Bom dia, pessoal. Lá fora, as ações asiáticas encerraram a terça-feira de maneira mistas, sem uma única direção, na véspera das eleições de meio de mandato (midterms) dos EUA, com os investidores provavelmente permanecendo cautelosos em uma semana que traz novos dados de inflação e outros eventos que podem abalar os mercados. Há também incerteza sobre as perspectivas para as taxas de juros após a reunião do Federal Reserve dos EUA na semana passada. De maneira semelhante, os mercados europeus também não possuem uma única direção, digerindo os dados de vendas no varejo da Zona do Euro em setembro e do Reino Unido em outubro, que mostraram uma desaceleração adicional nos gastos dos consumidores em bens. Os ativos brasileiros até podem acompanhar a dinâmica internacional, mas o mais importante está acontecendo dentro de casa, com a equipe de transição e o debate fiscal. A ver… |
00:39 — O mercado está emocionado demais |
No Brasil, enquanto os investidores podem se debruçar sobre os dados de inflação de outubro, com o IGP-DI, e as falas de autoridade local, como o caso do diretor de Política Monetária do BC, Bruno Serra, a preocupação principal fica para a equipe de transição. O coordenador da transição e vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, está em Brasília e deve tratar com Arthur Lira sobre o orçamento de 2023. Lula é esperado para participar das discussões apenas amanhã. A ansiedade fica por conta do nome oficial da equipe econômica. Ontem, gerou muito estresse a possibilidade de Fernando Haddad para o Ministério da Fazenda, além de outros nomes não tão apreciados pelo mercado. Há muita incerteza e pouca materialidade nas informações. Até que o martelo seja batido por definitivo, as considerações são mais especulações do que qualquer outra coisa. Um pouco mais material é o waiver de até R$ 175 bilhões que pode vir fora do teto em 2023. Fora o debate fiscal, muito aquecido e pressionando a curva de juros, os investidores contam com os resultados corporativos, com nome de destaque, como o Bradesco, apresentando os números do terceiro trimestre hoje. Se houver maior tranquilidade política ao longo do dia, há espaço para uma repercussão melhor dos resultados, que podem acabar em segundo plano caso haja muito estresse em Brasília. |
01:38 — Cansou de política? Sinto muito, temos mais uma eleição hoje… |
Nos EUA, as eleições de meio de mandato acontecem hoje, embora os resultados possam levar um pouco mais de tempo para serem anunciados. Hoje, o Congresso está sob controle democrata, partido que possui maioria tanto na Câmara como no Senado. Se já foi difícil até aqui, imagina sem o legislativo. Provavelmente é o que vai acontecer. A expectativa é de uma vitória republicana ao menos na Câmara, com o Senado ainda em aberto (cerca de 50% de chance para cada). De qualquer forma, sem uma das casas do Congresso, Washington ficará dividida e o governo Biden terá parte de sua influência esterilizada por dois anos. A regra geral, no que diz respeito ao mercado, é que o impasse entre os dois partidos é bom. Isso significa menos mudanças políticas e menos riscos para setores individuais, como tecnologia ou energia. Adicionalmente, mudanças importantes no código tributário também são improváveis. É um verdadeiro apagão político. O problema é quando a divisão do governo traz o risco de intromissão política interferir no funcionamento básico do governo — o Congresso precisará comprometer um orçamento federal e terá que aumentar o teto da dívida em meados de 2023. Se houver uma paralisação do governo em 2023, o mercado poderá sentir. Para piorar, sem uma maioria, a Casa Branca teria menos poder de ação em uma recessão. Por outro lado, pelo menos, segundo os dados históricos, o S&P 500 teve um retorno anualizado de 16,9% desde 1948 durante os nove anos em que um democrata esteve na Casa Branca e os republicanos tiveram maioria nas duas câmaras do Congresso… |
02:47 — E as demissões? |
Sabemos que o setor de tecnologia passa por um dos piores choques de sua história. A consequência pode ser vista não só no desempenho das ações, mas em outros pontos de atenção também. Um desses pontos é a sequência de demissões que tem acontecido e deverá se aprofundar nas próximas semanas — só em 2022, 751 startups demitiram mais de 100 mil funcionários e mais deve vir pela frente. A própria Meta Platforms, dona do Facebook, está planejando iniciar demissões em larga escala nos próximos dias. Espera-se que as demissões afetem milhares de pessoas da força de trabalho de mais de 87 mil funcionários da empresa. Provavelmente, o setor, que muito cresceu nos últimos anos, passará por um grande ajuste. A indústria está se remodelando e é um sinal da recessão. |
03:22 — A confusão entre oferta e demanda |
Em 2021, quando o aumento da demanda por bens superou o aumento da oferta de bens com os consumidores saindo da pandemia com dinheiro para gastar, os preços dos bens duráveis ao consumidor dispararam. Como já discutimos, a pandemia foi um grande choque para as cadeias de suprimentos globais, que ainda estão sensibilizadas, mesmo que visivelmente mais bem estruturadas do que antes. As cadeias de suprimentos, no entanto, não entraram em colapso. De maneira responsiva, a produção manufatureira global atingiu um recorde histórico em 2021, com os volumes de comércio global aumentando sua participação na economia mundial para um patamar recorde. Contudo, o aumento na demanda por bens foi tão excepcional que a oferta não conseguiu acompanhar. De qualquer forma, percebemos que houve uma tentativa de atender a demanda. Isso é importante, porque se houvesse colapso das cadeias, poderíamos ter que esperar por anos para as ver reconstruídas. Não é o caso aqui: uma cadeia de suprimentos sobrecarregada pela demanda volta ao equilíbrio assim que a demanda diminui. Isso é um bom sinal para a inflação, que se tornou um problema desde o ano passado e agora começa a apresentar sinais de alívio, com a demanda por bens duráveis desacelerando este ano e as taxas de frete caindo. Ou seja, o excesso gradualmente passa a ser de oferta e não mais de demanda, o que é bem desinflacionário. |
04:23 — Uma Nova Era |
A geopolítica está levantando mais problemas do que o normal para os investidores. Temos a guerra na Ucrânia, a nova dinâmica do governo chinês, novos primeiros-ministros assumindo o cargo em circunstâncias estranhas na Europa e as eleições de meio de mandato nos EUA, as quais devem aprofundar a polarização política. Com uma crescente divisão entre EUA e China, o choque na cadeia de suprimentos induzida pela pandemia e a crise de energia induzida pela guerra se desenrolando no leste europeu, a humanidade está entrando em uma nova era. O mundo parece estar passando por algo semelhante às grandes mudanças do século 20, incluindo a Segunda Guerra Mundial, a crise do petróleo dos anos 1970 e a dissolução do império soviético entre 1989 e 1992, que moldou poderosamente os resultados socioeconômicos nas décadas seguintes. Uma observação importante é que isso é diferente dos ciclos de negócios anteriores que foram, em última análise, impulsionados por colapsos na demanda, incluindo o colapso das pontocom, nos anos 2000, e a crise financeira global, em 2008. Hoje, estamos vendo uma escassez de oferta, com tensões geopolíticas em torno da oferta. Enquanto um ciclo de demanda costuma ser positivo, um ciclo de oferta é físico e leva muito mais tempo e esforço para resolver. A próxima era será moldada ao longo da década. |