Bom dia, pessoal. Lá fora, os mercados da Ásia e do Pacífico caíram nesta quarta-feira (3), com os investidores aguardando a decisão política do Federal Reserve dos EUA — a maioria dos economistas disse esperar que o Fed suba os juros em 25 pontos-base, com o restante prevendo uma pausa. Entendo que o mais provável seja um último ajuste antes do fim do ciclo de aperto monetário, o mais agressivo em décadas. Além disso, a falta de liquidez por conta de feriados na China e no Japão ampliou a aversão ao risco.
Os mercados europeus e os futuros americanos sobem modestamente nesta manhã, depois da queda de ontem. O comunicado do Fed será fundamental para nortear os investidores ao longo do pregão. Entendo como provável uma postura em linha com a do presidente do Banco da Coreia, Rhee Chang-yong, que afirmou ser prematuro começar a falar sobre o corte das taxas de juros. Em outras palavras, ainda que cheguemos hoje ao último ajuste da taxa, os juros permanecerão elevados.
A ver…
· 00:49 — E o “Copão”?
No Brasil, o Comitê de Política Monetária (Copom) deverá manter a taxa Selic inalterada em 13,75% ao ano. A mudança poderá vir do comunicado que acompanha a decisão, podendo iniciar o processo de flexibilização do tom da autoridade monetária, ainda que marginalmente (poderá remover a menção à possibilidade de voltar a subir os juros, por exemplo). Desde a última reunião, várias iniciativas da Fazenda para equacionar as contas públicas foram apresentadas, além da formalização do arcabouço fiscal. Todas foram elogiadas pelo BC. Ainda assim, é cedo para esperar uma queda nos juros agora — imagino que ela só venha no terceiro trimestre.
Em primeiro lugar, não sabemos como o arcabouço será aprovado no Congresso, nem se o governo conseguirá cumprir as metas contratadas. Em segundo lugar, mesmo que a inflação tenha caído mais do que o esperado em 2023, os índices deverão voltar a acelerar no segundo semestre, sem falar no fato de que os núcleos, que excluem os itens mais voláteis, permanecem bem elevados e os preços dos serviços chamam a atenção. Muitas coisas estão incertas sobre o futuro: a possibilidade de mudança das metas de inflação, a desaceleração econômica, a questão do crédito e os nomes dos novos diretores do BC. A decisão da autoridade monetária está longe de ser trivial.
· 01:53 — Investimentos e refinanciamento
Ainda em território nacional, chamaram a atenção os últimos dados divulgados pelo BC de Investimentos Diretos no País (IDP). O número atingiu a marca de US$ 7,7 bilhões em março, dando continuidade à tendência positiva dos últimos 12 meses — no acumulado do período até março, o saldo ficou em US$ 89,7 bilhões, o equivalente a 4,6% do PIB. Para o ano, devemos ter algo como US$ 75 bilhões. Isso é positivo porque ajuda a financiar o déficit em transações correntes e, consequentemente, dá mais força ao real frente ao dólar, dando mais previsibilidade aos investimentos.
Ao mesmo tempo, nem tudo são rosas. Em relatório recente da Moody’s, o mercado foi alertado de que as empresas latino-americanas, inclusive as brasileiras, vão encontrar crescentes dificuldades para refinanciar suas dívidas, principalmente para aquelas com piores ratings. Os juros mais elevados começam a fazer efeito sobre o mercado de crédito, criando um ambiente volátil de liquidez restritas e menor crescimento. Um aumento de defaults corporativos na região é provável, podendo afetar os bancos já neste ano (o caso da Americanas é caricato, mas serve bem de ilustração).
· 02:48 — Sentiu o calor
Nos EUA, as ações caíram fortemente ontem, com os investidores se preparando para outra decisão de alta taxa de juros do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês). As ações de outros bancos regionais sentiram o calor do fim do First Republic Bank. Há uma preocupação implícita com os custos de financiamento diante da possibilidade de um aprofundamento da crise bancária — os custos provavelmente aumentarão como resultado das perdas que a Federal Deposit Insurance Corp. (FDIC) sofreu ao lidar com a recente série de falências de bancos regionais.
Por isso, a decisão sobre a taxa de juros de hoje é importante para os mercados. Ainda há um debate sobre se a crise bancária regional deve ser suficiente para o Fed fazer uma pausa nos aumentos das taxas de juros. A economia está claramente desacelerando, mas não sabemos se é o suficiente para o Fed fazer uma pausa no ciclo de aperto monetária. A autoridade monetária deverá elevar em 25 pontos-base a sua taxa de juros de referência, colocando-a acima de 5% pela primeira vez desde 2007. O índice de gerentes de compras de serviços também é aguardado.
· 03:44 — Quando veremos um mea culpa?
Sem dúvida, este foi um dos ciclos de aperto monetário mais mal administrados desde a década de 1970. Sim, a política monetária precisou ser apertada após a pandemia. Agora, elevar os juros sem parar para avaliar os danos e sem reconhecer que os dados são substancialmente menos confiáveis foram movimentos imprudentes.
A atual volatilidade do sistema bancário foi refém do aumento implacável das taxas. O Fed agora tem restrições de empréstimos bancários que não controla em uma economia que não entende adequadamente. Claro, a inflação tem sido extremamente incomum, mas a comunicação da autoridade monetária não facilitou o trabalho. Várias vezes o Fed não só se movimentou equivocadamente, como também se comunicou mal.
A primeira onda de inflação impulsionada pela demanda pós-pandêmica está agora em desinflação. A segunda onda de inflação impulsionada pela oferta de energia está agora em desinflação (os preços do petróleo caíram ainda mais ontem). Resta avaliar a inflação de serviços e o mercado de trabalho, mas as coisas parecem convergir para um tom mais ameno. Faz sentido o fim do ciclo. Pelo menos isso o Fed não pode errar.
· 04:41 — E o risco de estagflação?
A resiliência da inflação, contudo, pode ser um desafio para o Fed ficar satisfeito ao realizar um último ajuste nos juros hoje. Caso os serviços e os núcleos continuem elevados e sem desacelerar tanto quanto esperado, podemos provocar a autoridade monetária a querer mais juros, principalmente se continuarmos a observar crescimento salarial em termos reais, ainda que marginalmente. A consequência? Estagflação.
Depois que um resultado fraco do PIB americano na semana passada mostrou que a economia dos EUA estava desacelerando mesmo antes da crise bancária, a tese de estagflação voltou a ganhar força, onde a economia cai enquanto a inflação mantém um ritmo bem acima da meta de 2% do Fed. É o pior cenário, no qual os juros poderiam permanecer elevados por ainda mais tempo, prejudicando os ativos.