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S&P 500 cai após ascensão da DeepSeek, Ibovespa dispara e início do Copom: veja os destaques desta terça-feira (28)

Mercados americanos foram abalados pelo crescimento da DeepSeek e Ibovespa recuperou perdas. Confira.

Por Matheus Spiess

28 jan 2025, 09:20 - atualizado em 28 jan 2025, 09:21

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Imagem: iStock/ wenjin chen

A semana começou com elevada volatilidade, amplificada pela aversão ao risco nos mercados americanos, especialmente no setor de tecnologia, fortemente impactado pela ascensão da chinesa DeepSeek. Vista como uma ameaça direta à liderança das gigantes de inteligência artificial dos EUA, a startup provocou uma correção significativa nos preços. Até mesmo o presidente Donald Trump comentou que o episódio deveria servir como um alerta para os EUA intensificarem sua competitividade no setor.

Contudo, o movimento observado ontem pareceu exagerado. Os investidores, que já buscavam pretextos para realizar lucros e ajustar posições, encontraram o bode expiatório perfeito na DeepSeek. Afinal, seria difícil justificar tal reação com base na temporada de resultados, já que os números divulgados até agora são positivos.

A narrativa se encaixa perfeitamente no contexto da Nova Guerra Fria, com a China mais uma vez sendo posicionada como o “adversário conveniente”. No fundo, a reação global se deu porque a China fez o que vem fazendo há décadas: replicou uma tecnologia, só que de forma significativamente mais barata. Não é o fim do mundo, embora o avanço da DeepSeek justifique atenção redobrada a múltiplos muito elevados, especialmente diante de uma potencial rotação setorial como a observada ontem. Esse movimento pode ser reforçado caso os resultados entre as chamadas “Magnificent 7” e as demais empresas do S&P 500 (S&P 493) comecem a convergir, reduzindo as disparidades de desempenho que marcaram os últimos meses.

Enquanto isso, na Ásia, os mercados estão menos ativos nesta semana devido ao longo feriado do Ano Novo Lunar chinês. Já na Europa, as bolsas operam em alta, buscando recuperar parte das perdas de ontem. O dólar, por sua vez, ganhou força globalmente, impulsionado pela aprovação de Scott Bessent como Secretário do Tesouro — haveria um plano de tarifas universais graduais, começando com uma taxa inicial de 2,5%, o que deve influenciar as cadeias de suprimentos globais.

· 00:54 — Descolado, mas ainda preocupante

No Brasil, o Ibovespa registrou alta na segunda-feira (28), contrariando o movimento das bolsas de Nova York. Esse desempenho positivo pode ser explicado por dois fatores principais: i) a forte queda nas ações de tecnologia no exterior desencadeou uma rotação setorial que beneficiou ações de setores tradicionais, como financeiro e commodities; e ii) o avanço de ações cíclicas, impulsionado pela queda nos juros de longo prazo no Brasil, apesar da elevação nos vértices curtos, em meio à expectativa pela decisão do Copom — a redução nos juros longos acompanhou o movimento dos Treasuries americanos, cujos yields recuaram devido à maior demanda por títulos diante da aversão ao risco (alta dos preços e, consequentemente, queda dos juros).

E por falar em juros, a reunião do Banco Central, que se inicia hoje (28), deve resultar, na quarta-feira (29), em uma elevação da Selic em 100 pontos-base. O comunicado provavelmente adotará um tom conservador, deixando espaço para ajustes futuros, caso necessário. Embora o BC não deva indicar uma nova alta de mesma magnitude em maio, a porteira continuará aberta, especialmente diante da deterioração das expectativas de inflação. O IPCA- 15 divulgado na última sexta-feira (24) reforçou o cenário preocupante, enquanto o Boletim Focus de ontem (27) revelou uma revisão significativa para cima na projeção do IPCA de 2025, que passou de 5,08% para 5,50%.

Além disso, há novos elementos pressionando a inflação. O aumento no preço do diesel, que parece inevitável, embora menos impactante do que um reajuste na gasolina, é mais um fator a ser considerado. O temor de ingerência política na Petrobras (PETR4) também segue como um risco constante. Por outro lado, sinais de enfraquecimento da economia começam a surgir. O número de pedidos de recuperação judicial atingiu 2.273, um recorde na série histórica e um aumento expressivo de 61,8% em relação a 2023. Se o Brasil caminhar para uma recessão, será difícil justificar uma Selic de 16%. Por isso, o BC deve adotar uma postura de cautela, aguardando mais dados e um maior compromisso fiscal por parte do governo.

No entanto, o cenário político adiciona mais complexidade à equação. A queda na popularidade de Lula, que agora apresenta sinais de desgaste até mesmo em redutos tradicionais como o Nordeste e entre o eleitorado feminino (a fala da “amante” foi péssima), pode influenciar as decisões do governo. Historicamente, sempre que Lula precisou optar entre responsabilidade fiscal e popularidade, escolheu a segunda. Caso o presidente opte por dobrar a aposta em medidas populistas e paliativas, o resultado será um 2026 ainda mais desafiador, com custos econômicos e políticos elevados.

· 01:41 — A realização foi forte: rotação setorial

O sentimento aversão ao risco que tomou conta dos mercados globais ontem (27) resultou em uma perda impressionante de US$ 1 trilhão no valor de mercado das empresas de tecnologia, enquanto a China se movimenta como uma ameaça competitiva na corrida pela liderança em inteligência artificial. Como mencionei ontem, o modelo de raciocínio de código aberto R1, lançado pela startup chinesa DeepSeek, supostamente superou o ChatGPT, da OpenAI, e conquistou atenção global. O que realmente surpreendeu foi o custo reduzido do desenvolvimento desse modelo, desafiando o domínio de empresas estabelecidas do Vale do Silício, que têm investido bilhões no segmento.

A correção nas techs, embora motivada pela notícia da DeepSeek, também evidenciou a vulnerabilidade do mercado a realizações de lucro. Muitos investidores já buscavam ajustar posições diante dos múltiplos excessivamente esticados, e o gatilho das notícias negativas serviu como justificativa para vender. A queda não se restringiu ao setor de tecnologia, atingindo também o de energia e os fabricantes de equipamentos, já que muitos desses players fazem parte da cadeia de infraestrutura de IA.

Um dado curioso sobre a movimentação de ontem: o índice S&P 500 quebrou um recorde histórico, com mais de 300 ações subindo, mesmo com a queda no índice geral, que sofreu com a desvalorização significativa de 17% da Nvidia e a retração de 2,7% nas ações das chamadas 7 Magníficas, que têm sido o pilar do desempenho do S&P 500 nos últimos anos — para colocar em perspectiva, essas sete gigantes responderam por cerca de 60% do retorno total do índice nos últimos três anos, mesmo considerando uma queda de 40% em 2022. Então havia uma concentração antes.

O cenário atual aponta para uma verdadeira rotação setorial no mercado. Se essa rotação se consolidar, seria razoável esperar um enfraquecimento do dólar globalmente, já que há uma forte correlação entre o desempenho das ações de crescimento nos EUA e o índice do dólar. Contudo, o dólar contrariou essa lógica ontem, ganhando força no mercado global. Esse movimento reflete o impacto das recentes declarações de Donald Trump sobre tarifas e a expectativa de que o Federal Reserve mantenha as taxas de juros inalteradas na decisão de amanhã (29).

Na agenda de hoje (28), o destaque fica para os resultados de grandes empresas, incluindo General Motors, Invesco, Kimberly-Clark, Lockheed Martin, Royal Caribbean, SAP e Starbucks. Esses balanços podem ajudar a dar um tom mais claro ao mercado, especialmente em um momento de transição e incerteza como o que estamos vivendo.

· 02:33 — Momento Sputnik

O custo estimado da versão inicial do modelo de linguagem da DeepSeek foi inferior a US$ 6 milhões, um valor que contrasta drasticamente com os gastos astronômicos da OpenAI e da Meta (M1TA34), que desembolsaram cerca de US$ 100 milhões e US$ 170 milhões, respectivamente, para treinar o ChatGPT e o Gemini. No entanto, há pontos cruciais a serem considerados. Primeiro, os custos divulgados pela DeepSeek não levam em conta despesas com pesquisa e desenvolvimento, bem como outras variáveis associadas ao processo. Segundo, os modelos foram treinados utilizando estoques de chips Nvidia importados — uma solução que não é sustentável a longo prazo, sobretudo à luz das crescentes restrições dos Estados Unidos à exportação de semicondutores para a China. Ainda assim, os resultados sugerem que o desenvolvimento de modelos avançados de IA pode demandar investimentos significativamente menores do que o previsto, pavimentando o caminho para tecnologias ainda mais sofisticadas e acessíveis no futuro.

É fato que o DeepSeek representa um competidor direto para o modelo público da OpenAI, mas isso não chega a ser uma novidade. Diversas empresas vêm lançando seus próprios modelos de IA, e muitas das vantagens pioneiras da OpenAI têm se diluído com o tempo. A diferença aqui é que a maioria desses concorrentes dispõe de recursos financeiros massivos e estão investindo bilhões de dólares para reduzir essa distância. Curiosamente, vale destacar que o frenesi em torno do DeepSeek surge logo após o anúncio do ambicioso projeto Stargate, reforçando a narrativa de que estamos vivendo um “momento Sputnik da IA”, como afirmaram personalidades como Marc Andreessen e Louis Gave. Esse termo evoca a corrida espacial entre as décadas de 1950 e 1960, quando os Estados Unidos intensificaram drasticamente seus gastos após o lançamento do satélite Sputnik pela União Soviética, culminando em investimentos que chegaram a 4,4% do orçamento federal no auge.

Em comparação, a Stargate projeta investir até US$ 500 bilhões em infraestrutura de IA até 2029, com uma média de US$ 100 bilhões anuais — o que representaria apenas 1,25% de um orçamento federal estimado em US$ 8 trilhões por ano entre 2025 e 2029. Em outras palavras, estamos apenas no início de uma nova corrida tecnológica global, com implicações potencialmente transformadoras. Apesar disso, a correção observada nos mercados ontem, impulsionada por preocupações sobre a competitividade da DeepSeek, pareceu exagerada. No entanto, é inegável que este é um momento que exige atenção redobrada, dado o ritmo acelerado das mudanças no setor e a intensificação da disputa pela liderança em IA.

· 03:22 — Favoristimo

Observem como a União Europeia sequer é mencionada nesse contexto de inteligência artificial, um sinal claro de como o bloco perdeu relevância nesse debate global. Grande parte dessa marginalização decorre do enfraquecimento do tradicional Eixo Franco-Alemão, cuja influência tem sido corroída por crises políticas internas e disputas entre os dois países líderes da União Europeia. Talvez a eleição alemã marcada para fevereiro traga uma oportunidade de reorganização e devolva ao bloco um papel de destaque nas discussões globais.

Friedrich Merz, líder do partido conservador CDU e favorito na disputa para se tornar o próximo chanceler da Alemanha, já começou a sinalizar uma agenda mais dura, especialmente em relação à migração, em uma tentativa clara de atrair votos da AfD, partido de extrema-direita que ocupa a segunda colocação nas pesquisas. Entre suas propostas está a introdução de controles permanentes nas fronteiras e a implementação de uma proibição para a entrada de pessoas sem documentos adequados, inclusive para aquelas que têm direito à proteção internacional. A retórica de Merz visa angariar apoio político em um cenário cada vez mais polarizado.

A eleição, marcada para 23 de fevereiro, será decisiva não apenas para a Alemanha, mas também para o futuro da União Europeia como um todo. A CDU, para governar, provavelmente precisará formar coalizões, e o retorno do partido que foi liderado por Angela Merkel pode trazer um vislumbre de estabilidade e uma nova perspectiva para a integração europeia. Merkel, ao longo de seu mandato, foi uma das figuras mais emblemáticas da União Europeia, simbolizando a força do bloco como um ator global. Resta saber se Merz conseguirá ao menos minimizar o caos político atual e colocar a Alemanha — e, por extensão, a União Europeia — de volta ao mapa das discussões globais mais relevantes.

· 04:19 — Mudanças no mercado de trabalho

Podemos estar entrando em uma era de mudanças mais profundas e aceleradas no mercado de trabalho, impulsionadas pela ruptura tecnológica promovida pela inteligência artificial. Essa é a visão de alguns pesquisadores de Harvard, como Larry Summers. Um estudo recente analisou a evolução dos tipos de empregos ao longo de mais de um século, considerando os impactos de tecnologias disruptivas — desde a eletricidade até o advento do computador pessoal. O estudo revelou que o período entre 1990 e 2017 foi um dos mais estáveis na história do mercado de trabalho, algo sem precedentes nos últimos 150 anos.

Contudo, desde então, surgem quatro sinais claros de que o ritmo das transformações no mercado de trabalho está se intensificando. Entre essas indicações estão o aumento significativo do emprego nos setores de ciência e tecnologia e a redução nos postos de trabalho do varejo. Embora ainda seja cedo para avaliar o impacto completo da inteligência artificial, as evidências apontam que, ao menos no curto prazo, a IA tende mais a complementar do que a substituir trabalhadores do conhecimento. Em outras palavras, em vez de eliminar empregos, a IA pode criar uma maior demanda por profissionais qualificados que saibam utilizar e integrar essas tecnologias.

· 05:05 — Para além do reajuste

A Petrobras segue no centro das atenções, não apenas pela delicada questão do reajuste no preço dos combustíveis, mas também por importantes avanços operacionais que reforçam sua relevância estratégica. Na noite de ontem, a estatal divulgou que atingiu, em 2024, as metas de produção estabelecidas pelo Plano Estratégico 2024-2028, dentro de uma margem de 4%…

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.