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Mercado em 5 minutos

Finalmente saiu o arcabouço fiscal: quais os pontos positivos e negativos da proposta?

Além da divulgação do texto formal da nova proposta fiscal, temos notícias sobre a temporada de resultados dos EUA, inflação da Zona do Euro e recorde do preço d ouro

Por Matheus Spiess

19 abr 2023, 08:43

Bom dia, pessoal. Lá fora, a maioria dos mercados asiáticos caiu nesta quarta-feira (19), com a incerteza sobre o caminho da política monetária dos EUA superando amplamente o otimismo sobre uma recuperação econômica na China, com o foco agora voltado para uma série de indicadores americanos nesta semana, em especial o Livro Bege do Fed, a ser apresentado na tarde de hoje. Com isso, o impulso dos dados do PIB da China no primeiro trimestre parece ter perdido força. 

Embora os dados indiquem que uma recuperação econômica chinesa está em andamento, os sinais de fraqueza persistente no setor manufatureiro apontam para uma recuperação desigual, o que não necessariamente é bom para o crescimento global, já bastante prejudicado. Os mercados europeus e os futuros americanos enfrentam uma manhã bem ruim, assim como a maioria das commodities, podendo impactar o Brasil. A temporada de resultados continua na agenda internacional. 

A ver… 

· 00:43 — A curiosidade matou o gato 

Por aqui, entre os dados econômicos, poderemos nos debruçar sobre a produção industrial de fevereiro, que deverá cair 0,2% na comparação mensal, levemente melhor que janeiro, mas ainda indicando enfraquecimento da atividade brasileira. Como se não bastasse a manhã ruim para as commodities, ainda digerimos os números de produção da Vale, que tem suas ações listadas nos EUA caindo no pre-market desta manhã. 

Contudo, fala mais alto o texto formal do arcabouço fiscal. Entre os pontos positivos da proposta, podemos citar a não inclusão de receitas extraordinárias, como venda de ativos, concessões, royalties ou dividendos, para ancorar as despesas. Além disso, a inclusão da capitalização de bancos públicos no limite de despesas é interessante, assim como os limites para aumento das despesas em todas as esferas dos Poderes. 

Se por um lado, porém, podemos comemorar o fato de que os parâmetros também foram fixados para que fossem menos alterados (é mais difícil alterar normal que depende de quórum qualificado), por outro, o número de exceções preocupa. A definição de 13 excepcionalidades no arcabouço é negativa, assim como a retirada da obrigatoriedade de contingenciamento de gastos para o cumprimento das metas. 

Para piorar, a receita que serve de base para as despesas do ano seguinte considera valores acumulados em 12 meses até junho, corrigidos pelo IPCA acumulado do período, o que pode inflar a receita (o correto seria se fosse corrigido mês a mês). Sem falar na falta de responsabilização em caso de não cumprimento das metas (não há crime de responsabilidade como no caso do teto). Zerar o déficit será um desafio.  

· 01:58 — Uma boa temporada de resultados até aqui 

Nos EUA, o mercado vem absorvendo bem a temporada de resultados até aqui, apesar da ansiedade pelos números, que podem ou não sinalizar uma chance maior de recessão. Ontem, por exemplo, tivemos mais bancos grandes, como Bank of America, The Bank of New York Mellon e Goldman Sachs. Os dois primeiros impressionaram, enquanto o Goldman contrariou a tendência dos bancos com um desempenho ruim. 

Johnson & Johnson, por sua vez, reportou resultados robustos para todas as suas principais divisões. A gigante Lockheed Martin entregou vendas e lucros melhores do que o esperado no primeiro trimestre — alimentados pela tensão geopolítica, os gastos com defesa estão aumentando. Paralelamente, a United Airlines teve um prejuízo menor do que o esperado. 

Por fim, a Netflix entregou um resultado medíocre. As assinaturas aumentaram 1,75 milhão no trimestre, meio milhão aquém do consenso, e a administração disse que as adições do segundo trimestre seriam aproximadamente semelhantes a esse número. Os papéis devem ser pressionados. Hoje, contamos com IBM, Nasdaq, Tesla e Morgan Stanley. Entre os dados econômicos, temos o Livro Bege do Fed. 

· 02:55 — Não se deixem enganar pela alta nos EUA 

Ainda nos EUA, o primeiro trimestre de 2023 das ações foi uma história bem desigual. O S&P 500 sobe mais de 8% este ano, mas as ações subiram em média apenas 1%. Em outras palavras, a diferença tende a significar uma recuperação mais instável do que uma com um grupo mais amplo de ações participantes. 

A alta do índice se deve, na verdade, a um punhado de grandes empresas. Para ilustrar, as 20 maiores empresas do S&P 500 adicionaram quase US$ 2 trilhões em capitalização de mercado no primeiro trimestre, contra US$ 170 bilhões para as 480 ações restantes. Com isso, acompanhar o índice pode passar uma impressão errada. 

O rali de 2023 continua ancorado nas maiores ações do mercado – um fenômeno que não pode durar para sempre. Os investidores precisarão continuar vendo uma participação mais ampla das demais ações para ganhar mais confiança no rali deste ano, o que parece difícil de acontecer tendo em vista a chance de uma recessão. 

· 03:44 — E os europeus? 

No Reino Unido — onde o nosso presidente do BC, Roberto Campos Neto, deverá participar hoje de alguns encontros ao longo do dia —, os dados de inflação desaceleraram mais lentamente do que o esperado. Os preços de alimentos continuam subindo a surpreendentes 19,2% na comparação anual, o que explica a resistência do índice de inflação. Ao mesmo tempo, a desinflação dos bens de consumo duráveis e dos preços da energia continuam. 

Como o Banco da Inglaterra (BoE, na sigla em inglês) foi a primeira grande autoridade monetária dos países centrais a reagir a inflação, o comportamento dos preços por lá pode ser usado como proxy do que vai acontecer em outros lugares. Enquanto isso, tivemos nesta manhã os dados de inflação de março da Zona do Euro, os quais vieram predominantemente em linha com o esperado, desacelerando sem grandes surpresas. Falas de autoridades ao longo do dia podem servir para alguma emoção. 

· 04:29 — O ouro ganha espaço 

O ouro está próximo de seu preço recorde, impulsionado por três forças relacionadas: i) preocupações econômicas; ii) rendimentos de títulos americanos mais baixos; e iii) um dólar americano mais fraco. Os bancos centrais também aumentaram suas compras de metais preciosos este ano, somando-se ao rali recente, e o ímpeto deverá continuar. 

O ouro caiu nos últimos dias, mas chegou a US$ 2.041,30 a onça recentemente, o segundo maior valor da história e logo abaixo do recorde de agosto de 2020 de US$ 2.069,40. Vale lembrar que isso é nominal: em 1980, por exemplo, o ouro atingiu um preço ajustado pela inflação de US$ 3.000 (dólares atuais). Ainda assim é relevante. 

Os investidores se desfizeram de ativos de risco em março, depois que a turbulência bancária gerou preocupações sobre o sistema financeiro. O ouro é considerado uma reserva de valor e a demanda por ele aumenta em tempos de grande incerteza. O aumento do preço do ouro e o status de hedge contra a inflação podem sinalizar expectativas de que a inflação permanecerá rígida nos próximos anos. 

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.