
Imagem: iStock.com/ Galeanu Mihai
A quinta-feira (27) amanhece com os mercados globais em modo tensão, embalados pela expectativa de mais um round tarifário vindo diretamente do repertório protecionista de Donald Trump, desta vez com tarifas de 25% sobre as importações de automóveis, além de sugerir novas penalidades comerciais contra a União Europeia e o Canadá.
Todo dia voltamos a falar sobre isso. A ampliação dessa cruzada tarifária joga mais gasolina na incerteza global, reacendendo temores sobre a trajetória de crescimento e inflação nos Estados Unidos e no resto do mundo. O receio de retaliações é cada vez mais palpável e o risco de um efeito dominó sobre os índices de confiança está no radar: vale lembrar que quedas nesses indicadores frequentemente antecipam aumento no desemprego — um combo nada animador (cenário de desaceleração).
O resultado é o esperado: as bolsas europeias amanhecem no vermelho, a maior parte das praças asiáticas fechou no mesmo tom e os futuros americanos seguem a tendência de mau humor. Os investidores ainda aguardam a nova leitura do PIB do quarto trimestre dos EUA. A pergunta que paira no ar: será que Trump vai conseguir sabotar sozinho o frágil equilíbrio que o mercado vinha tentando reconstruir?
· 00:56 — Relatório de Política Monetária, prévia da inflação e o pêndulo político
No Brasil, seguimos surfando a onda da rotação global de capitais — aquela troca clássica de regiões que já andaram demais (como os EUA) para aquelas que ficaram para trás, como é o caso do nosso mercado. Até aí, tudo bem. Mas o alerta da vez está na digestão do novo Relatório de Política Monetária — o substituto do velho Relatório Trimestral de Inflação (RTI) — que trouxe um recado claro: os riscos inflacionários estão vivos e pulsantes. Especialmente com um governo empenhado em colocar mais dinheiro na mão do consumidor, mesmo que o custo disso seja uma Selic ainda mais elevada. Falando nisso, o IPCA-15 de março, divulgado nesta manhã, ajuda a temperar o debate. Na comparação mensal, deve desacelerar por conta do efeito base do bônus de Itaipu. Mas na leitura de 12 meses, o número vai azedar: provavelmente saltaremos para algo em torno de 5,30%. E esse é apenas o começo — a rota até os 6% no meio do ano parece cada vez mais inevitável, justificando o aperto monetário em curso. Que fique claro: não é o BC quem nos trouxe até aqui. Foi a completa falta de coordenação e prudência da política fiscal do governo que acendeu esse incêndio.
E hoje teremos mais um lembrete do estrago: o resultado do Governo Central. Após o superávit de R$ 84,8 bilhões em janeiro, a conta deve virar para um déficit de R$ 30,9 bilhões em fevereiro. O cenário fiscal do ano está longe de inspirar confiança — e piora à medida que Fernando Haddad, o último resquício de sanidade técnica no Planalto, vai sendo empurrado para o escanteio. O ministro, que ao menos tinha uma agenda minimamente estruturada, agora virou coadjuvante de um governo cuja única prioridade é pavimentar a reeleição.
O problema? As medidas populistas e completamente irresponsáveis do ponto de vista fiscal mostram que o governo está disposto a trocar a credibilidade pela ilusão de crescimento. Lula, em seu modo campanha, parece não perceber que enfraquecer Haddad é minar a si próprio. E se ele realmente não for candidato em 2026 — seja por idade, por impopularidade ou por puro desgaste —, o PT terá de se virar com Haddad, que está cada vez mais desidratado, isolado dentro do partido, e, para piorar, tem um retrospecto eleitoral muito ruim.
Segundo a pesquisa Futura Inteligência, a avaliação positiva de Lula caiu de 32,4% para 26,8%, o menor nível desde o início do mandato. O problema para o Planalto é que, do outro lado, a oposição começa a organizar sua ficha. Bolsonaro, agora réu e muito provavelmente prestes a ser condenado, sai de cena. E Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, surge como o nome natural para herdar esse capital político — com um discurso mais técnico, reformista e pró-mercado, sem o desgaste bolsonarista explícito. Mas é cedo para aparecer demais: por ora, o melhor cenário para o mercado é ver Lula se desgastando em câmera lenta, enquanto Tarcísio ganha força de forma marginal e silenciosa, até o fim de 2025. Quando faltarem 12 meses para a eleição, o jogo ficará mais claro. Até lá, será preciso atravessar um caminho tortuoso — repleto de ruídos fiscais, inflação resiliente, populismo desenfreado e decisões que só agravam o quadro de médio e longo prazo.
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· 01:43 — Difícil ter uma sequência boa
Nos Estados Unidos, bastaram três míseros dias de calmaria para a realidade bater à porta — e com força. As gigantes de tecnologia puxaram os principais índices para baixo, relembrando aos investidores que a tão falada guerra comercial de Donald Trump não é só retórica de campanha: ela tem consequências reais, e nenhuma delas é boa para o mercado. Com os ruídos sobre tarifas se intensificando, cresce o receio de que os impactos na economia e na inflação sejam maiores do que o inicialmente precificado. O temor está corroendo a liquidez do mercado acionário americano, afastando fluxo e minando o apetite por risco.
Hoje, os olhos se voltam para a terceira (e definitiva) leitura do PIB dos EUA no quarto trimestre. O mercado espera um número estável, algo em linha com o crescimento tendencial. Mas sejamos honestos: se vier qualquer sinal de fraqueza — mesmo que marginal — vai bastar para azedar ainda mais o ambiente. Em um mercado que já está no modo “sarna por coceira”, qualquer frustração vira gatilho para pânico. Com a economia patinando e o cenário externo mais turbulento a cada dia, é difícil imaginar um final feliz para essa novela comercial. E o pior: ainda estamos no primeiro capítulo.
· 02:37 — Tarifas sobre o que?
Donald Trump deve subir ao púlpito hoje para anunciar, em coletiva de imprensa, mais uma de suas cruzadas tarifárias — desta vez, mirando diretamente o setor automobilístico. O plano é aplicar uma tarifa de 25% sobre todos os carros fabricados fora dos Estados Unidos. O problema? Ninguém sabe exatamente quais serão os contornos dessa medida: quais países serão atingidos, quais setores terão algum alívio e se haverá isenções. O mistério reina, como sempre, para aumentar o drama — e o estresse do mercado. Antes mesmo da fala oficial, as ações das montadoras americanas já começaram a sangrar. Isso porque, ao contrário do discurso nacionalista açucarado, a cadeia automotiva dos EUA é profundamente globalizada — e qualquer tarifa tem o potencial de desmontar essa engrenagem. Para se ter uma ideia: em 2024, mais de 7 milhões de veículos foram importados para o país, totalizando US$ 217 bilhões, ou 6,6% de tudo que os americanos compraram do exterior.
E como se não bastasse, metade ou mais das peças utilizadas em modelos populares montados dentro dos EUA vêm do Canadá e do México. Ou seja, o “Made in America” que Trump sonha em reviver virou um quebra-cabeça internacional — e bem caro. A retórica de trazer de volta a indústria automobilística para solo americano pode até funcionar como slogan, mas como política pública é uma ficção. A complexidade logística e os custos envolvidos transformam essa “repatriação” numa missão quase kamikaze. E, para agravar ainda mais o cenário, já se fala em tarifas sobre importações de cobre — que devem ser reveladas nas próximas semanas, depois das tarifas recíprocas prometidas para a semana que vem. Resultado? Um mercado andando em ovos, nervoso com o improviso tarifário que se tornou marca registrada da política comercial de Trump. A volatilidade é alimentada diariamente por esse vai e vem errático, que mistura populismo econômico com geopolítica de palanque. E, no fim das contas, quem paga a conta é sempre o investidor — e, claro, o consumidor americano.
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· 03:22 — Trapalhada
O governo Trump, já acostumado a flertar com o caos, conseguiu se superar nesta semana ao protagonizar mais um episódio digno de manual sobre como não conduzir a segurança nacional. Desta vez, os assessores mais próximos do presidente decidiram que seria uma boa ideia usar um aplicativo de mensagens comerciais para discutir detalhes sensíveis de um ataque militar iminente. Como se isso não fosse suficientemente irresponsável, ainda incluíram acidentalmente um jornalista na conversa. O deslize partiu diretamente do Conselheiro de Segurança Nacional, Mike Waltz, que convidou Jeffrey Goldberg, editor-chefe da revista The Atlantic, para o grupo. Goldberg publicou o conteúdo integral da conversa dos integrantes do governo.
A troca incluía o Secretário de Defesa, Pete Hegseth, que cravou com precisão o cronograma de ataques ao Iêmen. Se essas informações tivessem sido interceptadas por inimigos, o risco às vidas de militares americanos seria real e imediato. Tulsi Gabbard, diretora nacional de inteligência de Trump e também presente no grupo, mantém o silêncio. Curiosamente, tanto ela quanto Hegseth já haviam enfrentado sabatinas constrangedoras no Senado, apesar da maioria republicana. Agora, seus nomes se somam à crescente lista de figuras que estão atrapalhando o governo Trump. Com o governo ainda nos primeiros meses, o estrago político deve ser contido — pelo menos temporariamente. Mas o desgaste ao núcleo duro da Casa Branca é evidente.
· 04:18 — A Europa quer avançar
A União Europeia segue tentando provar ao mundo — e a si mesma — que um dia ainda será capaz de fabricar seus próprios chips sem depender da boa vontade dos Estados Unidos ou da Ásia. Na mais nova tentativa, uma coalizão de nove países europeus, incluindo França, Alemanha, Itália, Holanda e Espanha, está discutindo um novo “Chips Act 2.0”, que pretende corrigir os erros e omissões do primeiro — aquele mesmo que entrou em vigor em 2023 e, até agora, só entregou promessas e pouco resultado concreto. O fracasso do primeiro pacote não é exatamente segredo: a meta era estimular a autossuficiência europeia em semicondutores, mas o continente continua dependendo das potências tradicionais para quase tudo, com exceção daquilo que já dominava — pesquisa, desenvolvimento e os equipamentos de litografia da holandesa ASML, que é, de longe, o ponto fora da curva do bloco.
Na parte crítica da cadeia — como empacotamento e fabricação de chips em escala — a Europa segue no atraso crônico, assistindo aos investimentos se acumularem em Taiwan, Coreia e EUA, enquanto seus próprios planos seguem emperrados pela burocracia e por uma visão estratégica que mais parece uma colcha de retalhos. Só para dar uma ideia do quão difícil é sair do PowerPoint: em setembro do ano passado, a Intel empurrou para frente em pelo menos dois anos a construção da tão falada fábrica na Alemanha. Agora, a nova coalizão promete apresentar suas propostas ao restante da comunidade europeia ainda neste ano. A ideia é identificar lacunas específicas na cadeia de suprimentos e, finalmente, colocar dinheiro e estratégia onde antes havia só discursos e comunicados oficiais. A proposta ainda é vaga, mas o tom é claro: a Europa está tentando — de novo — se desamarrar da dependência americana.
· 05:03 — Repercutindo o Porto Day 2025
Nossa equipe acompanhou de perto o encontro com investidores da Porto e a mensagem não poderia ser mais direta: depois de anos vendendo a imagem de uma seguradora automotiva tradicional, a companhia agora quer ser vista — e tratada — como um ecossistema de soluções para a vida do cliente. E está conseguindo. O processo de transição, que começou por volta de 2020, já surtiu efeito visível: no ano passado, o seguro auto representou apenas 36% do lucro consolidado. A fase de “prova de conceito” terminou. Agora, a ambição é escalar o modelo — e com pressa…