Para o professor de Berkeley e especialista em finanças comportamentais, Terrance Odean, um dos fatores determinantes para a montagem de portfólio dos investidores pessoa física é a atenção midiática dada a determinados papéis da Bolsa. “Atenção pode importar mais que crenças e preferências em termos do que os indivíduos compram”, diz ele.
Odean foi um dos convidados especiais do evento Investidor 3.0, em comemoração ao aniversário de 12 anos da Empiricus, onde fez uma palestra falando sobre seus mais recentes estudos na área de economia comportamental e também respondeu algumas perguntas sobre bitcoin, carreira e sua história com Daniel Kahneman, psicólogo e pesquisador da área, que ganhou o Prêmio Nobel de Economia em 2002.
Investidores de varejo se deixam influenciar pela mídia na montagem do portfólio
Embora existam formas mais técnicas de escolher qual ação irá compor sua carteira de investimentos, como a análise fundamentalista, a verdade é que os investidores de varejo são muito influenciados por um outro fator que pode não parecer tão óbvio: a atenção que uma determinada ação recebe no ambiente midiático, seja nas manchetes de jornais, na televisão ou mesmo num fórum online.
Para o professor Terrance Odean, o fator “atenção” pode até mesmo se sobressair a outros fatores como crenças e preferências do investidor. Quando uma ação começa a receber mais cobertura midiática, dois acontecimentos são comuns: um aumento anormal do número de negociações daquele determinado papel (geralmente ordens de compra) e alterações extremas de preços.
“Quando as ações captam a atenção, investidores de varejo não só negociam mais como também realizam mais ordens de compra” ‒ Terrance Odean, especialista em finanças comportamentais
Ele percebeu isso analisando casos em diferentes períodos; é interessante notar como esse fenômeno já era comum muito antes de surgir a internet. Um dos casos abordados pelo professor de Berkeley aconteceu entre os anos de 1997 e 1998.
Um artigo falando sobre os potenciais tratamentos para câncer, citando uma empresa chamada Intermed, foi publicado na revista Nature, conceituada publicação acadêmica, mas que não possui um público muito grande fora da Academia. Alguns meses depois, uma matéria na capa do New York Times falando sobre a Intermed foi publicada, com dados não muito diferentes da publicação da Nature.
A diferença, no entanto, foi a atenção proveniente de um dos jornais de maior circulação dos Estados Unidos. O resultado? Em um dia, as ações de Intermed chegaram a saltar de 12 para 48 dólares, fechando o pregão cotadas a 30 dólares.
“Parece que as pessoas negociam ações porque leem notícias sobre algo”, comenta Odean, no evento Investidor 3.0.
O professor cita outros exemplos, como o caso do programa de TV “Wall Street Week”, que ia ao ar toda sexta à noite. As ações comentadas durante o programa eram mais negociadas no pregão de segunda-feira. Ou também o caso de uma coluna do Wall Street Journal, na qual gestores e outros profissionais do mercado financeiro falavam sobre determinados papéis, que invariavelmente acabavam recebendo mais atenção na Bolsa nos dias seguintes à publicação.
Esta característica de negociar “seguindo” a mídia épeculiar dos investidores pessoa física, comenta Terrance Odean. “Nenhum investidor institucional compraria uma ação porque um expert recomendou na capa do Wall Street Journal”, diz.
Empresas como Robinhood facilitaram o “trade induzido pela atenção”
E se esse movimento já acontecia quando era necessário comprar jornais ou ligar a TV para receber informações sobre o mercado financeiro, imagine agora com a internet e os smartphones. Segundo os estudos de Odean, até mesmo o volume de buscas de uma ação no Google pode impactar seus preços a curto prazo.
Hoje em dia, é mais fácil negociar ações do que era há algumas décadas. Uma das techs que foi importante nesse sentido foi a Robinhood, plataforma que facilitou bastante o trade por parte dos pequenos investidores. Algumas características do app facilitam o alto volume de negociações: é simples, intuitivo e comprar e vender ações lá parece até “um jogo”.
“A simplicidade torna a negociação em Bolsa mais fácil para os investidores, porque eles veem uma quantidade limitada de informação e pensam: ‘bom, não parece complicado, não pode ser tão difícil assim’”, comenta Terrance Odean.
Em um artigo recém-publicado, o professor escreve sobre como a Robinhood facilitou “a negociação de ações induzida pela atenção” (attention-induced trading, em inglês). E nem é preciso ir muito longe para encontrar um exemplo: é só lembrar do caso da GameStop (clique aqui para entender o caso em detalhes).
A empresa estava em péssima situação financeira por conta de seu modelo de negócios incoerente com as tendências atuais; a empresa vende jogos físicos em um mundo onde a maioria compra os games online direto pelo console. Mas os usuários do fórum WallStreetBets, na plataforma Reddit, escolheram a ação como “favorita” e começaram a tomar lotes de opções de compra da GameStop.
O resumo da ópera foi que a ação subiu de preço absurdamente, sem ter mudado seus fundamentos. Ou seja, não é como se ela tivesse de repente mudado seu modelo de negócios para algo lucrativo.
Mais uma vez, a teoria de Odean de que a atenção midiática (nesse caso, vinda de um fórum online) pode aumentar o número de negociações de uma ação e causar alterações anormais de preços ganhou força.
Odean aborda Bitcoin e Daniel Kahneman
Ao final da palestra, o especialista em finanças comportamentais respondeu algumas perguntas feitas pelo sócio-fundador da Empiricus, Rodolfo Amstalden. Sobre o mundo das criptomoedas, ele se mostra cético e afirma que “não tenho ideia de como você poderia descobrir o valor intrínseco do bitcoin”.
Ele também conta que Daniel Kahneman, outra figura importante das finanças comportamentais (e que já esteve em um dos eventos de aniversário da Empiricus), foi essencial para sua escolha de trocar o PhD em psicologia por um em finanças.
Quer conferir a palestra de Terrance Odean completa? Veja o vídeo abaixo:
Jornalista formada pela Universidade de São Paulo (USP), com pós-graduação em Comunicação e Marketing Digital na ESPM. Trabalhou com comunicação institucional e jornalismo de viagens antes de entrar no mercado financeiro. Está sempre disponível para falar sobre inovação, livros e cultura pop.
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