Bom dia, pessoal. Lá fora, a maioria dos principais mercados de ações asiáticos conseguiu subir timidamente nesta quinta-feira, com os investidores ainda refletindo sobre o aumento das taxas de juros nos EUA e uma piora nas perspectivas econômicas, embora os fortes números de gastos no feriado chinês tenham apoiado as ações locais.
O PMI industrial (atividade do setor manufatureiro), por outro lado, caiu de 50 pontos em março, para 49,5 em abril, o que é negativo para a percepção de atividade global. A Autoridade Monetária de Hong Kong também aumentou as taxas de juros em sintonia com o Fed. Com isso, deverá chamar a atenção dos investidores globais a reunião de política monetária na Zona do Euro hoje.
Os mercados europeus e os futuros americanos começam o dia em queda, também acompanhando a queda das ações do PacWest Bancorp, nos EUA, que caiu mais de 50% no after hours em NY de ontem depois da notícia de que pode ser vendido, transformando a instituição na quarta a cair desde março com a quebra do SVB. No Brasil, devemos repercutir hoje a decisão de política monetária de ontem.
A ver…
· 00:56 — Amenizou só um pouquinho
Por aqui, como era esperado, tivemos manutenção pelo Comitê de Política Monetária (Copom) da taxa de juros em 13,75% ao ano. A grande dúvida, porém, residia na expectativa para o comunicado que acompanha a decisão. Acontece que a autoridade monetária realmente amenizou o tom, mas foi bem pouco. Algumas sinalizações foram importantes. A primeira e mais relevante se relaciona à adição da frase “esse cenário é menos provável” entre vírgulas para se referir à possibilidade de voltar a subir juros. Ele não removeu a menção, esvaziando a chance de uma queda dos juros em junho.
O segundo ponto que me chamou a atenção foi que o BC parou que falar sobre a deterioração adicional das expectativas inflacionárias de longo prazo, uma vez que as expectativas estiverem bem-comportadas na última semana, em linha com a formalização do novo arcabouço fiscal, que ainda carece da devida tramitação no Congresso. Com isso, a queda da Selic deverá vir apenas no segundo semestre, muito provavelmente em agosto, com variação marginal de 25 pontos-base. Em outras palavras, quando a flexibilização vier, ela será lenta e gradual.
· 01:51 — O governo estava esperando…
Ainda no Brasil, abalado com as duas derrotas recentes no Congresso (PL das Fake News, retirado de pauta, e queda de parte dos decretos sobre saneamento), o governo estava esperando o comunicado da noite de ontem para decidir sobre os próximos nomes das diretorias vagas do BC, bem como a possível antecipação da reunião do Conselho Monetário Nacional (CNM), previsto para junho. Sem a sinalização de queda no curto prazo, o Palácio do Planalto pode voltar a pressionar a autoridade monetária — lembrem-se como os atritos institucionais foram ruins para os mercados.
Entretanto, caso o governo opte por uma abordagem mais amena, indicando nomes adequados para as diretorias (Marcello Negro para a Diretoria de Política Monetária ganhou força nos últimos dias e parece ter aceitação do mercado) e não dando um cavalo de pau no CMN, o desfecho pode ser mais positivo — a reunião do Conselho serviria para manter as metas já previstas para 2024 e 2025 de 3%, mudando o horizonte do cumprimento para um prazo de dois anos (ao invés de anual) e as bandas para até 2% (ao invés de 1,5%). Não tão ruim como mudar a meta em si.
· 02:48 — Chegamos ao fim do ciclo de aperto americano?
Nos EUA, o comitê de política monetária do Federal Reserve aumentou sua meta de taxa de juros de referência em 25 pontos-base, conforme o esperado, no que pode ser o último aumento deste ciclo. O aumento de ontem foi o décimo consecutivo desde março de 2022, elevando a taxa dos fundos federais para uma meta de 5,0% a 5,25%. É o maior valor desde 2007, sendo a alta mais agressiva desde a década de 1980.
Na sequência da decisão, o presidente do Fed, Jerome Powell, deu a entender que as opções do Fed estão em aberto caso os dados econômicos apoiem novos aumentos. Me parece mais uma atuação vocal do que qualquer outra coisa, mas o mercado de trabalho permanece forte e a inflação segue elevada, permitindo tal abordagem. Sem dúvida, a situação recente dos bancos regionais prejudica muito a posição do Fed.
Contudo, a inflação não vai cair para 2% da noite para o dia. Ou seja, pode levar algum tempo com a política monetária restritiva para que a inflação caia. Em outras palavras, não vemos chance de corte dos juros por lá em 2023, devendo ser uma discussão para 2024. Naturalmente, como o mercado esperava queda dos juros ainda neste ano, algo que sempre considerei equivocado, novas quedas devem ser observadas nas ações.
· 03:53 — Os próximos passos
A pandemia de Covid-19 e as interrupções relacionadas, além de ações de política fiscal e monetária ultra flexível, contribuíram para uma inflação persistente que muitos pensavam ser apenas transitória. A escassez de trabalhadores disponíveis persistiu até 2023, enquanto em pouco mais de um ano o Fed aumentou as taxas de juros agressivamente — foram cinco pontos percentuais em 14 meses, sendo que a taxa de desemprego hoje é de 3,5%, ainda mais baixa frente a quando o processo começou.
A atual turbulência no setor bancário regional americano e uma possível crise do teto da dívida do governo apenas complicam as coisas. Todos esses choques ao mesmo tempo não estavam previstos na literatura; logo, nenhum modelo conseguiu antecipar bem as coisas até aqui. Consequentemente, os economistas vão estudar o momento atual pelos próximos 20 anos. Um momento paradigmático, sem dúvida. O que o Fed fizer em junho dependerá do que acontecer com o mercado de trabalho e a inflação.
· 04:40 — E os europeus?
No velho continente, o Banco Central Europeu deve subir a taxa de juros na Zona do Euro em 25 ou 50 pontos-base — o mercado está dividido sobre o que virá. O mais provável é 25 pontos, desacelerando o ritmo de aperto monetário (os padrões de crédito mais rígidos e o núcleo da inflação mais baixo sugerem um ritmo mais lento de aperto). A pausa do ciclo, porém, deve ficar para outro momento.
Este tem sido um ciclo de política monetária peculiar. Os consumidores têm sido menos sensíveis às taxas devido à poupança excepcionalmente alta e ao baixo endividamento no início do aperto da liquidez. Com isso, o ônus dos aumentos de juros parece ter recaído mais sobre os grupos de renda mais baixa. Ainda não sabemos qual herança o processo atual deixará para a sociedade. Talvez a recessão futura nos explique.