fragilizado, não está exatamente em condição de absorver com serenidade. E o timing não poderia ser mais incômodo: a temporada de resultados começa agora, e os comentários dos CEOs sobre o primeiro trimestre devem adicionar combustível a esse barril de pólvora. Ou seja, não bastasse o ruído de fundo criado por Washington, vem aí mais uma rodada de declarações corporativas para manter a tensão em ponto de ebulição.

· 04:18 — E novas ameaças chinesas

O ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, subiu o tom e declarou que o país “vai revidar até o fim” caso os Estados Unidos insistam em aprofundar a escalada tarifária. A retórica, ainda mais agressiva que o habitual, escancara o caminho para novos capítulos do conflito — e deixa claro que ninguém pretende recuar tão cedo. Do lado americano, Scott Bessent, secretário do Tesouro, tentou adotar um tom mais pragmático ao afirmar que as tarifas são “negociáveis” e podem até ser retiradas para os parceiros que não retaliem. Mas é difícil levar isso muito a sério quando a postura geral da Casa Branca parece ser a do caos como método.

Enquanto isso, Pequim começa a se movimentar: afrouxou o controle sobre o yuan para estimular suas exportações, mobilizou a chamada “equipe nacional” — um grupo de fundos estatais — para comprar ativos e prometeu empréstimos emergenciais para estabilizar o mercado. Cogita-se, inclusive, antecipar pacotes de estímulo. O efeito imediato foi uma recuperação nas bolsas chinesas. Mas o contra-ataque mais efetivo pode vir por outras frentes: a China avalia impor restrições adicionais sobre as importações agrícolas americanas, o que, curiosamente, abre mais uma janela de oportunidade para o Brasil. Nem o setor de entretenimento escaparia ileso: rumores indicam que filmes americano podem ser os próximos alvos. E assim, entre bravatas diplomáticas e ataques comerciais cruzados, vamos apenas assistindo ao primeiro ato de uma guerra que promete muitos desdobramentos — e pouca racionalidade.

· 05:09 — Se protegendo das tarifas

O Bank of America elaborou uma lista de ações globais que, segundo seus critérios, oferecem proteção contra os efeitos negativos das tarifas comerciais impostas pelos Estados Unidos — são chamadas de “tariff-shelter stocks”. A seleção contempla apenas empresas com grande market cap (superior a US$ 10 bilhões) e elevada liquidez (média diária de negociação acima de US$ 10 milhões)…

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.