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Mercado em 5 minutos

O mercado está mais ansioso do que nunca: a realidade dói

“Lá fora, os mercados asiáticos encerraram o dia em forte alta nesta sexta-feira (11), acompanhando os sinais positivos dos mercados globais durante o pregão de ontem […]”

Por Matheus Spiess

11 nov 2022, 08:38 - atualizado em 11 nov 2022, 08:38

Imagem: FreePik

Bom dia, pessoal. 

Lá fora, os mercados asiáticos encerraram o dia em forte alta nesta sexta-feira (11), acompanhando os sinais positivos dos mercados globais durante o pregão de ontem, refletindo a reação positiva dos investidores ao aumento menor do que o esperado na inflação dos preços ao consumidor dos EUA em outubro. O fato ajudou a aumentar o otimismo de que o Fed dos EUA começará a desacelerar o ritmo de suas medidas de aperto da política monetária já em sua próxima reunião, em dezembro. 

Os mercados europeus mantêm nesta manhã a boa tendência verificada ontem, ajudados pelo PIB do Reino Unido, que caiu menos do que o esperado no terceiro trimestre (o consumidor permanece fraco, um alerta para outras economias desenvolvidas). Os futuros americanos também sobem, sem gatilhos que poderiam inverter o tom positivo. No Brasil, os ativos foram sensibilizados pelo ambiente político. Há espaço para que hoje tenhamos uma recuperação, ainda que marginal. 

A ver… 

00:41 — A lista de transição tem que melhorar muito para ficar ruim 

A quinta-feira foi desastrosa para o Brasil em vários sentidos. O EWZ, uma cesta de ativos brasileiros no exterior, caiu 6,53% em dólar, registrando sua maior queda desde março de 2020. Também foi a pior queda do EWZ frente ao S&P 500, que subiu 5,54% ontem, desde maio de 2017. O desempenho foi tão caricato que não demorou para que ganhasse o apelido de “Boa Sorte Day”, em referência à fala de Henrique Meirelles em evento, que desejou boa sorte aos investidores caso o governo errasse no fiscal. 

E as sinalizações até aqui são de que tem errado — há muita ansiedade no mercado, sim, mas não podemos nos esquecer que a tragédia econômica da Dilma começou a ser plantada na segunda metade do segundo mandato do Lula. Por isso, o mercado anseia por novidades no âmbito fiscal, desde a equipe econômica até um plano formal de substituição da âncora para as expectativas. O problema é que quem dormiu sonhando com Geraldo Alckmin e Pérsio Arida, acordou com Guido Mantega e Paulo Bernardo na equipe de transição. Há pouca materialidade ainda, mas o sinal foi ruim. 

Lula relativizou a reação do mercado. De fato, ainda temos muito pela frente. Os trabalhos da transição sequer começaram e há nomes bons na equipe, ainda que não em fartura. O problema é que Lula precisa descer do palanque e tratar com responsabilidade o calcanhar de Aquiles de nossa República, o quadro fiscal. Se não fizer isso, não anunciar equipe econômica (oficial, não de transição) e não apresentar plano fiscal crível para os próximos anos, as coisas podem piorar muito rápido. 

Depois da queda de ontem, seria natural esperar uma recuperação hoje, ainda que leve. Lula e Alckmin não estão mais em Brasília, o que indica que o tema fiscal só voltará a pesar na semana que vem. Isso permite que o bom resultado do Itaú possa repercutir no mercado. Portanto, o rebound dos ativos, muito penalizados ontem (até injustamente), os números do Itaú e o bom dia das commodities, nos dão espaço para encerrar bem uma semana muito difícil até aqui. Mais volatilidade deve continuar presente nas próximas semanas.  

01:55 — Uma surpresa positiva 

Para os EUA, o dia foi impressionante. O índice Nasdaq subiu 7,4% na quinta-feira, seu melhor dia desde março de 2020, no início da pandemia. O S&P 500 saltou 5,5%, enquanto o Dow Jones Industrial Average avançou 3,7% — ambos os movimentos foram seus maiores ganhos percentuais desde 2020. O gatilho para isso foi um índice de preços ao consumidor melhor do que o esperado, que mostrou que os preços subiram 7,7% em relação ao ano anterior, abaixo da taxa de 8,2% de setembro e abaixo das expectativas de um aumento de 8%. 

Como comentamos ontem, se os dados viessem abaixo do esperado, os ativos poderiam festejar. Foi o que aconteceu. Os números estimularam as esperanças de que a inflação finalmente já tenha atingido o pico. Como Jerome Powell cometeu o erro de ancorar as expectativas nos dados de IPC de maneira muito evidente, agora o mercado fica super sensibilizado com o indicador. Uma inflação menor possibilitaria menor agressividade no aperto monetário. Após os dados, o mercado passou a indicar uma chance de 85% de um aumento de 50 pontos base no próximo mês. 

Vale destacar que, embora o dado de ontem indique que a inflação está se movendo na direção certa, não sugere que a inflação tenha sido extirpada da economia, tampouco que o trabalho do Fed para restaurar a estabilidade de preços esteja completo. Os juros vão continuar subindo e ficarão elevados por mais tempo. Ainda assim, há motivos para esperança de que a inflação esteja finalmente sendo controlada, dando ao Federal Reserve mais espaço para atuar — ele poderia atual mais no quantitativo e menos no monetário, mas tudo bem. 

02:40 — Ou vai ou racha 

Boas notícias vindas da China animam o mercado de commodities. Os chineses reduziram o tempo de detenção em quarentena para viajantes e pessoas que estiveram em contato com um caso de Covid de 13 para oito dias. Os mercados se recuperaram, presumivelmente na esperança de mais flexibilização à frente. Mais medidas precisam ser tomadas em breve para que o entendimento se fortaleça. 

Claro, oito dias ainda é muito tempo, principalmente para viajantes internacionais acostumados à liberdade oferecida por vacinas funcionais, mas já é uma sinalização importante. Desde o início de novembro a informação de um eventual “zero Covid” dinâmico ou suave na China tem impulsionado o mercado. Se for verdade, pode ser um vetor importante para a recuperação das projeções de crescimento para 2023. 

03:23 — Há melhora na cadeia de suprimentos 

Há sinais de que as cadeias de suprimentos estão finalmente voltando ao normal. O Índice Global de Pressão da Cadeia de Suprimentos elaborado pelo Federal Reserve Bank de Nova York vem caindo acentuadamente desde abril. Adicionalmente, a gigante do transporte marítimo Maersk disse recentemente que as taxas de transporte de contêineres começaram a cair no final do último trimestre devido ao enfraquecimento da demanda dos clientes, juntamente com os mercados começando a se normalizar com menos interrupções na cadeia de suprimentos e menos congestionamento. 

Ou seja, depois de um choque bíblico como o pandêmico, a logística do mundo finalmente vai se normalizando. Claro, as empresas ainda não estão fora de perigo, uma vez que elas ainda estão lidando com atrasos que estão pesando nas vendas. Ainda assim, mesmo sabendo que as cadeias de suprimentos são complicadas e confusas, os desenvolvimentos positivos podem ajudar a desafogar a oferta, deixando de ser um fator pressionador de preços, como aconteceu entre 2021 e 2022. Se há menos inflação, podemos almejar uma política monetária menos restritiva. 

04:03 — O rio Mississippi 

Nem todas as notícias das cadeias de suprimentos são positivas. O rio Mississippi, nos EUA, que transporta suprimentos essenciais como alimentos, madeira, carvão e aço para o mercado global, está flertando com níveis críticos devido à seca, forçando o tráfego a engasgar no pior momento possível. Inevitavelmente, o fenômeno aumentará a pressão sobre os preços globais dos alimentos em um momento em que a invasão da Ucrânia pela Rússia já os fez disparar.  

Por sua natureza, os rios mudam ano a ano, mas a água baixa raramente foi um problema no Mississippi – até agora. As chuvas escassas resultaram em uma seca histórica na principal hidrovia dos Estados Unidos. Agora, bilhões de dólares de milho, trigo, fertilizantes e aço, esperam que os níveis de água subam novamente. O estrago pode custar à economia US$ 20 bilhões.  

  

Um abraço, 

Matheus Spiess 

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.