Mercado em 5 minutos

Nós avisamos que era uma afobação…

“Lá fora, os mercados asiáticos encerraram o dia predominantemente em baixa nesta quinta-feira (3), acompanhando as movimentações negativas dos mercados globais durante o pregão de ontem […]”.

Por Matheus Spiess

03 nov 2022, 10:07 - atualizado em 03 nov 2022, 10:07

Manifestações
Fonte: Free Pik
Bom dia, pessoal.

Lá fora, os mercados asiáticos encerraram o dia predominantemente em baixa nesta quinta-feira (3), acompanhando as movimentações negativas dos mercados globais durante o pregão de ontem (2), com os investidores ainda preocupados com as perspectivas para as taxas de juros e reagindo ao anúncio de política monetária do Federal Reserve dos EUA (com os comentários subsequentes do presidente do Fed, Jerome Powell, que soaram mais hawkish do que se esperava).

Nesta manhã, os mercados europeus e os futuros americanos abrem em queda. Por aqui, os investidores locais voltam do Dia de Finados, que fechou o mercado brasileiro, abrindo espaço para um ajuste negativo em relação ao que aconteceu ontem lá fora. Os ADRs brasileiros acompanharam os ativos internacionais, também refletindo o ruído provocado pelas manifestações pelo Brasil. Mais resultados e outras reuniões de política monetária nos países centrais devem marcar o dia de hoje.

A ver…
00:38 — Em transição…
No Brasil, enquanto os ativos fazem catch-up com o desempenho ruim verificado ontem (em termos líquidos com o desempenho de hoje, vale dizer) e aguardamos o resultado da Petrobras, a ser divulgado depois do fechamento de hoje, os investidores também acompanham o primeiro dia de trabalho da equipe de transição do futuro governo Lula. Ao longo do dia, o coordenador da equipe, o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, deve se reunir com o Ministro Chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira. 

Um ponto de atenção da transição é o debate sobre o Orçamento de 2023, comandado por Wellington Dias. A peça orçamentária deverá ser alterada para acomodar os compromissos do PT, com destaque para o Auxílio Brasil de R$ 600. Outras promessas serão incorporadas apenas em 2024. Novidades nesta frente e na eventual divulgação de nomes para os ministérios serão lidas de perto pelo mercado.

Sobre este último tema, aliás, chamou a atenção a possível indicação de Felipe Salto, atual secretário da Fazendo de São Paulo, para a secretaria do Tesouro, o que deve repercutir bem no mercado. David Uip pode ficar com o Ministério da Saúde, mas o nome ainda está em aberto (o PT se alimenta dos espólios do PSDB).

Outro ponto de atenção que está repercutindo mal é a série de bloqueios nas rodovias do país. Ontem, Bolsonaro divulgou um vídeo condenando os atos que prejudicam o direito de ir e vir, afetando também a economia. Até a noite de quarta-feira, ainda havia mais de 140 pontos de interdição, os quais estavam sendo gradualmente contidos pela Polícia Rodoviária Federal (gradual até demais). Me parece mais ruído do que sinal, sem representação estrutural para o mercado e os ativos de risco.
01:49 — Um Fed ainda hawkish: sem pivô no horizonte
Nos EUA, o comitê de política monetária do Federal Reserve elevou sua taxa de juros em 75 pontos-base, seu sexto aumento de 2022 e quarto aumento consecutivo de 75 pontos. A medida trouxe a faixa-alvo da taxa de juros do Fed para entre 3,75% e 4,00%, o patamar mais alto em quase 15 anos. Naturalmente, o movimento em si não foi uma surpresa para os mercados. A diferença ficou por conta da coletiva do Jerome Powell, presidente do Fed, que confundiu os mercados.

Até então, havia uma leitura prematura de que um pivô poderia estar se formando, mas parece não ser o caso. Powell reiterou que as taxas continuarão subindo, mas não explicou o quão alto elas podem ter que ir para reduzir a inflação. Ainda assim, nos parece cedo demais pensar em uma pausa — hoje, as apostas para um aumento de 50 pontos-base na reunião de dezembro têm quase a mesma probabilidade que um aumento de 75 pontos (51% de chance versus 48%).

Os futuros precificam uma taxa terminal de 5,00% a 5,25% em algum momento do primeiro semestre de 2023. Para que isso se verifique, as autoridades darão uma olhada nos próximos meses nos dados de emprego e nas leituras do Índice de Preços ao Consumidor, que podem ajudar bastante a determinar os detalhes dos próximos movimentos do banco central. Quanto mais tempo o Fed manter as taxas mais altas, menor será o retorno que os investidores podem esperar de muitas classes de ativos.
02:54 — E a Inglaterra?
Em meio ao caos fiscal dos últimos meses, o mercado acompanha hoje a decisão da taxa de juros do Banco da Inglaterra, sendo que um aumento de 75 pontos-base é o mais esperado pelo mercado. Diferentemente do Fed, o BoE ainda possui credibilidade por não ter errado tanto na comunicação como fez Powell, podendo se valer de orientação futura continuamente. 

Hoje, porém, o Reino Unido enfrenta uma rápida desaceleração econômica e o banco central sabe algumas informações que os mercados não sabem sobre os planos fiscais do governo atual. Portanto, para além da própria decisão, será importante ouvir as impressões de Andrew Bailey, presidente da autoridade, sobre a economia e o panorama fiscal — é provável que Sunak, o novo premiê, tenha diluído parte importante do risco.
03:28 — Tensões geopolíticas
Novamente, a Rússia sinalizou sua aversão ao conflito nuclear e um novo compromisso com o acordo de remessa de grãos da ONU (mais sobre o tema a seguir). Ainda assim, a guerra continua acontecendo intensamente na Ucrânia, sendo que a única pessoa que insiste em trazer o debate nuclear para a conversa é Vladimir Putin.

Outro ponto de atenção foi a sequência de disparos da Coreia do Norte, que deixou o Japão mais uma vez em posição de alerta. Além disso, os coreanos parecem estar enviando projéteis de artilharia para os russos, em apoio à invasão da Ucrânia, o que viola resoluções da ONU e coloca a Casa Branca em uma situação complicada.
04:10 — O problema com os grãos
Há muita relutância em acreditar que a Rússia não esteja envolvida nos ataques de drones que eles acusaram a Ucrânia de ser responsável (os drones eram iranianos). De qualquer forma, Moscou se retirou da iniciativa de Grãos do Mar Negro, que permitia desde julho que as commodities agrícolas continuassem fluindo da Ucrânia, aliviando o bloqueio naval da Rússia e reabrindo os principais portos — nos últimos dois meses, cerca de 400 navios exportaram 9,2 milhões de toneladas métricas de milho, trigo, produtos de girassol, cevada, colza e soja sob o acordo, aliviando a crise alimentar.

Agora, porém, a chegada do inverno fará com que os próximos meses sejam sentidos de forma mais aguda na Europa e em áreas próximas do Oriente Médio e da África. A ideia é pressionar pelas vias alimentares e energéticas da União Europeia, de modo a tornar o apoio aos ucranianos o menor possível. Qualquer novidade sobre o corredor de grãos que garanta a segurança alimentar de milhões de pessoas pode soar bem para o mercado em caso de desfecho positivo. 

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.