Bom dia, pessoal. Lá fora, as ações asiáticas subiram cautelosamente nesta quarta-feira, acompanhando a esperança de que uma crise bancária global seja evitada, apesar da incerteza sobre as perspectivas para as taxas de juros dos EUA, enquanto o Federal Reserve realiza hoje sua reunião de política monetária, assim como o Banco Central do Brasil (amanhã teremos a decisão do Banco da Inglaterra). O dia é vital para definir a trajetória dos ativos de risco nas próximas semanas, relevante diante da volatilidade recente.
Os mercados europeus operam predominantemente no positivo, enquanto os futuros americanos caem com investidores ajustando suas posições antes da reunião do Fed — a expectativa é de uma alta de 25 pontos-base, levando a taxa para intervalo entre 4,75% e 5%. Pela manhã, os preços ao consumidor do Reino Unido em fevereiro surpreenderam negativamente o mercado, ao virem acima do esperado e acelerando frente ao registrado em janeiro.
A ver…
· 00:47 — Não cumpriu o que prometeu
No Brasil, teremos a decisão de política monetária do Copom depois do fechamento de mercado. A expectativa é de que a taxa Selic seja mantida em 13,75%. O problema é que o mercado esperava um tom mais flexível do BC, ponderando começar a reduzir os juros na próxima reunião, em maio, mesmo que não colocasse isso palavra por palavra. O balanço de riscos internacionais e locais realmente mudou, mas não tivemos a apresentação formal da nova regra fiscal, conforme prometido por Haddad. Em outras palavras, os argumentos até existem para flexibilizar o tom, mas não são tão fortes quanto seriam se o arcabouço tivesse sido devidamente apresentado. A postura deverá irritar Lula e o PT, gerando mais atritos e volatilidade até a próxima reunião (ontem, o presidente falou inúmeras bobagens em entrevista).
A justificativa é de que Haddad viajará com Lula para a China no final de semana e deveria ficar aqui depois da apresentação da proposta (ou seja, só teremos o texto em abril, junto com o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2024). Se fosse verdade, seria compreensível. O problema é que muito provavelmente não é. Por acompanharmos os bastidores, sabemos que o atraso se deve às exigências da ala política do governo por mais gastos. Haddad parece ter ficado irritado, tanto que Lula, para agradá-lo, deverá anunciar o arcabouço fiscal em conjunto com o novo marco legal das Parcerias Público Privadas, além de ter aprovado as escolhas de Haddad para as diretorias do BC. Insuficiente, no meu ver. Se a regra for fraca, de nada adianta.
· 02:02 — O que acompanhar hoje?
Nos EUA, a quarta-feira passou sem grandes notícias do setor bancário, provocando alta nas ações, em especial dos bancos regionais, depois que um consórcio com os maiores bancos dos EUA, em conjunto de reguladores federais, continuou as discussões nos bastidores sobre suporte adicional para o First Republic Bank.
A atenção de hoje fica por conta da decisão da taxa de juros do Federal Reserve. O mercado precifica uma chance de aproximadamente 80% de que o Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC, na sigla em inglês) aumente a taxa dos fundos federais em 25 pontos-base, para 4,75% a 5,00%.
Para entender como o Fed está pensando sobre o sistema financeiro, valerá observar a linguagem do comitê sobre problemas bancários no comunicado e qualquer alteração no tom de Powell em sua coletiva de imprensa na sequência. Adicionalmente, a secretária do Tesouro, Janet Yellen, comparecerá a um subcomitê do Senado hoje para discutir a proposta de orçamento fiscal de 2024 do presidente Joe Biden.
· 02:50 — O difícil equilíbrio
O Federal Reserve tem um ato de equilíbrio difícil de executar hoje. A autoridade monetária precisa considerar tanto sua luta contra a inflação quanto a estabilidade do sistema bancário em sua decisão. A inflação mais recente e outros dados econômicos defendem a continuação do aperto, enquanto a recente turbulência bancária sugere que uma pausa pode ser prudente. Não é uma decisão trivial.
O aperto da política monetária do ano passado ainda não reduziu a inflação para a meta anual de 2% do Fed — o índice de preços ao consumidor de fevereiro subiu 6% em relação ao ano anterior e o mercado de trabalho continua notavelmente forte , não mostrando sinais de uma recessão iminente. Enquanto isso, a rápida mudança nas taxas de juros expôs as fraquezas dos bancos regionais.
Eu entendo que o Fed permanecerá rígido com a inflação ao aumentar as taxas, ao mesmo tempo em que adiciona uma linguagem relativamente mais suave para amenizar as preocupações sobre a situação nos bancos. As autoridades do Fed deixaram claro que estão dependendo de dados e, se for para errar, que seja para o lado de apertar mais a política, em vez de apertar menos. É por aí que caminhamos.
· 03:48 — Os erros do Fed
A volatilidade provocada pela decisão de política monetária do Fed é fruto de nossa era, que vive com a ressaca da exacerbação de liquidez proporcionada desde a crise de 2008. O problema é que, como se não bastasse a situação atípica, temos convivido com inúmeros erros da autoridade monetária, em especial em sua comunicação. Sim, entendo que o momento seja difícil e seja mais fácil criticar do que estar conduzindo o barco. Ainda assim, as verdadeiras lideranças se fazem nas crises. Aliás, o Ocidente vive um momento de falta de líderes diplomáticos e contundentes. Impressiona.
De 2021 para cá, vimos o Fed manter a taxa de juros reduzida por muito tempo e agora errando o ritmo do aperto, primeiro ao ancorar as expectativas no IPC (índice de preços ao consumidor) ao invés de no PCE (índice de preços das despesas de consumo pessoal), provocando desdobramentos claros para o grau de confiabilidade do indicador (IPC é menos sensível que o PCE para mudanças no padrão de consumo), e depois ao provocar o mercado colocando na mesa a chance de reacelerar o aperto monetário bem antes da crise dos bancos estourar. Os erros são graves.
· 04:26 — E o fornecimento de petróleo russo?
A Rússia ultrapassou a Arábia Saudita e se tornou o principal fornecedor de petróleo da China, de acordo com dados alfandegários do governo, com importações aumentando 23,8%, para 1,94 milhão de barris por dia, nos primeiros dois meses de 2023. Isso pode ajudar a lançar alguma luz sobre a visita de Xi Jinping a Moscou nesta semana. Antes da visita, Putin expressou vontade de discutir o plano de paz chinês.
Notadamente, o petróleo russo vem sendo comprado com grande desconto pelos chineses por conta das sanções ocidentais. O comércio geral entre os dois países também disparou desde a invasão da Ucrânia, à medida que os dois países constroem a chamada “parceria sem limites” proclamada nas Olimpíadas de Pequim em 2022. A China se aproveita da fraqueza russa e exerce dominação sobre o vizinho.
Um abraço,
Matheus Spiess